Pôr Mônica Aguiar
Para este reconhecimento deve-se considerar as assimetrias deste tipo de violência na saúde, as práticas que levam as transgressões aos diretos sexuais e direitos reprodutivos durante a gravides, parto e período puerperal e as possibilidades de colocar a vida social, psicológica e saúde da mulher em risco ou com sequelas irreversíveis.
É muito comum encontrar definições subjetivas
e lista reduzida dos cognominados agravos que provocam a violência obstétrica
na linha de violências acometidas de forma verbalizada:-
sofrimentos psicológicos à gestante, ofensas verbais e tratamento
agressivo, dentre outros,
Na minha avaliação, a violência obstétrica
estar relacionada ao crime de gênero. As práticas e condutas ilegais que
configuram o crime de violência obstétrica, ferem os direitos humanos das
mulheres e meninas, autonomia sobre o corpo e provocam óbitos precoces durante
as várias etapas de vida da mulher.
Tenho encontrado várias definições com
tipificações sobre o tema e agora, se faz necessário ampliar os
olhares, considerar e aprofundar o abismo existente da violência
obstétrica que provocam agravos, e que, violam os direitos humanos condizendo a
métodos criminais.
E minhas afirmações, além dos estudos aqui
apresentados estão baseadas em relatos de adolescentes e mulheres em sua ampla
maioria negras, residentes nas periferias de Belo Horizonte, que se
predisporiam a romper com a barreira do medo e “contar”. Esta escuta pessoal,
foi realizada de forma voluntária no ano de 2020, em função da relevância do
tema e aumento de mortes maternas no Brasil.
Não tenho a menor dúvida que a violência
obstétrica, além da inegável destruições que causam na vida pessoal de uma
mulher, provocam impactos na vida social, produtiva e econômica das mulheres e
também de Governos. O aumento das despesas médicas e legais, impactam
o orçamento dos programas governamental, sociais, assistenciais e
previdenciário e no desenvolvimento econômico e produtivo de um país.
Com isto, devemos considerar todas as
assimetrias dos impactos que a violência obstétrica provoca na vida das
mulheres.
Estudo recente que envolveu mais de 24 mil
mulheres, apontou que mulheres que sofrem com a violência obstétrica tem
seu aleitamento comprometido na maternidade e traz repercussões a longo
prazo. A pesquisa já
havia apontado que 44% sofreram algum tipo de violência obstétrica.
Este achado é de um estudo inédito da Universidade Estadual do Rio de Janeiro
(UERJ) e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
“Mulheres que sofrem violência obstétrica têm
menos chance de sair da maternidade amamentando exclusivamente e de manter o
aleitamento a longo prazo. Entre aquelas que tiveram parto vaginal, o impacto é
ainda maior e pode se prolongar por até seis meses”.
Conforme a pesquisadora Tatiana Henriques
Leite, professora da UERJ em uma entrevista na revista Metrôpoles: “Há poucos estudos sobre o tema e menos ainda
explorando as consequências dessa violência, tanto para a mulher quanto para o
recém-nascido”.
“Segundo a autora, um dos problemas é a
própria definição de violência obstétrica: embora
muita gente a associe com abusos físicos ou sexuais, o termo é bem mais amplo e
engloba violência psicológica, desrespeito, falta de informação, de
comunicação, de autonomia e até de privacidade no contato com a equipe médica,
além da falta de acesso a recursos a que a mulher tem direito”.
ESTUDOS
Como os meus passos, vem de longe, fui a procura
na internet sobre assuntos que discorrem sobre a violência obstétrica e
estratifiquem os dados a partir das condições territoriais, socioeconômica e de
cor/raça.
Encontrei alguns estudos. O que me chamou a
atenção: “RAÇA E VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA NO BRASIL”, de kelly Diogo Lima,
publicado em 2016, constante na arca da FIOCRUZ. “Objetivou-se comparar as características sociodemográficas de mulheres
segundo cor/, com foco nas mulheres negras e analisar os tipos mais comuns de
agressões a elas infringidas na assistência ao parto pelo Sistema Único de
Saúde. Trata-se de um estudo transversal de base populacional, com dados
provenientes da pesquisa Rede Cegonha do Ministério da Saúde”. No estudo, foi observado os piores
indicadores sociodemográficos nos grupos de pardas, negras e indígenas se
comparadas as mulheres de cor/raça branca. As violências mais comuns foram a episiotomia,
a manobra de Kristeller e o impedimento de um acompanhante no momento do parto.
