segunda-feira, 21 de setembro de 2020

30 anos de SUS. Falta implementação da Política Nacional de Atenção à Saúde da População Negra

 Por Mônica Aguiar 

A população negra do Brasil se não tivessem o SUS estariam com um número de mortes previníveis muito maiores.

Estudos e estatísticas oficiais de saúde apontam que as mulheres negras com idade entre 10 a 49 anos são bastante afetadas por mortes maternas provocadas por causas evitáveis como hipertensão, hemorragia e infecção puerperal.

As mortes na primeira semana de vida também são mais frequentes entre crianças negras quando comparadas às brancas.

Ainda no contexto de mortalidade, a estatística registram que a segunda causa de morte mais frequente entre a população negra é o homicídio, enquanto para brancos, esta aparece como a quinta causa de mortalidade mais comum.

A população negra estar mais propensas a doenças genéticas e hereditárias: diabetes, hipertensão, miomas e doenças falciforme. São consideradas doenças mais comuns entre a população negra brasileira.

Analisando todos os números de óbitos por causas previníveis, estamos na porta do genocídio, por descaso e falta de implementação da Política Nacional de Saúde da População Negra nos municípios do Brasil.

A Política Nacional de Saúde Integral da População Negra foi instituída no Brasil em 13 de maio de 2009, reconhecendo o racismo, as desigualdades étnico-raciais como determinantes sociais das condições de saúde e o impacto que o racismo provoca na garantia da vida e saúde da população negra.

O Sistema Único de Saúde é um dos maiores sistemas de saúde pública do mundo. Ele deveria garantir acesso integral, universal e gratuito para toda a população brasileira.

A cada ano, aproximadamente 2,4 milhões de recém-nascidos fazem o exame de Doença Falciforme pelo SUS, ou seja, uma cobertura de 83,2% das crianças que nascem no país, Mas, dos recém-nascidos no Brasil, a maior taxa de mortalidade neonatal estão majoritariamente as crianças negras.

Devemos nestes 30 anos de SUS lembrar que o Brasil assumiu compromissos para com a saúde da população negra no ano que foi instituído a Década Internacional de Afrodescendentes pela ONU, para implementações de políticas em atenção à saúde da população negra, combate ao genocídio, acesso ao saúde pública de qualidade e reconhecimento das especificidades existente e dentre outras.

Estamos vivendo um período de descasos e perdas na implementação das políticas de saúde da população negra por parte do Ministério da Saúde e Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos. Estes Ministérios tem negado sistematicamente a existência das especificidades, a importância da transversalidade, intersetorialidade para combater o racismo institucional, garantir acessos iguais em lugares e de gestão públicas. Direitos fundamentais estabelecidos na Constituição Brasileira.

A falta de existência de um simples Comitê Gestor ou de uma simples Comissão dentro em  um Conselho Municipal de Saúde corroboram com o não cumprimento por parte de gestores municipais da saúde com os objetivos, diretrizes, estratégias com vistas à promoção da equidade em saúde da população negra dentro do SUS.

As resistências racistas, tem solidificado cada dia mais o racismo institucional e estrutural. Os números de óbitos vem demostrando o tamanho desafio e importância para de implementação desta política no Brasil.  

Mesmo com a população negra sendo a que mais acessa o SUS, ainda é a que tem menor acesso a saúde pública.

60% das mortes maternas ocorrem entre mulheres negras e 34%, entre mulheres brancas.

O racismo institucional funciona como uma espécie de mecanismo de impedimento de acesso das pessoas negras ao serviço de saúde, trazendo enormes prejuízos no seu processo de saúde, já que, por vezes, causa uma morte que poderia ser evitável e prevenível ou até mesmo antecipando essa morte que poderia acontecer de modo mais tardio.(  Emanuelle Góes, mulher negra, doutora em Saúde Pública pelo Instituto de Saúde Coletiva (ISC/UFBA).

Os desafios de um sistema de saúde são constantes e novas demandas sempre surgem agudas e crônicas.

Em Belo Horizonte, na Região Distrito Venda Nova, existe uma maternidade pública, a Maternidade (Leonina Leonor), foi construída e equipada a mais de 10 anos, para atender de forma humanizada grávidas da Capital  seu entorno. Foram quase 10 milhões de investimento com dinheiro público e até o presente momento não foi colocada para funcionar. 

A Maternidade Leonina Leonor, é um equipamento voltado ao atendimento na linha de humanização do parto e se se estivesse aberta, funcionando, teria a capacidade para atender 350 parturientes por mês inicialmente, a expectativa seria que a unidade realizasse cerca de 500 partos humanizados. 

