quarta-feira, 26 de abril de 2017

Mulher Negra e Literatura Brasileira

por Mônica Aguiar 

Ampliar o espaço da mulher negra no mercado editorial, desmistificar a interpretação que a literatura produzida por mulheres não integra diversos gêneros e que vai além dos romances afetivos ou autorais, equiparar a comercialização das publicações e leitura entre autores e autoras, não é uma tarefa fácil .

 O fato do mercado editorial  ser muito restrito e não permitir  por diversos preconceitos,  oferecer visibilidade as produções realizadas por mulheres negras, engrossam as fileiras dos dificultadores presentes em toda linha da historia literária no Brasil.

Os esforços que vários grupos de mulheres tem improvisado na atualidade, através de diversas agendas positivas, tem cooperado para divulgar literaturas e desmistificar preconceitos existentes, em torno dos trabalhos  produzidos,  principalmente pelas mulheres negras da literatura.

Mesmo com a deficiência vivente na divulgação, que não alcança com a mesma proporção divulgações de  produções de homens,  que tem setores da mídia a seu favor, as mulheres negras estão paulatinamente entrado neste mercado, mostrando que são capazes de competir, mesmo não sendo garantido pelo mercado a igualdade, objetivo este, de trabalhos desenvolvidos, por vários coletivos literários de feministas negras,  em diferentes regiões do país.

Entre vários coletivos literários estão :- Leia Mulheres, Leia Poetisas, Coletivo Marianas, Kdmulheres e Leia Mulheres Negras,  que traz como ideia principal,  preencher nas livrarias e estantes pessoais, uma lacuna criada pela falta histórica de reconhecimento cultural e intelectual feminino.
Coletivo Leia Mulher Negra

Em entrevista cedida ao Correio, em março deste ano, a  professora e pesquisadora Bianca Gonçalves que  estuda a questão das autoras negras e da literatura marginal-periférica, fundadora  do  Grupo Leia Mulheres Negras, lembrou que a maioria dos autores em editoras nacionais é composta por homens brancos de classe média .  
“....é fundamental preencher essa lacuna no mercado literário.....”
“Essa maioria insiste em construir ficcionalmente o mesmíssimo espaço que ocupam” ...., afirma.

Outro ponto importante ressaltado por Bianca, é a questão do próprio acesso à leitura e aos estudos, historicamente mais restritos entre a população negra brasileira.

“Escrever um livro talvez seja o ápice da atividade intelectual, algo que demanda tempo e capital, tanto financeiro como cultural. As lutas pela democratização do ensino, reivindicações por cotas e políticas de permanência em universidades são centrais para a existência da paridade entre pessoas negras e brancas no exercício intelectual”.

Diferença histórica
De acordo com o livro Literatura brasileira contemporânea, de Regina Dalcastagné, publicado em 2012, 72% dos autores publicados no Brasil são homens, brancos, de classe média, moradores do Rio de Janeiro e São Paulo, professores ou jornalistas. As mulheres continuam sendo minoria no mercado editorial.





Leia Mulheres Negras 

é um projeto que busca contribuir na visibilidade da produção literária de mulheres negras
https://www.facebook.com/leiamulheresnegras/





Escritoras Negras Brasileiras que 
Devemos Conhecer


Maria Firmina dos Reis

A primeira romancista negra brasileira, nascida em 1825. Publicou Úrsula, não seria apenas o primeiro romance abolicionista da literatura brasileira - fato que nem todos os historiadores admitem - mas é também o primeiro romance da literatura afro-brasileira, entendida esta como produção de autoria afro-descendente, que tematiza o negro a partir de uma perspectiva interna e comprometida politicamente em recuperar e narrar a condição do ser negro no Brasil. 
Em 1880, fundou uma escola gratuita e mista, para meninos e meninas, o que causou escândalo no povoado de Maçaricó, em Guimarães. Afinal, a escola teve que ser fechada .

Carolina Maria de Jesus

Seu primeiro livro retratava um sistema cruel e corrupto reforçado durante séculos por ideais colonizadores presentes nas dinâmicas sociais da população, onde o Estado não atuava da maneira correta para reparar tais erros. Suas histórias representavam perfeitamente como o Estado se mostrou falho ao longo dos anos no Brasil, colocando em xeque se o mesmo é capaz de organizar as relações sócio-econômicas presentes no dia a dia. Carolina lutou para se manter fiel à escrita, e aos filhos, era chefe de família . Ao mesmo tempo em que trabalhava como catadora de lixo,  apesar de ter cursado apenas as séries iniciais do primário, registrava o cotidiano da comunidade em cadernos arranjados . Um destes cadernos, um diário que havia começado em 1955, deu origem ao seu livro mais famoso, Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada, publicado em 1960.

Jarid Arraes

É cordelista, escritora e autora do livro “As Lendas de Dandara“. 
Criadora do Clube da Escrita Para Mulheres. Tem mais de 60 títulos publicados em Literatura de Cordel. Nasceu em Juazeiro do Norte, cidade localizada na região do Cariri, interior do Ceará, em 12 de Fevereiro de 1991.
Começou a publicar seus escritos aos 20 anos de idade, no blog Mulher Dialética. Em Julho de 2015, Jarid Arraes publicou “As Lendas de Dandara”.
 Além do livro “As Lendas de Dandara”, suas obras mais conhecidas são os cordéis da Coleção Heroínas Negras da História do Brasil; neles, são resgatadas biografias de grandes mulheres negras que marcaram a história brasileira, como Antonieta de Barros, Carolina Maria de Jesus, Tereza de Benguela, Laudelina de Campos, entre outras. A autora também possui cordéis infantis, como “A menina que não queria ser princesa” e “A bailarina gorda” e “Os cachinhos encantados da princesa”.


Conceição Evaristo

É mestra em Literatura Brasileira , e doutora em Literatura Comparada .
Suas obras, em especial o romance Ponciá Vicêncio, de 2003, abordam temas como a discriminação racial, de gênero e de classe. A obra foi traduzida para o inglês e publicada nos Estados Unidos em 2007.
Conceição Evaristo é militante do movimento negro, com grande participação e atividade em eventos relacionados a militância política-social. Ganhadora de vários prêmios,  “Olhos d’água” (Pallas), vencedor do Prêmio Jabuti na categoria Contos em 2015, ajusta o foco de seu interesse na população afro-brasileira ao abordar, sem meias palavras, a pobreza e a violência que a acometem
 O talento da autora, aliado à sua luta por mais visibilidade a vozes tradicionalmente marginalizadas, fez dela uma das principais personalidades culturais de 2016.  

Alzira Rufino

É ativista política atuante no movimento de Mulheres Negras. Alzira é Iyalorixá, poeta e Presidente da Casa de Cultura da Mulher Negra . Tem publicado artigos em jornais e revistas brasileiras e do exterior. Ganhou diversos prêmios de poesia em nível local e nacional e tem publicações de poesia, ficção e ensaios. Foi a primeira mulher a ter seu depoimento gravado no Museu de Literatura Mário de Andrade, participou de uma feira feminista do livro no Canadá, em 1988. Em 1988 ela lançou seu Eu, mulher negra, resisto, um livro de poesia. Além de escritora, é também ativista pioneira sobre a violência contra a mulher negra na Baixada Santista, em São Paulo.


Geni Guimarães 

O primeiro livro, Terceiro filho, foi lançado em 1979. Na década de 1980, aproximou-se do Movimento negro e suas obras passaram a refletir a preocupação com a cultura afro-brasileira. Escreveu contos para a revista Cadernos Negros e em 1989 publicou A cor da ternura, novela que recebeu o prêmio Adolfo Aisen


Miriam Alves 

Poeta, dramaturga e prosadora brasileira, tem cinco livros publicados. Defensora dos direitos dos afrodescendentes e da mulher, principalmente da mulher negra. Contribui de forma decisiva para a valorização dos afrodescendentes e a divulgação da literatura negra brasileira no Brasil .  Publicou  Mulher Matiz uma a reunião de vários trabalhos publicados a o longo de 25 anos de minha vida literária. A maioria consta em publicações, já esgotadas, da coletânea Cadernos Negros, que começou a  a publicar no ano de 1983. Outros foram traduzidos para o alemão e o inglês, sendo publicados em coletâneas na Alemanha e Estados Unidos e Inglaterra. Os textos  agrupados revelam o universo da mulher afro-brasileira em suas várias possibilidades vivencial-afetivas.Tem os seguintes livros de poemas publicados: Momentos de BuscaEstrelas nos Dedos, a peça teatral Terramara, ensaios em Brasilafro AutorreveladoBará – na Trilha do Vento e o livro de contos Mulher Mat(r)iz