No estudo, houve um excesso de mulheres de cor parda que referiram ter sofrido
toques vaginais repetitivos. Conclui-se que, muitas das intervenções usadas na
rotina de um parto são desnecessárias ou mesmo prejudiciais à mulher, sendo
assim, violentas. Desta forma, é necessário que haja uma maior discussão sobre
um modelo de assistência ao parto que se paute em um maior protagonismo da
mulher, nos seus desejos e nas suas histórias de vida. https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/18547
Ao dar prosseguimento a minha navegação, encontrei outro estudo, recentemente
publicado: “A violência obstétrica e os danos à saúde psicológica da
mulher”. No artigo fundamentado em pesquisas
bibliográficas referentes a violência obstétrica, assinados por Aléxia
Fortes, Ana Paula e Evelyn Sofia e apresentado no XIX Encontro Científico
Cultural Insteristitucional em 2021, que abordou sobre os danos da violência
obstétrica diante da saúde psicológica das mulheres apontam em seu resumo
varias asseverações de conceitos:
“A violência obstétrica é
caracterizada por ações que violam o direito das mulheres durante a gestação e
principalmente no pré e pós parto, a mesma constitui-se como ações que
apropriam-se do corpo da mulher de forma desumanizada, como por exemplo, uso de
episiotomias, ocitocina sintéticas e manobras de kristeller, além de
humilhações e omissões”.
VEJA ARTIGO : https://www2.fag.edu.br/coopex/inscricao/arquivos/ecci_2021/18-10-2021--16-24-38.pdf
........Observa-se
que a violência obstétrica vem aumentando cada vez mais, no entanto, é algo que
ainda não é do conhecimento da sociedade, uma vez que esta violência está
presente em nossa cultura sendo algo desvalorizado, impactando com danos na
saúde física, mas principalmente psicológica da mulher. Contudo, conclui-se que
a saúde psicológica da mulher é a mais afetada, causando traumas, pânico,
depressão, ansiedade, medo, angústia, insegurança e entre outros aspectos
emocionais que prejudicam seu funcionamento, sendo assim, nota-se a necessidade
da Psicologia dentro do contexto hospitalar e também na saúde para que auxilie
na orientação dos profissionais, da mesma forma que no acolhimento da mulher,
como uma maneira de prevenção possibilitando informações sobre os direitos das
mulheres.....
Outras pesquisas apontam para o número de
casos de violência obstétrica durante o parto. Independente de ser vaginal ou
cesária, os abusos são constantes e por diversas razões não existe interesse
para serem divulgados à sociedade, ou, para fazerem parte do pacote de temas de
provocam o debate e impactam a sociedade.
A violência
obstétrica é um agrupamento de maus tratos, sejam eles físicos, psicológicos ou
verbais à mulher em trabalho de parto, além da prática de procedimentos que não
são necessários e invasivos, como por exemplo, as episiotomias, restrições de
leitos no pré-parto, tricotomia, ocitocina sem nescessidade, ausência de acompanhamento e de informações e constragimentos . (A volência
obstétrica e os danos à saúde
psicológica da mulher)”.
Dentre estas, acrescento. Ocitocina sem
necessidade; ausência de acompanhantes; constrangimentos: morais, racial e
religiosos; baixa assistência primária e obstétrica; privação de anestesia;
fechamento das penas; pontos extras e laqueaduras sem consentimento da
paciente, dentre tantas violações.
O parto no Brasil a um bom tempo se tornou de responsabilidade hospitalar. Com isto, para cada assimetria apontada nos direitos sexuais e reprodutivos, consequentemente uma implicação, em sua maioria, irreversível na vida das mulheres.
MORTES MATERNAS E CESÁRIAS
Em um estudo nacional realizado pela IMS
(2021) mostra que em 2011/12 houve uma taxa de 56,6% de brasileiros que
nasceram por meio da cesariana pelo SUS, porém na rede privada a frequência é
ainda maior, com um percentual de 90%. Em relação à ocitocina administrada para
indução ou aceleração do processo, há 36,4% de mulheres que foram submetidas a
esse medicamento sem necessidade, logo, 39,1% sofreram amniotomia. Em relação
às mulheres que tiveram um parto "normal", 36,1% foram submetidas a
manobra de kristeller e 53,5% sofreram episiotomia. Em vista disso, a violência.
