terça-feira, 24 de outubro de 2023

Em Tempos de Mobilizar e Agir, Em Prol da Saúde das Pessoas Negras! 27 de outubro


Por Mônica Aguiar 

A Saúde da População Negra é estudada há décadas, porém não é uma meta fulgente na política nacional de saúde. 

O racismo provoca grande impacto na qualidade da gestão da saúde pública,  influenciando  diretamente na qualidade de vida da população negra. 

Os estereótipos negativos, sustentados por práticas racistas, tem promovido respostas psicológicas prejudiciais à saúde.

A saúde mais precária desses grupos étnico-raciais vulnerabilidades registra-se no surgimento precoce de enfermidades, na maior gravidade e progressão das doenças, nos altos índices de comorbidades e de incapacitações no decurso da vida, além de elevados índices de mortalidade. Grupos étnico-raciais socialmente estigmatizados também enfrentam déficits de acesso a serviços de saúde e de qualidade da atenção médica. (Racismo e Saúde: um corpus crescente de evidência internacional) David R. William

No ano de 2017, foi instituído a obrigatoriedade e padronização da coleta da raça/cor no SUS nos sistemas de informação da saúde pública brasileira, conforme a Portaria nº 344, de fevereiro de 2017, do Ministério da Saúde. 

Se estivesse sendo cumprida, não faltaria indicadores e estudos para implementar ações em prol à saúde do povo negro, especialmente das mulheres e meninas e negras.   

As medidas reparatórias são fundamentais para combater as desigualdades raciais existentes.

E seja o racismo, estrutural ou institucional, o que permeia as práticas estar influenciando os resultados e diminuem  expectativas de vida e sobrevidas.  

Existem dados sobre as barreiras de acesso e discriminação na área de assistência à saúde. Falta dados qualificados para investigações detalhada sobre a realidade da saúde da população negra. 

RACISMO X SAÚDE

Já que sabemos que o racismo é prejudicial à saúde, qual o tempo é disposto para tratar do racismo na saúde com outro olhar?  O racismo e as desigualdades existentes na saúde atingem grupos da população negra(mulheres, jovens, idosos) de formas diferenciadas. 

Tenho observado que o grau de intensidade do racismo e das discriminações sofridas por mulheres negras estão diretamente ligadas nos números de óbitos previníveis, previsíveis e precoces.

Os óbitos evitáveis voltaram a crescer no Brasil.

O racismo estrutural ou institucional permeando as práticas vai influenciar os resultados, diminuir as  expectativas de vidas e sobrevidas. 

O racismo institucional se manifesta por meio de impedimentos aos benefícios preventivos ou curativos de tratamentos e medicamentos viabilizados pelas políticas públicas de saúde.

A instituição do campo saúde da população negra se faz a partir da constatação de que as relações sociais no Brasil são marcadas pelo racismo, fato encoberto pela ideologia da democracia racial, mas, cabalmente, demonstrado pelos indicadores de saúde que retratam de forma expressiva as desigualdades raciais em saúde, quer se trate do modo como se lidam com as doenças associadas a determinantes raciais/étnicos; da discriminação na assistência ou do perfil epidemiológico marcado pela precocidade dos óbitos. Qualquer que seja o ângulo de aproximação com a realidade, as desigualdades são nítidas e gritantes. 

Conceitos, Comportamentos  X Ciência 

Os dados epidemiológicos obtidos evidenciaram as iniquidades raciais nas condições de vida da população e seu impacto no perfil da morbimortalidade.

O conhecimento do perfil do território no campo social, econômico, de gênero e racial  constitui ferramenta importante no enfrentamento  ao racismo.

Devemos considerar todos os  avanços na instauração de políticas sociais universais que ampliaram o acesso para a população negra na saúde e demais políticas fundamentais, mas, não devemos permitir que este imaginário de “plena universalidade” provoque o reducionismo  e não considere  as especificidades e os determinantes sociais que promovem as  desigualdades e dificultam o acesso da população negra ao sistema de saúde pública. 

Ao longo dos tempos denominações se modificam conforme a amplidão educacional e econômica da sociedade. O racismo não se modifica, se molda, nas estruturas e nas relações humanas. 