 Lia Vieira 

É uma autora com vasta publicação de contos e poemas editados em “Cadernos Negros”, sempre tratando a realidade das mulheres negras com muita astúcia. Com nove contos, seu Só As Mulheres Sangram colocam em cena um panorama frequentemente excluído da literatura brasileira: a da mulher negra. De sua autoria, os livros “Eu, mulher” – mural de poesias (1990) e “Chica da Silva – a mulher que inventou o mar” (2001) e agora este “Só as mulheres sangram”, sob a chancela da editora mineira Nandyala e com prefácio da escritora e ensaísta Miriam Alves.

Cristiane Sobral 

É atriz, escritora e poeta brasileira.Estreou na literatura em 2000, publicando textos nos Cadernos Negros. Foi crítica teatral da revista Tablado, de Brasília. Mestre em Artes (UnB) com pesquisa sobre as estéticas nos teatros negros brasileiros. Membro do Sindicato dos Escritores do DF. Dez anos depois veio sua primeira obra autoral Não Vou Mais Lavar os Pratos, atualmente na segunda edição.

Esmeralda Ribeiro

Jornalista, nascida em São Paulo em 1958, faz parte da Geração Quilombhoje, sendo uma das coordenadoras , atua nos movimentos de combate ao racismo e na construção da Literatura Negra. Publicou seu próprio livro de contos, o Malungo e Milongas (1988), que ficou bastante famoso nas traduções para a língua inglesa.


Lélia Gonzalez 

Política, professora e antropóloga brasileira. Graduou-se  em história e filosofia e trabalhou como professora da rede pública de ensino. Seus escritos, simultaneamente permeados pelos cenários da ditadura política e da emergência dos movimentos sociais, são reveladores das múltiplas inserções e identificam sua constante preocupação em articular as lutas mais amplas da sociedade com a demanda específica dos negros e, em especial das mulheres negras.Seu livro de 1987, o Festas Populares no Brasil, é um dos maiores clássicos da literatura negra – e brasileira como um todo.

Ana Maria Gonçalves 

Escritora brasileira, escreveu seu primeiro livro  Ao lado e à margem do que sentes por mim em 2002. O livro foi publicado de forma independente.  Vendido pela própria autora pela internet.
Seu segundo romance, Um defeito de cor, de 2006, conquistou o Prêmio Casa de las Américas na categoria literatura brasileira. A obra, inspirada na vida de Luísa Mahin, conta a trajetória de uma menina nascida no Reino do Daomé e capturada como escrava aos 8 anos de idade, até a sua volta à terra natal como mulher. 

            
Elisa Lucinda

Poeta, jornalista, cantora e atriz brasileira.
Fundadora da «Casa-Poema», instituição sócio-educativa. 
Publicou a Lua que menstrua (produção independente, 1992), entre outros, os livros "A Menina Transparente", "Euteamo e suas estréias", "O Semelhante" e a "Coleção Amigo Oculto" (trilogia infantil). Gravou os Cd’s de poesias: “Semelhante” e “Euteamo e suas Estréias” , sob o selo da gravadora Rob Digital.


Fontes: correiobraziliense / Wikipedia/mdemulher/ nossaescrevencia/ Fotos : Internet

Contadores de Mentira Abre Festival das Mulheres a partir desta quarta, em Suzano

A programação inclui sarau, teatro, workshop e performances. Parte das atividades são gratuitas


A partir de hoje, quarta-feira (26),  será realizada a segunda edição do “Ventre em Teia – encontro de mulheres da cena”, do Teatro Contadores de Mentira, em Suzano.

A programação vai até domingo (30), grande parte da programação é gratuita. 

Estão previstos sarau, ensaio aberto, abertura de processo, perfomance e workshop. Além do ato artístico, as apresentações terão um viés político.

Segundo a idealizadora do encontro, a atriz Daniele Santana, a ação é para refletir e também agir sobre a caminhada das mulheres. O encontro terá a presença de mulheres que têm lutado para garantir o espaço da mulher na história da arte.

