O governo federal deve começar a fazer, em abril, uma espécie de “censo nutricional” nas comunidades quilombolas — terras que agrupam descendentes de escravos refugiados. A pesquisa pretende visitar todos os domicílios de 173 territórios, pesar e medir todas as crianças menores de 5 anos e obter dados sobre acesso a alimentos, fome e inscrição em programas sociais.
O levantamento prevê uma bateria de 14 perguntas sobre a situação alimentar das famílias. Será verificado, por exemplo, se o domicílio já passou por algum tipo de privação por dificuldade de acesso a alimentos, se teve experiência de fome e se alguém deixou de comer uma das três refeições diárias. Haverá também questões sobre aleitamento materno e apoio durante a gestação.
Os técnicos vão coletar ainda informações sobre a existência de equipamentos públicos (escola, posto de saúde, centro de referência de assistência social) nas comunidades. Esse dado será colocado num mapa (georreferenciada) e cruzado com a localização dos domicílios, para verificar se o lugar da oferta do serviço coincide com o da demanda.
“É a primeira vez que se faz, nessa área, uma pesquisa tão abrangente”, afirma a diretora de avaliação do Ministério do Desenvolvimento Social, Júnia Quiroga. A pesquisa é financiada pelo MDS, em parceria com o PNUD, e conta ainda com apoio da SEPPIR (Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial), Fundação Palmares, Ministério da Saúde, INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e CONAQ (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas).
Os resultados da medição das crianças (chamado levantamento antropométrico) serão comparados com uma escala internacional, para averiguar se há déficit de peso e/ou altura — indícios de desnutrição. “O objetivo é identificar se há casos de desnutrição na primeira infância, para avaliar que tipo de intervenção pode ser feita”, diz Júnia. “É na primeira infância que se identifica a desnutrição crônica — aquela que, se não superada, deixa marcas por toda a vida adulta.”
A informação sobre acesso a programas sociais servirá para avaliar se é necessário expandi-los com mais rapidez entre os quilombolas ou se é preciso adaptá-los às características específicas dessas comunidades.
O governo fez um levantamento menos abrangente em 2003, em que foram coletadas informações sobre as comunidades, sem o caráter censitário da pesquisa que vai a campo em abril. Na ocasião, foi detectado que 129 territórios abrigavam pessoas que passavam fome e que em 126 a maioria das famílias vivia com renda de até 2 salários mínimos.
Desta vez, devem ser ouvidos todos os domicílios das 173 áreas quilombolas que receberam título de posse até outubro de 2009. Desde então, o INCRA concedeu o documento a outras sete comunidades.
A coleta de dados será feita pelo Núcleo de Pesquisas, Informações e Políticas Públicas, da Universidade Federal Fluminense, selecionado em processo licitatório organizado pelo PNUD. Cerca de 200 pesquisadores devem participar do trabalho — supervisores, entrevistadores e especialistas em antropometria, que vão ensinar os agentes de saúde das regiões mapeadas a medir e pesar as crianças corretamente. A expectativa do MDS é que o levantamento seja concluído em junho ou julho
Oficinas
Antes de os técnicos irem a campo, foram organizadas quatro oficinas com representantes das comunidades: uma em Brasília, em novembro (reunindo líderes de Centro-Oeste, Sul e Sudeste), outra em Belém, em fevereiro (com quilombolas do Amazonas e de áreas próximas da capital paraense), uma terceira em Santarém, no mesmo mês (com comunidades paraenses do baixo Amazonas) e a última em São Luís (MA), na sexta passada (25/3), com lideranças do Nordeste. A realização de dois eventos no Pará se explica: dos 173 territórios a serem pesquisados, mais de 100 ficam nesse estado.
As oficinas tiveram como objetivo preparar as comunidades para a entrada dos pesquisadores, explicando como a coleta de dados será feita, e discutir com os representantes como será a melhor maneira de disseminar os dados obtidos.
FONTE : PNUD
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