Venda Nova e uma região como predominância de mulheres pobres e negras. A população é composta por 51,61% mulheres e faixa etária entre 19 a 44 anos, que somam 68,34% em idades férteis e reprodutivas.  

A abertura da Maternidade Leonina e Leonor foi eleita prioridade pela 14ª Conferência Municipal de Saúde em 2017 e definida como a meta 4.2.4 no eixo de urgência, emergência e atendimento hospitalar no Plano Municipal de Saúde de Belo Horizonte 2018 – 2021, documento que expressa as responsabilidades da gestão municipal sobre a construção de políticas e ações de saúde a partir de um diagnóstico das condições e necessidades da população, mas segue sendo descumprido e a Maternidade permanece fechada

Na região de Venda Nova, são as mulheres que mais recorrem ao Sistema Único de Saúde para atendimento pré-parto, parto e pós-parto. Contudo, a Secretaria Municipal de Saúde alega que faltariam recursos para o seu funcionamento, isto à revelia das reivindicações sociais, deliberações do Conselho Municipal de Saúde, dados estatísticos de mortalidade infantil e materna na região, compromissos assumidos pelo Brasil no Oitavo objetivos do Milênio e compromisso assumido pelo Brasil na Década dos Afro Descentes.

Ao declarar a Década Internacional de Afrodescendentes (2015-2024), a comunidade internacional reconhece que os povos afrodescendentes representam um grupo distinto cujos direitos humanos precisam ser promovidos e protegidos.

O Brasil firmou compromisso de diminuir os números de mortes maternas até 2030, dentro dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável Assim sendo, é necessária a sua eliminação por meio do seu reconhecimento no país e da promoção de mudanças na cultura organizacional, objetivando a adoção de práticas de combate ao racismo dirigidos ao seu enfrentamento, assim como a comunicação pública de compromisso do país com a diversidade e enfrentamento de atos discriminatórios, a fim de que todos possam ter o acesso devido aos serviços públicos sem qualquer discriminação, já que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado, conforme prescreve a Constituição brasileira de 1988.

 

segunda-feira, 14 de setembro de 2020

Mulheres negras enfrentam barreiras para sustentar candidaturas


Por Mônica Aguiar 

Apesar dos registros existentes de eleições no Brasil ocorrerem desde o período colonial, as eleições diretas e democrática tem história recente.
A primeira eleição em território brasileiro aconteceu em 1532, de forma indireta, com regras compiladas de Portugal. 
Determinavam a escolha das pessoas que ocupariam os cargos da Câmara Municipal e que seriam responsáveis pela administração das vilas coloniais.
Somente os denominados homens bons podiam, votar e ser votados. (Grupo de homens que possuíam alguma linhagem nobre ou que possuíam algum negócio de importância).
Em 1824, no período monárquico, além do voto não ser secreto, somente os homens livres, maiores de 25 anos e ricos poderiam votar.

Por que faço esta abertura?

As eleições no Brasil, é marcada por um passado com profundas exclusões e alterações de ordem conjuntural. As sequelas do sistema escravagista existentes estão apontadas de forma direta nas regras e resoluções tomadas internamente por vários partidos políticos que, não querem garantir a participação das mulheres e dos negros e negras de forma igualitária neste espaços de poder.

A quarta república foi uma das responsáveis pela institucionalização das desigualdades na política. Um formato que não permitiam pessoas analfabetas votassem.
O mesmo acorriam com centenas de mulheres analfabetas, não podiam votar. 
Como a maioria dos analfabetos compunham a massa da população negra brasileira, também não tinham o direito de votar. 

O Código Eleitoral de 1932 tem 88 anos. A promulgação da Constituição de 1988 tem apenas 32 anos.  Muitas alterações foram e, ainda, são necessárias para garantir que pessoas ou grupos étnicos/raciais que compõem a maioria da sociedade tenham espaços e diretos iguais.

A população masculina e branca ainda são a maioria dos parlamentares (deputados federais, estadual e vereadores) Executivos (governadores e prefeitos), em todo Brasil. 
Dentro dos partidos políticos são os que mais tem conhecimento político, alta escolarização, representação, decisão, intervenção e alto poder econômico.

Várias frentes marcaram a história eleitoral brasileira ao lutar por um processo eleitoral democrático e o voto como exercício de cidadania, tanto para as mulheres, quanto para população negra. 
Brasil é o pais com um dos piores rankings de presença feminina no poder político. Para população negra continuamos como estivéssemos guardados no período colonial, mesmo tendo o direito ao voto . 