“Em muitas partes do mundo mulheres têm se unido para discutir direitos sociais e históricos, direito básicos como o de escolher sua profissão, sua sexualidade, seu caminho. Batalhando por direitos óbvios como o direito a seu próprio corpo, a dizer o que pensa e ser respeitada. Acredito que essas redes e encontros nos encorajam e embasam a falarmos em primeira pessoa, a nos colocarmos no centro da discussão como coletivo e como indivíduo” completa.

O Teatro Contadores de Mentira fica na Avenida major Pinheiro Fróes, 530, no Parque Maria Helena.

Confira a programação completa do evento

  •      Dia 26, às 20h -- Sarau Ventre em Teia: Abordando o tema do protagonismo feminino / gratuito
  •      Dia 27, às 20h - Ensaio Aberto do solo “Eu, Lélia”: presença de Andréia Barros, grupo Teatro da Cidade de São José dos Campos / Ingresso colaborativo (valor mínimo sugerido: R$ 5)
  •      Dia 28, às 20h -  Oficina Dança Afro-brasileira: da tradição aos procedimentos de criação para dança contemporânea, com Yaskara Manzini, de São Paulo/  gratuito
  •      Dia 29, às 18h - Teia de Experiência: Roda de conversa com fazedoras e militantes culturais, prática, pensamentos e luta /  gratuito
  •      Dia 29, às 20h - Re-visitando Lugares Sagrados: depoimento cênico sobre ecos do sagrado no corpo e na cena, com Paula Ibañez, de Piracicaba / Ingresso colaborativo (valor mínimo sugerido: R$ 5)
  •      Dia 30, às 19h - Tapete Manifesto: com a presença de Thaís Medeiros, de São Paulo / Ingresso colaborativo (valor mínimo sugerido: R$ 5)
  •      dia 30, às 20h - Performance Gotas d´Água: com a presença de Paola Velluci, do Rio de Janeiro  / Ingresso colaborativo (valor mínimo sugerido: R$ 5)
Fontes:G1/secmogi/itaqueranet/

Foto:  no Teatro Contadores de Mentira,  Jacqueline Angelo

segunda-feira, 24 de abril de 2017

Proposta Sugere Garantir Falsas as Denuncias de Estupros Transformando como Crime Hediondo e Inafiançável

Tramita no Senado uma sugestão de lei que visa transformar falsas denúncias de estupro em crime hediondo. 

Entenda por que isso é absurdo e muito perigoso.

Por Júlia Warken

Pouca gente sabe, mas lá no portal e-Cidadania é possível sugerir novas leis, fazer com que elas sejam votadas pela população e que sejam encaminhadas ao Senado. É só lançar a ideia e, caso 20 mil pessoas se mostrem favoráveis, ela se transforma oficialmente em uma Sugestão Legislativa e é encaminhada aos senadores para análise. Com isso, a sua ideia pode oficialmente virar uma PL (Proposta de Lei) como as que são elaboradas pelos deputados.
No dia  (19), uma dessas sugestões está chamando a atenção, depois de ter sido divulgada pela página do Senado no Facebook. Ela pede que a falsa acusação de estupro seja transformada em crime hediondo e inafiançável.

“Devido a impunidade, diversas mulheres se utilizam desse artifício [a denúncia de estupro] para atingir homens, que tem sua vida arrasada, muitas vezes é estuprado na cadeia, sofre linchamento público, perde o emprego e dignidade e nada acontece” (sic), defende Rafael Zucco, o cidadão que lançou a ideia. Vale lembrar que 20 mil pessoas já mostraram-se favoráveis à proposta e, nesse momento, ela está aguardando a análise da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa

Assim como o autor da sugestão, milhares de brasileiros acreditam que essa nova lei seria um avanço na prevenção da impunidade. Na visão dessas pessoas, há muito mais falsas acusadoras impunes do que estupradores impunes. Acontece que isso não condiz com a realidade. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), apenas 10% dos estupros são denunciados no Brasil. Segundo esse levantamento, 575 mil estupros acontecem por ano no país, mas, deste total, apenas cerca de 47 mil são levados à justiça.

Nove em cada 10 vítimas de estupro optam pelo silêncio e as principais razões são: vergonha, ameaças por parte do estuprador, auto-culpabilização (quando a vítima acha que mereceu ou facilitou o estupro) e a dificuldade em recolher provas. “Se o estupro acontece em casa normalmente há vestígios, como sangue, casa desarrumada, pelos, etc. Mas há um descaso muito grande, mais uma vez porque a cultura do estupro culpabiliza a vítima e a gente precisa quebrar esse ciclo. É preciso que as provas sejam colhidas e que a investigação seja conduzida de outra forma”, explica a juíza Teresa Cristina dos Santos, especialista em violência doméstica. 