No artigo “ No Brasil das cesáreas, falta
de autonomia da mulher sobre o parto é histórica”, punblicado pela FIOCRUZ em 2021,
destaca influência de fatores
médicos, legais e religiosos na disseminação do parto cirúrgico.
Neste artigo, encontrei dados que colocam o Brasil como o, pais com a
segunda maior taxa de cesária do mundo e com indicativo a normalização e
naturalização da cesária. Com isto, os índices de mortes maternas evitáveis e a
violência obstétrica só crescem.
Entre 2016 e 2030, como parte dos Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável (ODS), o Brasil assinou a meta global de reduzir
a mortalidade materna para menos de 70 por cada 100 mil nascidos vivos.
As mortes maternas no Brasil refletem as desigualdades no acesso aos
serviços de saúde pública e privada, destacam as desigualdades existentes entre
negros e não negros, com agravamento maior a depender da faixa territorial que
residem. Na ampla maioria destes territórios não existem
profissionais qualificados para atenção ao parto e ao nascimento.
“No Brasil, aproximadamente 55% dos partos realizados no país são
cesáreas. É a segunda maior taxa do mundo, atrás apenas da República
Dominicana. Se considerarmos a realidade no sistema privado de saúde, a
proporção pula para 86%. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam
que a taxa ideal de cesarianas deve estar entre 10% a 15% dos partos”.
O número de cesárias recomendadas e aconselhadas também tem aumentado
significativamente nas regiões mais pobres e entre as mulheres jovens.
Quando não existe risco de vida para a mamãe e o bebe, a escolha do
parto deve ser baseada no histórico de saúde da paciente, na vontade da
gestante em ter o parto humanizado, mais tranquilo possível, livre de quaisquer
forma de violências, aconselhamentos e práticas carregadas de valores patriarcal,
racial, moral e religioso.
A cesária sem indicação ou por escolha da mãe
podem levar à prematuridade fetal,
acarretando ao bebê problemas respiratórios, dificuldades para manter a
temperatura corporal e para se alimentar.
“Um estudo liderado pelo Centro de
Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia) sugere
que partos cesáreos podem estar associados ao maior risco de mortalidade na
infância, com exceção dos casos que uma indicação médica seja clara sobre o
procedimento cirúrgico conhecido popularmente como "cesariana".(FIOCRUZ
2021)
As taxas de parto cesáreo têm aumentado,
porém, as pesquisas ainda não chegaram a um consenso científico se este aumento
tem sido impulsionado pela preferência materna ou por indicações médicas.
Entre os relatos ouvidos por mim, das
grávidas que fazem o pré-natal levam a concluir que a maioria das
indicações para cesária são dadas em atendimentos do corpo técnico que fazem o
acompanhamento do pré-natal das gestantes nas unidades de saúde básica pública
como também no setor privado.
A cada hora, uma mulher perde a vida devido a complicações na gravidez,
no parto ou no pós-parto, a grande maioria delas evitáveis.
Nestes últimos 4 anos, centenas de
mulheres morrem por complicações na gravidez, parto e pós-parto.
Pressão alta, sangramento intenso e complicações decorrentes de abortos inseguros são causas mais comuns. No entanto, nove em cada dez dessas mortes são evitáveis por meio de atendimento de qualidade, acesso à contracepção e redução das desigualdades no acesso aos cuidados.
O Brasil teve um
aumento de 5,4% no número de mortes materna nos últimos vinte anos. O
dado é de um estudo publicado, em Genebra, Suíça, pelas Nações Unidas e o Banco
Mundial. Subiu para 72 óbitos para cada cem mil habitantes em 2020. Na
média de todos os países, houve queda de 34% nas últimas duas décadas. (EBC).
ENEFICÁSSIA DO ESTADO EM GARANTIR OS DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS
LIVRES DE VIOLAÇÕES, CRIMINALIZAÇÃO E
VIOLÊNCIA.
O
Brasil teve que assumir obrigações internacionais com relação aos direitos da
mulher, dentre elas, tomar medidas para implementação dos direitos humanos
sexuais e reprodutivos.