Nas últimas eleições municipais, em 2016, apenas 29% dos prefeitos eleitos eram negros e negras. Já nas câmaras municipais, 42% dos vereadores eram negros.
Dos 5.531 prefeitos eleitos nas últimas eleições, apenas 1.603 se declararam pretos ou pardos e desses, apenas 178 eram mulheres negras.

Das 7.689 candidaturas aptas em 2018, 31,6% eram mulheres. Mesmo com a iniciativa conquistada pela mulheres em 2018, de ser obrigatório que 30% do Fundo Eleitoral fosse direcionado para candidaturas femininas, o   percentual da cota de candidatas permanecem baixos: Para as disputas e no resultado.  

Dentre os 57.859 vereadores eleitos, 7.809 eram mulheres e apenas 2.872 negras.

Estudos e dados divulgado também pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram ainda que negros são minoria como candidatos. Foram 32,8% e 48,6% dos que lançaram seus nomes para o executivo e legislativos, respectivamente, dos municípios, em 2016.

A falta de representação da população negra como parlamentares, incomoda setores e seguimentos  que sempre lutaram para  corrigir disparidades das desigualdades existentes na política brasileira.

Neste ano 2020, em agosto, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu que os recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) passem a ser distribuídos pelos partidos de forma proporcional entre as candidaturas de negros e brancos.

Pela decisão, o critério de distribuição também deverá ser observado na divisão do tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão. A decisão foi motivada por uma consulta apresentada pela deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ), pré-candidata à Prefeitura do Rio de Janeiro.

A distorção para cada candidaturas ficam maiores quando analisados os dados de presença das mulheres negras.

As mulheres negras ainda encontram muitas dificuldades de inserção internas nos partidos. O protagonismo estar a cargo dos homens brancos na ampla maioria dos partidos.
Muitas tomadas de decisões são determinantes para demarcar o território e espaço que as mulheres negras estão subordinadas a ocupar na sociedade desde a escravatura. 

A falta de transparência na distribuição dos recursos do fundo eleitoral, conforme percentual determinado pelas regras legais, também faz parte da dificuldade encontrada por muitas mulheres negras. Mesmo com os avanços conquistados para ajudar a impulsionar a presença da mulheres é visível a concentração de investimento financeiro em candidatura feminina branca muito justificada como uma “candidatura de confiança”, que fato, seve para  garantir a perpetuação da linhagem política e familiar de alguém de tradição partidária.  

Poderão ser eleitos em 2020: 5.565 prefeitos e 57,814 mil vereadores em todo Brasil. 

Os acordos políticos em prol de garantir a imagem e representatividade masculina na política ainda superam o cumprimento das legislações.

Quanto mais pobre, mais próxima da comunidade, com menor escolaridade, menores serão os investimento para que esta mulher negra seja eleita.

Afinal a cabeça pensa, onde seu pé pisa!
Estas representações deveriam ser garantidas para ocupar estes espaços de poderes, mas estas, para os partidos políticos, não são bem vindas!   

quarta-feira, 9 de setembro de 2020

Desigualdades no trabalho somente acabaram quando Governos tiverem compromissos com as Mulheres


Por Mônica Aguiar 


Em junho de 2019, os dados do desemprego de longo prazo, no primeiro trimestre, já atingiam fortemente as mulheres. Entre as desocupadas, 28,8% permaneciam  nestas condições, há pelo menos dois anos. 

No quarto trimestre de 2019 as trabalhadoras domésticas independente da formação, representavam 92,4% e, mais de 70% não tinham registro na carteira de trabalho. 

As mulheres negras representavam 74% das mulheres sem o registro.

Em junho de 2020, os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), realizada pelo IBGE, reafirmou que o desemprego atingiu 14,5% das mulheres. São 39,4% superior a taxa de desocupação dos homens.

Estes dados que vem crescendo alarmantemente por conta da pandemia e por estar sendo retirado pelos atuais governantes, a responsabilidade do Estado em desenvolver ações de combate às desigualdades raciais e de gênero. As mulheres além de ser as mais atingidas pela crise econômica, são as mais afetadas por todos os efeitos da pandemia.

Segundo o IBGE, 38 milhões de pessoas no Brasil estão abaixo da linha pobreza; dessas, pelo menos 27,2 milhões são mulheres; elas também são a maioria entre a população idosa (56%) que sobrevive sozinha e com pequenos recursos.

No ranking da igualdade salarial, o Brasil é o penúltimo entre todos os países das Américas, perdendo só para o Chile (ocupamos o 124º lugar de 142 países avaliados). Estar no poço das desigualdades.  