Ou seja: pouquíssmas vítimas denunciam e, quando a denúncia é realizada, a vítima ainda encontra uma enorme dificuldade para provar que foi estuprada. E qual o resultado disso? Estupradores impunes. A juíza também chama a atenção para o fato de a perícia policial costuma ser muito mais rigorosa em casos de crime contra o patrimônio do que nos de violência contra a mulher. Ela conta que geralmente o laudo só da conta de analisar a integridade física da vítima e a perícia nem mesmo é enviada ao local do crime.
Frente a isso, como é possível afirmar que os homens falsamente acusados são as maiores vítimas da impunidade massiva que caracteriza os casos de estupro? Isso definitivamente não condiz com a realidade e com o fato de que a cada 11 minutos uma pessoa é estuprada no Brasil, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública. 

E sabe o que é pior? Transformar a falsa acusação de estupro em crime hediondo e inafiançável só vai fazer com que ainda menos mulheres denunciem seus agressores. Se 90% delas se calam atualmente, quão maior seria esse número frente ao medo de ser presa por falta de provas? Vale lembrar que no caso do estupro coletivo do Rio de Janeiro, mesmo com a visibilidade internacional e com vídeos comprovando a participação de diversos homens, apenas dois foram condenados.

Lógico que acusar alguém falsamente é algo absurdo, ninguém está dizendo o contrário. O nome disso é calúnia e a punição já está prevista na lei. Acontece que tratar calúnia como crime hediondo vai totalmente contra a legislação vigente (e contra o bom senso). E qual a lógica em dizer que calúnia em casos de estupro deve ter um peso maior do que em casos de sequestro ou homicídio? Fica a questão.

Essa sugestão legislativa – e o fato de ela estar sendo defendida por milhares de brasileiros – é só mais uma prova de que a chamada cultura do estupro é uma triste realidade em nosso país. Tem muita gente interessada em impôr que o silêncio seja regra e que a violência sexual seja ainda mais corriqueira (e impune) do que já é.

Fonte: Abril 




Obras Escritas por Mulher Negra é incluída na Listas de Leituras Obrigatórias para Vestibular

A Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) divulgou a lista de livros de literatura que fazem parte da leitura obrigatória para o vestibular de 2019, que será realizado no ano que vem. A relação conta com três novidades, sendo, duas delas, obras de autoria feminina: o livro de poesia “A teus pés” de Ana Cristina Cesar, e o
 diário de Carolina Maria de Jesus “Quarto de Despejo”.



Como de praxe, a Unicamp pede para que os vestibulandos leiam 12 obras que serão questionadas na prova, e, até este ano, apenas uma autora mulher fazia parte deste quadro, sendo Clarice Lispector, com o conto “Amor”, do livro Laços de Família.
No caso de Maria Carolina de Jesus , que é mulher, negra, periférica e autora, Renata fala da necessidade desse perfil ser estudado em um dos vestibulares mais importantes do país. “Ela escreve sobre sua vida, sobre o lugar em que vive. O livro versa sobre essa realidade que é a realidade de muitos dos estudantes brasileiros e não podemos ignorar isso”, lembra a coordenadora de Linguagens e educadora de Literatura no Curso Mafalda Renata Cristina Pereira.

Quanto à menção de Ana Cristina Cesar na relação da universidade, Renata elogia a iniciativa. “Ter a poesia presente, poesia contemporânea, que durante muito tempo foi marginalizada, ocupando espaço entre os jovens e estudantes só aumenta o repertório deles.”
Inclusão dos nomes femininos é reflexo da sociedade atual

