Dados do IBGE indicam que a parcela de mulheres registradas como pretas ou pardas tem rendimentos menores e taxas maiores de desocupação
Apesar das comemorações de conquistas feministas no Dia Internacional de Luta da Mulher, ainda existe uma parcela da sociedade feminina que tem muito a percorrer até atingir a igualdade no desenvolvimento profissional. O estudo de Síntese de Indicadores Sociais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizado em 2012, indica que, no ano de 2001, 49,9% das mulheres brancas tinham empregos formais, contra 34% de pretas ou pardas. Em 2011, o número de brancas trabalhando subiu para 61,8% da população, enquanto as negras aumentaram para apenas 47,3%.
Para a diretora executiva do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert), