Cerca de três mil línguas deverão desaparecer até o fim do século segundo Rita Izsak, relatora especial da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre questões das minorias. O número corresponde à metade das línguas e dialetos falados em todo o planeta. A especialista alerta para a necessidade de esforços urgentes para evitar a extinção desses que são traços fundamentais à preservação da identidade de cada coletivo social. A informação consta do relatório apresentado por Rita ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, na Suíça. “A língua é um elemento central e expressão de identidade de cada grupo”, destacou. Ela acrescentou ainda, que a linguagem pode ser uma fonte de tensão já que defensores dos direitos linguísticos são algumas vezes associados a movimentos separatistas. De acordo com Rita, a linguagem também pode ser vista como ameaça à integridade ou unidade de um Estado que tenha promovido agressivamente uma única língua nacional como meio de reforçar a soberania, unidade nacional e integridade territorial. Além de fatores históricos, a causa do desaparecimento de muitas línguas se deve a globalização e ao crescimento do uso em massa da Internet. A especialista reforçou que a preservação de línguas minoritárias é uma obrigação dos Estados sob a ótica dos direitos humanos e que é importante utilizá-las na educação, na vida pública, na mídia, nos campos da administração pública e judicial, entre outros. Em fevereiro, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) já havia recomendado o uso de livros didáticos nas línguas locais. Línguas brasileiras – Apesar de o Português ser o idioma oficial da nação, mais de 300 línguas minoritárias são faladas em todo o país, sendo 180 pertencentes a etnias indígenas. Resultado de séculos de tráfico de escravos da África, inúmeras línguas do continente negro influenciaram fortemente o Português do Brasil que, na contemporaneidade, não tem nenhuma língua africana falada plenamente. Elas se manifestam em usos específicos como em rituais e cultos afro-brasileiros ou como dialetos de identidade quilombolas. Por exemplo, a Gira da Tabatinga é uma língua afro-brasileira de origem banto. Considerada em extinção, é falada em parte do município de Bom Despacho, no estado de Minas Gerais. O uso do dialeto se dava por uma questão de sobrevivência, pois se tratava da necessidade de comunicação entre escravos que, vindos de diferentes pontos da África, eram misturados nas senzalas. A maior falante da gira era Maria Joaquina da Silva, Dona Fiota, tida pela comunidade como a grande representante da língua, que faleceu em 2012. A gira ocorre, sobretudo, na forma oral e uma chance de sua preservação seriam registros realizados em 1998, além de alguns usos escritos do dialeto em obras como Sumidouro das Almas de Jorge Fernando dos Santos. Outras línguas de base africana que correm o risco de extinção no Brasil são a Cupópia, falada pelos povos do Cafundó, em São Paulo, e o dialeto Kalunga dos povos do Quilombo Kalunga do estado de Goiás. Com base nos critérios apresentados pela especialista da ONU, elas podem desaparecer até o fim do século, se não houver a preocupação do Estado na garantia do registro escrito e da preservação da oralidade.
Fonte : Fundação Palmares
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