Outro ponto que não pode ser deixado de lado é que os assuntos trazidos por essas autoras, seja por meio de suas obras ou análise de suas vidas, estão ganhando cada vez mais espaço em discussões sociais, que antes eram abafados ou negligenciados.
Durante muito tempo,  mulheres e suas descobertas e criações foram apagadas da história e as consequências desse longo período ainda são refletidas no corpo social. O mercado editorial ainda vende muito mais livros escritos por homens .
Anteriormente, alguns nomes consagrados como o de Cecília Meireles, Clarice Lispector ou Rachel de Queiroz já haviam sido, ou são, parte do catálogo de obras estudadas no período escolar, mas mesmo com tantas outras autoras que poderiam facilmente receber o mesmo prestígio, a presença feminina se manteve limitada até então.
Com a repetição das mesmas escritoras, e sem inclusão de novas personalidades, o estudante acaba perdendo repertório, e oportunidade de conhecer diferentes maneiras de escrita, conforme explica a coordenadora de Linguagens do Curso Mafalda. “Estudar Cecília Meireles não quer dizer que não é valido. Mas a poesia dela é totalmente diferente da Ana Cristina Cesar, que ocupa um lugar da marginalidade, pouco explorado até o momento.”
Segundo a educadora, o contato com assuntos diversos na literatura é bastante poderoso, e pode, inclusive, influenciar a maneira como as pessoas agem perante a sociedade. “Eu acredito que a literatura tem papel fundamental no que diz respeito à espirito de alteridade, ou seja, na sua capacidade de se colocar no lugar do outro. Sinto que a literatura exerce esse papel na vida do sujeito que realiza leituras.”

Fontes:IG/Ag.Patrícia Galvão 


quarta-feira, 19 de abril de 2017

Mulheres indígenas criam agência de notícias

por Elaine Tavares
A comunicação tem se mostrado um campo de batalha decisivo. Os meios comerciais agem cada vez mais como usinas ideológicas, disseminando não as notícias, mas sim a ideologia necessária para respaldar o poder dominante. 
As vozes dos movimentos, dos trabalhadores, da periferia não conseguem se expressar nesses espaços. Por isso, com as novas tecnologias aproximando pessoas e garantindo as condições materiais para a produção de informação, cada vez mais os movimentos se articulam e buscam criar espaços próprios de comunicação. 
Essa semana, no México, um grupo de mulheres, comunicadoras, apresentou a Agência de Notícias de Mulheres Indígenas e Afrodescendentes, a Notimia. A proposta é garantir o espaço para vizibilizar a luta dos povos e comunidades de toda a América, mundializando a cobertura.  O grupo tem o apoio da Agência Espanhola de Cooperação Internacional e da ONU-Mulheres. Assim, dessa vez , as mulheres indígenas e negras terão um papel preponderante na 16 sessão do Fórum Permanente para as Questões Indígenas da ONU, que acontece de 24 de abril até cinco de maio. 
A cobertura deverá ser o primeiro grande trabalho da agência, que pretende espalhar pelo mundo as vozes dos indígenas, sempre tão cerceadas. Não bastasse isso o grupo deverá começar a abastecer o mundo todo com narrativas dos povos indígenas,  dos afrodescendentes, histórias e lutas em andamento. O foco são as questões das mulheres, mas não só. A rede Notimia - vozes, meios e redes para a paz tem um número de 200 colaboradoras profissionais de todo o continente americano, bem como da África, Ásia e Oceania. Ainda que a proposta nasça com o apoio da ONU, certamente significará um passo muito importante na batalha informativa. Pelo menos serão as próprias mulheres indígenas e afrodescendentes que falarão por si mesmas. 

segunda-feira, 17 de abril de 2017

Jovem negra dá resposta perfeita a usuário que insultou seu tom de pele no Twitter

Uma aspirante a modelo conquistou a Internet após responder a um usuário racista no Twitter que ela seria mais atraente se sua pele fosse “mais clara”.
A estudante de 19 anos é originalmente de Camarões, mas atualmente vive em Maryland, Estados Unidos, onde persegue seu sonho de se tornar modelo. Algumas de suas fotos publicadas no Instagram foram compartilhadas recentemente no Twitter pelo perfil @_AFRICANS_.

Como milhares de pessoas fizeram elogios para Mimi, um usuário manifesta seu racismo,  ao  compartilhar a sua opinião insultando a cor da jovem.
[Se] ela fosse mais clara, seria maravilhosa,” escreveu ele.

Mimi  pronta para lidar com a situação, respondeu com muita classe e autoconfiança na sua cor.
“Não, obrigada, eu não trocaria a cor da minha pele por nada no mundo,”  “Ainda sou maravilhosa”.

Em poucas horas a resposta de Mimi havia sido compartilhada milhares de vezes com centenas de mensagens de apoio e aplausos.

