terça-feira, 20 de fevereiro de 2024

E assim vamos nós, lutando pela existência de nossas gerações.

 Por Mônica Aguiar 

Vamos que vamos! Frase muito usada por quem sonha em passar o cajado para descansar.

Com olhar cansado e triste, cabelos brancos, mãos trêmulas com rosto marcado por batalhas cotidiana em prol da vida de suas gerações, seguem as sobreviventes nesta terra que habitam algozes, que já não se escondem atrás de máscaras, o ódio e aversão às pessoas pobres e pretas.   

Entre vales, planaltos e depressões estão as denominadas favelas com suas mães “faveladas” e sua prole para sustentar.

As variações linguísticas moldam a comunicação determinando a origem e lugar que sempre será ocupado com função servil. Não importam que se esforcem, como se empenham e nem a aptidão do saber fazer.

Na proteção da prole contra as famélicas hienas não existe a menor possibilidade de demostrar astenia. Basta um piscar nos olhos, um segundo de descanso, tudo pode acontecer.

As vestes dos inculpados traduz a cultura e o grito por liberdade.  São alvos certos dos impetuosos com seu modus operandi que filtram por estereótipos de criminalidade dos falaciosos atos infracionais.

Do minuto de alegria, brotam lágrimas, suspiros e suor. Desespero, medo e dor!

O menosprezo dos impiedosos que lutam para manter o controle do mundo, abastecem as suas tetas com resquícios do racismo e de todas as formas de intolerâncias. Conspurcam a cultura do nosso povo e dão risadas como hienas no cio.

Poucas são as mulheres negras que furam esta bolha criada e mantida por esta estirpe existente. 

As curvas nas costas evidenciam a força dos açoites das desigualdades. As vestes surradas encobrem marcas das violências.

No alto do cansaço, cada hora e todos os segundos importam no monitoramento em salvaguarda das vidas.

Um pequeno suspiro para exalar o odor d’alma, o suor frio escorre no rosto marcando a desventura advinda da exaustão das lutas.

  A quem transferir este cajado, deixando de ser guardiã da vida para poder, descansar o sono eterno?


QUEM É MÔNICA AGUIAR 

Mônica Aguiar é militante há 40 anos, professora, jornalista e escritora,  coordena o Centro de Referência da Cultura Negra de Venda Nova é da Rede Nacional de Ciberativistas Negras. Criou o Blog  Mulher Negra que traz notícias do Brasil e do mundo diariamente. Educação, ciências e tecnologia, cultura, arte, cinema, literaturas, economia, política, dentre outros.  Construindo a visibilidade das mulheres negras em fatos reais no mundo.

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

Lélia Gonzalez . O legado, a frente dos tempos

 Por Mônica Aguiar 

Natural de Belo Horizonte, Lélia Gonzalez, historiadora, antropóloga e filósofa, autora de livros e diversos artigos. Neste 1° de fevereiro, completaria 87 anos.

O legado da intelectual ainda inspira artistas e ativistas negros.

Lélia é uma referência fundamental para o movimento de mulheres negras. Educadora, ativista e intelectual de destaque, seu pensamento contribuiu para a formação de uma consciência crítica em relação ao racismo que mantêm mulheres negras em desvantagem na sociedade.

Lélia Gonzalez, mudou-se com a família em 1942 para o Rio de Janeiro, acompanhando o irmão Jaime, jogador de futebol do Flamengo. No Rio de Janeiro, cidade que amava, seu primeiro emprego foi de babá. Não raro se identificava como carioca, foi torcedora incondicional do Flamengo.

Concluiu o mestrado em comunicação social e doutorou-se em antropologia política /social, em São Paulo–SP. Dedicou-se às pesquisas sobre a temática de gênero e etnia. Foi professora universitária, lecionava Cultura Brasileira na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC – Rio). Seu último cargo na instituição foi de chefa do departamento de Sociologia e Política.

Diferente do que estar sendo divulgado, Lélia por ser liderança nacional, seu nome sempre teve visibilidade, é referência.  Através do candomblé, da psicanálise e da cultura afro-brasileira assumiu sua condição de mulher e negra.

As reflexões de Lélia Gonzalez estão contidas na história de vários meios de comunicações, teses político-sociais, partidários, do movimento negro e na lutas das mulheres negras.

Ativista incansável, militou em diversas organizações, com o Instituto de Pesquisas das Culturas Negras (IPCN) e o Coletivo de Mulheres Negras N’Zinga, do qual foi uma das fundadoras. Em Salvador fez-se presente na fundação do Olodum.