Vários conceitos estão sendo empregados para implementar a equidade, principalmente quando o assunto é saúde da população negra. A palavra vulnerabidade parece que é MODA.

Então, qual o conceito universal de vulnerabilidade na saúde pública? Existe?

A depender do entendimento, concepção ideológica e política do que é vulnerabilidade e racismo, um profissional de saúde ou gestor, podem criminalizar e promover uma assistência segregacionista à população negra, no lugar reduzir as disparidades raciais existentes na saúde. Se o conceito de vulnerabilidade estiver ligado aos padrões doutrinários e religiosos, muitas deliberações poderão levar a atenção primária e especializada a ter um perfil higienista social e cultural. Segregando ainda mais a população negra.

Comportamentos pessoais e pensamentos subjetivos tem fomentado o racismo institucional.

 “Valores ideológicos subjacentes ao conhecimento científico e aos processos de alterização que tem conduzido à marginalização, estigmatização e inferiorização de numerosos grupos humanos ao longo da história das ciências

 Os determinantes sociais não podem mais ser banalizados .

Milhões de vidas negras poderiam ser salvas a cada ano, com a implementação de estratégias apropriadas de recursos para prevenção, detecção precoce e tratamento. Mortes maternas e por câncer poderiam ser evitadas se o diagnóstico precoce não fosse o divisor de águas no tratamento.

A existência de notificações compulsórias do quesito raça/cor nos prontuários, formulários e cadastros, tem criado impedimento para levantamento de dados importantes na saúde e produção de estudos mais detalhados do perfil epidemiológico e da situação de saúde da população brasileira. 

Esse tipo de informação nos prontuários, formulários e cadastros é fundamental para subsidiar o planejamento de políticas públicas que levem em conta as necessidades específicas dos diferentes grupos populacionais.

Racismo internalizado, que se manifesta por meio de sentimentos e comportamentos que implicam superioridade/inferioridade, aceitação/rejeição e uso de vieses e estereótipos; Racismo interpessoal, representado por meio de ações e omissões por falta de respeito, perseguição e negligência, intencional ou não;  e o ,Racismo externalizado, que compreende ações e omissões por falta de respeito”.

Existem diversos fatores que demostram as diferenças de mortalidade entre grupos étnico e raciais . Eu acredito que estão relacionadas as assimetrias raciais existentes na saúde. 

Nestes tempos é importante perceber que a pauta dos determinantes sociais de saúde (DSS) é fundamental para salvar vidas e possibilitar que a população negra, não morram precocemente, fiquem sequeladas e ou tenham impactos negativos na saúde física e mental .

Os níveis de atenção e assistência à saúde no Brasil são estabelecidos pela Portaria 4.279 de 30 de dezembro de 2010, que estabelece as diretrizes para a organização da Rede de Atenção à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), sendo eles: atenção primária, atenção secundária e terciária. Eles são usados para organizar os tratamentos e serviços oferecidos pelo SUS a partir de parâmetros determinados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), com o objetivo de proteger, restaurar e manter a saúde dos cidadãos, com equidade, qualidade e resolutividade. É na atenção primária à saúde (APS), porta preferencial de entrada do usuário no SUS, onde a maioria dos problemas de saúde podem ser resolvidos ou encaminhados para tratamento na rede de atenção especializada (níveis secundário e terciário), se for o caso. https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2022/marco/atencao-primaria-e-atencao-especializada-conheca-os-niveis-de-assistencia-do-maior-sistema-publico-de-saude-do-mundo#:~:text=Os%20n%C3%ADveis%20de%20aten%C3%A7%C3%A3o,se%20for%20o%20caso.

Medidas segmentadas, imediatistas, territorializadas com recortes apenas social e estrutural, manterá a população negra exatamente onde foi jogada no (pós) abolição e, não avançará para reparações.

De maneira conjuntural, podemos observar que no gerenciamento de saúde pública existe uma reinvenção e reformulação de pensamentos que se adéquam ao tempo político e governamental e veladamente imputam a população negra principalmente as  mulheres negras, a posição na sociedade de ser dotadas apenas de deveres e não de direitos.

Ao longo de minha vida militante, estudiosa do racismo na saúde, vivencio relatos dos mais variados obstáculos sofridos pela população negra, especialmente as mulheres negras como usuárias e trabalhadoras. Surgem dos mais variados espaços.