Embora a estudante universitária tenha ficado decepcionada com o comentário cheio de ódio a respeito da cor da sua pele, ela não ficou surpresa  .

 Agora, Mimi espera que a atenção que sua publicação recebeu a ajude a aumentar a consciência de que o racismo  ainda existe e esta presente cotidianamente principalmente na vida das mulheres negras.

Ela disse ao BuzzFeed News: 
“Agora eu sinto que tenho uma plataforma que quero usar para dialogar  com outras mulheres de pele escura que estejam passando por situações semelhantes, e provavelmente culpando a si mesmas por isso… Eu queria que as pessoas vissem que o problema da cor ainda é real”.

Mimi tem uma mensagem para mulheres negras que são vítimas de comentários racistas  sobre a cor da sua pele:
“Apesar do que os outros possam dizer, você é linda e deve se sentir confiante em sua própria pele,” ela disse ao Elite Daily



 Foto: Instagram/dopelike_mimi]
Fonte:Yahoo

quarta-feira, 12 de abril de 2017

A urgência do pensamento feminista negro para a democracia

Por Juliana Borges

Patricia Hill Collins (esq.) e bell hooks (dir.).
O feminismo é um movimento político e de transformação que disputa todas as esferas da vida e do poder. Não por acaso, feministas cunharam a expressão “o pessoal é político”, tendo por objetivo lançar à esfera pública as desigualdades de gênero, bem como impulsionar, com isso, a defesa de uma sociedade igualitária. Neste sentido, o feminismo é uma ideologia e, como tal, constitui e disputa um projeto de mundo que abarca todas as esferas, sejam elas filosóficas, sociológicas e econômicas.
Contudo, dadas as suas diversas vertentes, cada vez mais tem se optado pelo uso da expressão “feminismos” para garantir o caráter plural deste movimento. Ainda sim, é importante ressaltar os pontos-chave e de encontro destas diversas vertentes. São elas: a luta pelo fim da subjugação das mulheres, a autonomia, o fim do Patriarcado, a pluralidade de existências e atuações, e a defesa da igualdade.
O pensamento feminista negro, por sua vez, se estabelece a princípio apontando esse elemento da pluralidade de existências e pautando-se contra universalidades. Em visita recente visita ao Brasil, a socióloga afro-americana Patricia Hill Collins delineou algumas das questões centrais dele. Em primeiro lugar, uma das premissas fundamentais é de que o pensamento feminista negro não é um aditivo de outros feminismos, mas uma formulação própria feita a partir das necessidades, conhecimentos e formas de atuação política próprias das mulheres negras. Em segundo lugar, o senso de humanidade indissociável da luta feminista negra, a defesa de si conectada à defesa do outro, tendo em vista o processo de desumanização que corpos negros passaram, seja das populações negras em diáspora, seja da constante desumanização das populações negras em África. Ressaltou também a interseccionalidade, que evoca a heterogeneidade, e sublinhou a disputa pelo poder, e não de identidades, como centro deste pensamento, tendo na luta anticapitalista sua forma, já que o capitalismo é um sistema indissociável das desigualdades e da dominação do outro visando o lucro e acúmulo e concentração de riquezas. Por fim, a descolonização dos corpos, mentes e espíritos negros, seja na noção metafórica, seja na noção literal e de entendimento de defesa da liberdade.
Esse conjunto de reflexões aponta para o fato de que o pensamento feminista negro, conforme explicita bell hooks, traz uma crítica global e sistêmica do conjunto das opressões em jogo hoje e, ao interseccioná-las, jamais prescinde da crítica a dominação classista, racista e machista. Com isso, como aponta a filósofa e feminista interseccional Djamila Ribeiro, o feminismo negro nos permite pensar “um novo marco civilizatório”.
Neste momento de reorganização e aprofundamento do neoliberalismo e da ascensão de uma agenda conservadora em um movimento global, nos parece importante recorrer ao pensamento feminista negro como ponto de partida para a construção de renovadas saídas alternativas ao neoliberalismo e perspectivas democráticas.