Enquanto a questão negra não for assumida pela sociedade brasileira como um todo: negros, brancos e nós todos juntos refletirmos, avaliarmos, desenvolvermos uma práxis de conscientização da questão da discriminação racial neste país, vai ser muito difícil no Brasil, chegar ao ponto de efetivamente ser uma democracia racial. Lélia Gonzalez


Sua importante atuação em defesa da mulher negra rendeu a Lélia a indicação para membro do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM). Atuou no órgão de 1985 a 1989. Filiou-se ao Partido dos Trabalhadores (PT) e disputou vaga na Câmara Federal, em 1982, alcançando a primeira suplência. Foi candidata a deputada federal em 1982. Em 1986, estava no Partido Democrático Trabalhista (PDT), por onde se candidatou como deputada estadual, também conquistando a suplência.

Ajudou a construir a origem do conceito de amefricanidade.  Escreveu Festas populares no Brasil, premiado na Feira de Frankfurt, Lugar de negro, em co-autoria com Carlos Hasenbalg, duas teses de pós-graduação, além de diversos artigos para revistas científicas e obras coletivas.

Faleceu vítima de problemas cardíacos no Rio de Janeiro no dia 10 julho de 1994.

Lélia exerceu um papel fundamental na criação e ampliação do movimento negro contemporâneo. Em termos pessoais, seu grande orgulho serviu como “catalisadora” dos anseios de uma parcela da juventude negra de Salvador, Bahia, no final dos anos 70.

A partir de um ciclo de palestras que ela realizou na cidade, em maio de 1978. Este fato revela o que, para mim, foi o traço mais característico de Lélia: "a capacidade ímpar de nos instigar com a exuberância de sua fala, nos inspirar com a luminosidade de sua personalidade”. (Luiza Barros. Extraído do artigo “Lembrando Lélia Gonzalez”. In.: Livro da saúde das Mulheres Negras).

Sueli Carneiro, em uma das homenagens à Lelia Gonzales, mencionou o papel singular de Lélia, “ao introduzir em todas as dimensões da temática da mulher a questão das mulheres negras como uma condição existencial agravada, do ponto de vista das relações de gênero, pelo racismo, e que também seria determinante para a posição de classe das mulheres negras na sociedade brasileira”, contrariando o mito da democracia racial. Ideias que confrontaram o próprio movimento negro, a cujos militantes, Lélia apontava a contradição de reproduzirem as práticas sexistas da sociedade que impõe uma masculinidade agressiva, mesmo tendo uma avançada consciência em relação às questões de raça e classe. O legado da noção de pertencimento e percepção social.

O compromisso das mulheres negras com a transformação social era visto por Lélia como prioritário, pois como ‘amefricanas’, como ela dizia, sabemos bem o quanto trazemos em nós a marca da opressão econômica e da subordinação racial e sexual” Sueli Carneiro.

Digo que falar de Lélia Gonzales não pode ser apenas para preencher páginas de jornais no mes que a exaltamos.

Falar de Lélia é trazer a tona o debate sobre das desigualdades de forma qualificada, baseada nos estudos apresentado por Lélias e outras feministas e intelectuais negras como: Luiza Bairros, Suely Carneiro, Jurema Weneck, Lucia Xavier, Sônia Leite, Wania Santana, Izilda Toledo, Lêda Leal, Marta Cesária, Mônica Oliveira, Nilza Iracy, Sônia Cleide, Cláudia Luna, Cida Badu, Professora Angela Benedita, Denise Pacheco, Fátima Oliveira, Antonieta de Barros,  Theodosina Rosário,   Benedita da Silva, Jurema Batista, Olívia Santana, Mônica Aguiar, Claudete Alves, Maria do Rosário, Cristiane Almeida, Lívia Sant’anna, dentre outras que atuam incansavelmente contra o racismo.

Desejo muito que um dia pessoas brancas entendam e respeite o poder de fala e pensamento das intelectuais e ativistas negras. Que se constitua verdadeiras condições em prol de uma sociedade que não invisibilize e aproprie de nossos pensamentos, que não menospreze nossas narrativas políticas e social. Que seja de fato igualitária.

 

Ao reivindicar nossa diferença enquanto mulheres negras, enquanto amefricanas, sabemos bem o quanto trazemos em nós as marcas da exploração econômica e da subordinação racial e sexual. Por isso mesmo, trazemos conosco a marca da libertação de todos e todas. Portanto, nosso lema deve ser: organização já! Lélia Gonzalez

 

Fontes: Geledez, CRIOLA, Afrocut 

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