  A minha capacidade de pensar, elaborar e reconstruir estratégias políticas de saúde se diferenciam das relações tradicionalmente constituídas que carregam concepções eurocêntricas e alimentam as falsetas do racismo.

REFERÊNCIAS

terça-feira, 17 de outubro de 2023

Lideranças de enfrentamento do racismo na saúde divulga nota de solidariedade ao Servidor Andrey Lemos

 Por Mônica Aguiar 

Andrey Lemos, nordestino, homem negro, gay, candomblecista e doutorando em Saúde Coletiva
A exoneração do servidor Andrey Lemos da Diretoria de Prevenção e Promoção do Ministério da Saúde causou inquietações nas organizações do movimento negro que atuam na saúde.

Durante o 1º Encontro de Mobilização para Promoção da Saúde no Brasil, 
promovido pelo Ministério da
Saúde, foram  realizadas apresentações durante os intervalos com a intenção 
de contemplar as representações
e diversidades do Brasil. 

Uma das apresentações estar sendo duramente criticada por setores que não aceitam a existência da diversidade e de manifestações culturais que não estejam dentro do seu padrão doutrinário religioso. 

Em uma atitude que julgo precipitada e desproporcional ao que se dispõem o projeto político em prol dos direitos humanos, e, se, avançarmos para uma análise de toda trajetória do período da prisão do Lula à  eleição de Bolsonaro, considerando dentro deste período o que sofreram as mulheres, a população LGBTQI+ e a população negra, predispõem a caracterizar a decisão como higienismo cultural.

Exonerar Andrey Lemos da diretoria responsável pela organização do evento para atender um pequeno setor da sociedade, com divergências extremas com Lula, não foi uma decisão politica responsável. Lula enxerga e respeita toda a diversidades e no campo cultural, religioso e humano do Brasil. 

Organizações e lideranças dos diversos campos de enfrentamento do racismo na saúde divulgaram uma nota conjunta de posicionamento em apoio ao servidor Andrey Lemos.

A NOTA

Solidariedade e Apoio ao Servidor Andrey Lemos

Nós, organizações e lideranças dos diversos campos de enfrentamento do racismo na saúde  vêm, por meio desta, manifestar apoio e solidariedade ao servidor público Andrey Lemos, nordestino, homem negro, gay, candomblecista e doutorando em Saúde Coletiva.  Militante incansável em defesa do Sistema Único de Saúde, ativista do movimento negro, movimento LGBTQIAPN+ e em defesa das religiões de matriz africana que, na última semana, foi exonerado das atribuições de diretor do Departamento de Promoção à Saúde da Secretaria Nacional de Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde (DEPROS/MS). 

Andrey Lemos vinha desempenhando um trabalho sério, comprometido, competente e responsável e responsivo Desde o início de suas atividades como gestor, ampliou os espaços de escuta e vinha se comprometendo a converter necessidades e expectativas dos diferentes grupos, em demandas para processos de trabalho dentro do departamento, entre departamentos, entre as secretarias do Ministério e outros setores de Políticas Públicas.  

Na última semana, o Departamento que dirigia o evento EM PROSA que reuniu, gestoras(es) do Ministério da Saúde, estados e município, sociedade civil, pesquisadoras(es), instituições de ensino  e pesquisa das áreas de Promoção da Saúde, Condições Crônicas Não Transmissíveis, Atividade Física, Alimentação e Nutrição, Saúde na Escola e Bolsa Família. O encontro proporcionou troca de saberes, experiências e fomentou o desenvolvimento de novas tecnologias para a promoção da saúde. 

O EM PROSA tinha o objetivo de contribuir para que gestoras(es), trabalhadoras(es), pesquisadoras(es), professoras(es), lideranças da sociedade civil,  ampliassem sua capacidade de olhar, promover saúde e prevenir doenças e agravos, “sem deixar ninguém para trás e, muito menos, fora da rede de saúde", assim como preconizava o projeto aprovado pela maioria da população brasileira nas últimas eleições para o governo federal. 