É apenas no final do XVIII que a ideia moderna de democracia se fixa. A cidadania e o voto, como princípios para a escolha de representantes, foram recuperados da antiguidade clássica. No entanto, esta reconfiguração, ainda assim, tal qual entre os gregos, mesmo que ampliada, não se estendeu a todas as sociedades e indivíduos. Frente à ascensão de regimes autoritários no final do século XIX e início do século XX, a democracia popularizou-se e, após a Segunda Guerra Mundial, passou a ser utilizada como arma ideológica no contexto da Guerra Fria e contra qualquer regime que defendesse forte presença do Estado e a regulação de mercado. É nesse ambiente que o capitalismo passa a tolerar a democracia em alguns cenários. Mas, tendo a desigualdade como elemento constitutivo, os ventos democráticos não se estenderam a todos e todas pelo processo de divisão internacional do trabalho e pelo neocolonialismo essencial ao capitalismo para o desenvolvimento dos países do Norte global, utilizando dos conceitos de Boaventura de Sousa Santos. Com isso, a democracia foi descartada nos países semiperiféricos e periféricos como sistema político, se não apenas como simbólico ideal.
Sendo o pensamento feminista negro constituído na disputa pelo poder, na luta anticapitalista, pela oposição à dominação do outro, e na luta pela descolonização dos corpos, tendo como objetivo a liberdade e a real emancipação, nos parece que a discussão em torno deste momento fundamental de “democratizar a democracia” (para usar a expressão de Boaventura de Sousa Santos em seu livro mais recente A difícil democracia: reinventar as esquerdase construir alternativas sistêmicas passa necessariamente pelo feminismo negro.
Como vimos, a premissa da defesa de si como conectada à defesa do outro é constitutiva do feminismo negro. Neste sentido, a alteridade se coloca como elemento central para possibilitar uma reorganização radical da cidadania e dos direitos construídos sob premissas multiculturais. Ou seja, a constituição da existência de si passa pela existência do outro. Esse princípio do feminismo negro se configura já como anticapitalista e radicalmente democrático na medida em que nega relações de dominação sem apagar a autonomia e a existência do indivíduo e suas liberdades. E o faz no sentido de igualdade, coabitação e coexistência, se contrapondo fortemente ao individualismo próprio do capitalismo.
Aqui, cabe uma palavra sobre o conceito de “lugar de fala”. Muitas vezes confundido com a perspectiva individual do falante, na verdade, o termo diz respeito à perspectiva de um grupo social a partir de experiências historicamente compartilhadas e que produzem ação e conhecimento que devem ter tanta autoridade discursiva quanto o conhecimento produzido por qualquer outro grupo social (Patricia Hill Collins, Black Feminist Thought, Routledge, 2000). Isso para afirmar que o conceito de “direitos individuais” do liberalismo burguês não é uma premissa de onde parte o pensamento feminista negro.
É por isso que a heterogeneidade, compreendida a partir do conceito da interseccionalidade, é outro princípio central que articula o pensamento feminista negro e as ideias democráticas. Afinal, queremos a democracia (na reconfiguração do conceito, sempre em constante movimento e disputa) como uma construção radical de participação, atuação e pluralidades, bem como abarcando a multiplicidade de vozes, representações e auto-representações.
Poderiam ser citados inúmeros outros exemplos para demonstrar que o pensamento feminista negro pode ser uma fonte para este momento de reorganização e de tão importante radicalização dos ideais democráticos. Mas finalizo com uma importante colocação. A construção de novas existências individuais e coletivas não é o ponto de diluição do contexto de luta histórico da classe trabalhadora como agente de transformação. Pelo contrário. Perceber e impulsionar estas novas existências, que questionam como indissociáveis as hegemonias capitalista, machista e racista, é compreender as mudanças no modelo de produção capitalista, inclusive nas suas relações. Estas mudanças não ocorreram apenas no campo econômico, mas também no campo simbólico.
A última pesquisa realizada pela Fundação Perseu Abramo apontou como a ideologia liberal e neoliberal tem se impregnado nas subjetividades e constituição das existências dos indivíduos. Com a complexidade que o capitalismo tomou, um instrumental teórico que articule como indissociáveis as opressões de raça e classe, ao partir do pensamento feminista negro, sempre de olhar interseccional, oferece um enquadramento mais sofisticado para discutir estas existências e, portanto, garantir a multiplicidade de construções nas estruturas sociais e de embate sistêmico.
A igualdade como elemento para a uma democracia radical. O feminismo negro como o marco da imprescindibilidade da liberdade.
Fonte:Blog.daboitempo

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