As mulheres estão em maioria, exercendo as funções na prestação de serviços, serviços essenciais, domésticos, impactando consideravelmente na população negra.

Com o isolamento social, as categorias que mais sofrem e tiveram perdas, são as diaristas e empregadas domésticas, compostas por maioria de mulheres negras.

Se compararmos a participação das mulheres no mercado de trabalho, no período de 2019 e 2020,  depararemos com uma queda em 2020 de 7 pontos percentuais.  

Devemos lembrar que, mesmo as mulheres que tem mais qualificações(formação acadêmica e técnica), encontram dificuldades de se manter no mercado de trabalho. 
As mulheres com mais qualificações e que, ainda estão trabalhando, também tem a renda menor que de homens e encontram grandes dificuldades de ascensão na carreira.  

Milhares de mulheres com qualificação, ocupam postos  de trabalhos bem diferentes de sua formação acadêmica e técnica. A maioria são mulheres negras. 

Uma mulher chega ganhar 20% menos que um homem. Uma mulher negra chega ganhar 50% menos. Estas diferenças tem se aprofundado casa dia mais. 

Muitas profissões são usadas para demarcar o território e a renda que as mulheres são subordinadas a ocupar. Principalmente quando esta ocupação for pleiteada por uma mulher negra. 

Nesta conjuntura, em todas as funções, as mulheres enfrentam mais horas de trabalho que os homens. 

Considerado o período de isolamento social, com tantas creches e escolas fechadas, com salários tão baixos, sem condições de assumir a contratação de uma profissional, por ser chefe de família ou dividir as despesas do lar, a maioria das mulheres tem assumido uma jornada de trabalho exaustiva, ao ter que conciliar:-  trabalho fora, trabalho em casa, cuidado dos filhos ou netos, educação direta, ajuda à familiares e sobrevivência.

Com o nível de cobrança muito maior, muitas mulheres sofrem com a violência doméstica, discriminações e preconceitos dentro dos lares e na sociedade em seu entorno. 

A falta de perspectiva na política brasileira, passam a ser refletidas nos rostos cansados, vistos diariamente pelas ruas.   

Não é fácil para uma mãe ver seus filhos passando fome. Ao conversar com algumas mulheres, várias fizeram seguintes relato:

“Se estivessem pequenos, eu teria pelo menos o leite do peito para dar”

O Governo Bolsonaro e maioria dos Estados e Cidades, não se dispuseram em dar um passo, em direção ao combate às desigualdades sociais e raciais no mercado de trabalho para as mulheres antes e  durante a pandemia.

As mulheres são consideradas por estes gestores, pessoas sem direitos, de segunda categoria.  
Eles abandonaram totalmente a ideia que as mulheres são peças fundamentais para o equilíbrio da sociedade e, para isto as políticas afirmativas, transversais, intersetoriais, oportunidades e equidade são estratégias fundamentais. 

Acreditam que quaisquer políticas de gênero e raça são instrumentos ideológicos. 

Não aceitam desenvolve-las, e já retiraram vários recursos das politicas desenvolvidas que sobreviveram, como o foi o corte feito de repasses orçamentários para políticas de combate a violência contra mulher. 
Cortaram orçamentos e mudaram ações na saúde, educação e habitação direcionadas às mulheres.  

De fato, estas perdas obtidas, são medidas reparatórias, fundamentais no equilíbrio econômico e social.  

Mas estes Governos, vem interferindo de forma direta e negativa em todo processo de reorganização ou rearranjo econômico e social das mulheres na sociedade, interrompendo com todo o processo da diminuição de desigualdades entre homens e mulheres no mercado de trabalho e demais setores.  
Mesmo com 70% das mulheres preferindo um emprego a ficar em casa . E prova disso , foi o relatório 2020, do Fórum Econômico Mundial, que conclui que a igualdade de gêneros só se dará em 2095, e se houver avanços nas políticas pelos direitos das mulheres.

Precisamos modificar as justificativas das práticas machistas associadas a um comportamento cultural. 
Para estes governos,  isto é um prato cheio para incluir valores religiosos, desqualificar o que estava sendo construindo como política de Estado para as mulheres e para o povo negro e fortalecer a penalização da maternidade existente sejam em empresas públicas ou privadas.  
A tolerância e igualdade de direitos, são princípios fundamentais garantidos na Constituição  Brasileira, mas,  não tem o menor valor para eles.

A lacuna que deveria diminuir, só cresce.  


Fontes: IPEA/ Pravale/Camara/ INPER

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