Em 1993, a II Conferência Internacional de
Direitos Humanos (Viena), a Conferência Internacional da
ONU sobre População e Desenvolvimento (CIPD) em 1994, o Comitê da Convenção
sobre Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (Comitê
CEDAW), o Comitê do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos Sociais
e Culturais (Comitê PIDESC), marcam a luta das mulheres ao exigir do
Estado brasileiro a atenção devida aos temas que afetam direta e
especificamente a saúde e os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres.
Como resultado desta batalha travada pelas
mulheres brasileiras, passos foram dados e proporcionaram algumas conquistas
como: - O Programa de Atenção à Saúde Integral das Mulheres (PAISM), as
políticas de atenção à feminização da epidemia de Aids, elementos da estratégia
Rede Cegonha, entre outros. A Norma Técnica de Atenção Humanizada ao
Abortamento do Ministério da Saúde, instituição e complementações em
várias legislações em diferentes esferas no Brasil.
Com a intensificação da luta pela liberdade e
autonomia incoercível de decidir sobre os próprios corpos, a pauta da
saúde sexual e saúde reprodutiva foram se intensificando. É objeto de
resistência direta, por parte legisladores, judiciário e da sociedade
que se colocam como capazes de criminalizar as mulheres utilizando aparelhos do
Estado, principalmente quando as decisões implicam em aborto seguro, aborto
legal, parto humanizado, violência obstétrica e união entre pessoas do mesmo
sexo.
O Estado brasileiro é coordenado e governado
por maioria de homens. Com isto, confrontos com grupos políticos, partidos,
legisladores, membros da segurança pública e judiciário sobre estes temas são
evitados.
Fecham os olhos, tapam os ouvidos, permitindo
que direitos sejam violados. Direitos estes ratificados pelo próprio Brasil,
garantidos nos tratados internacionais, de proteção dos direitos humanos e
nos que protegem os direitos humanos:- à saúde sexual e reprodutiva
da mulher, direitos humanos à liberdade, autonomia, vida privada,
integridade física e psicológica.
PROJETOS DE LEIS QUE TRATAM DA VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA
O Brasil assumiu várias responsabilidades ao assinar e pactuar tratados
e convenções, porém Governantes se sentem com liberdade em não cumpri-los. Se
sentem livres para utilizar as estruturas do Estado brasileiro para manutenção
de violências e violações a diretos constitucional e humanos das mulheres.
Eu considero algumas medidas e tomadas de decisões como avanços, diante
as complexidades moral e religiosa dentro das questões políticas no Brasil.
Esforço dos poucos grupos progressistas e de esquerda com poder.
Reconhecem o prejuízo político que traz a interferia de religiosos, ante
abolicionistas e moralistas tradicionais na vida administrativa do Brasil.
Alguns Governantes até conseguiram dar um furinho neste entrelaçado que operam
com sentimentos das pessoas e que sustentam o racismo e o patriarcado.
Muitos Estados, tem Leis que tratam da violência obstétrica, porém
muitas não preveem punições, outros não utilizam a expressão "violência
obstétrica". Outros, as legislações tratam da humanização do parto
e práticas recomendadas e não indicadas. (Distrito Federal, Goiás, Mato
Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Pernambuco, Rondônia, Santa Catarina,
Tocantins, Acre, Alagoas, Amazonas, Ceará, Mato Grosso, Paraíba, Piauí, Rio de
Janeiro, Roraima, São Paulo).
Existe um Projeto de Lei tramitando na Câmara Federal, o PL 422/23 de autoria da deputada Laura Carneiro (RJ). Este projeto inclui violência obstétrica na Lei Maria da Penha e união, estados, Distrito Federal e municípios. E estes deverão promover políticas públicas integradas para prevenção e repressão da violência obstétrica.
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=2253464
Na Câmara, já tramitam outras propostas visando coibir a violência
obstétrica, como os projetos de lei 7867/17 e 8219/17, que estão apensados
ao PL 6567/13, do Senado, que
obriga o Sistema Único de Saúde (SUS) a oferecer à gestante parto humanizado
FONTES DE PESQUISAS INFORMATIVAS: OPAS - Organização Pan-Americana da Saúde / Ministério da Saúde /Jusbrasil / Sobef /Câmara/ EBC/ Folha/UOL/GELEDES/ POLETIZE/GLOBO