Durante o Encontro, a apresentação realizada pelo Grupo Casa de Onijá que, em 28 de junho de 2021 apresentou-se no plenário da Câmara dos Deputados,  desencadeou uma enxurrada de críticas violentas à trajetória de um respeitável funcionário público dirigente do DEPROS/MS. 

O fato (performance artística) que, por razões óbvias não estava sob a governabilidade do diretor,  gerou repercussões negativas na trajetória profissional, acadêmica e pessoal de  Andrey Lemos. Todavia, ele não foi a única vítima: nós, comprometidas(os) com as lutas sociais, os direitos humanos,  a ciência, o combate ao racismo, a promoção da equidade racial e de gênero, e outras milhares de pessoas que têm sido deixadas para trás pelas estruturas do Estado, também fomos gravemente afetadas(os). 

Reconhecemos o quão importante  e representativa era a presença de Andrey Lemos no Ministério da Saúde e a relevância do trabalho que desenvolvia. Estamos consternados pelas repercussões  que reiteram uma lógica castradora de moral sexual e perpetua a perspectiva de pânico moral seletivo. Não podemos nos furtar a associar as repercussões à representação social negativa comumente atribuída às expressões culturais mais populares, periféricas, ou negras. São interseções incontestáveis. 

Tudo isso não nos impede de reiterar a importância de monitorar, avaliar e controlar  indicadores de gestão, exigir prestação de contas, efetividade no uso de recursos públicos, economia e promoção da saúde, descentralização e democratização do acesso a recursos e insumos de promoção e prevenção, mas não com perfilamento racial. 

Seguiremos na luta com você, Andrey, para que ninguém seja sacrificado em nome da falácia da moralidade e da "bons costumes", historicamente conectada com a ética, mas que, na verdade, está ligada à lógica colonial e racista de manutenção do status quo, reiteração de estigmas e perpetuação da exclusão.  

Nossa solidariedade e gratidão pelo trabalho desenvolvido à frente da DEPROS/MS. Desejamos que tenha resiliência, muita força e saúde para seguir em defesa de um SUS sem racismo e de um país, para todos, todas e todes. Por fim, cumpre ressaltar que o posicionamento institucional punitivista não responde aos anseios de uma sociedade democrática e muito menos daquelas e daqueles que elegeram este governo. Neste sentido, como uma atitude justa e afirmativa, entre outras novas práticas e normas institucionais, recomendamos a recondução de Andrey ao cargo de diretor do Departamento de Promoção e Prevenção à Saúde. 

Abaixo assinamos, 

  • CRIOLA
  • Sociedade Ketú Àse Igbin de Ouro
  • Fórum Paulista de Saúde da População Negra
  • Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde
  • Candaces - Rede Nacional de Lésbicas e Bissexuais Negras
  • Rede Brasileira de População e Desenvolvimento (REBRAPD)
  • Rede Lai Lai Apejo - Saúde da População Negra e Aids 
  • Ação de Mulheres por Equidade - AME
  • Rede Mulheres Negras - PR
  • Instituto Aroeiras - Instituto Paranaense de Diálogos, Defesa e Comunicação para Mulheres (cis e trans) Negras Lésbicas e Bissexuais 
  • Associação Cultural de \Mulheres Negras- ACMUN
  • Ilé Àse Ti Tóbi Ìyá Àfin Òsùn Alákétu  
  • AIABA - Associação interdisciplinar Afro-Brasileira e Africana
  • Renafro - Núcleo Arapongas-PR 
  • Associação de Pescadores e Marisqueiras do Quilombo da Cambuta frutos do Mar Núcleo de extensão e pesquisa com populações e comunidades Rurais, Negras, quilombolas e Indígenas (NuRuNI), da Universidade Federal do Maranhão, 
  • Articulação das Mulheres pescadoras da Bahia
  • Grupos Gaivotas Salinas da Margarida
  • Rede das Mulheres de Terreiro de Pernambuco
  • Uiala Mukaji Sociedade das Mulheres Negras de Pernambuco
  • Grupo de Mulheres Negras Malunga
  • Articulação de Mulheres Negras Brasileira
  • Frente Nacional de Negras e Negros da Saúde Mental
  • Prevenção para Todxs
  • Comitê Brasilândia em Luta 
  • AMMA Psique e Negritude: Pesquisa, Formação, e Referências em Relações Raciais   
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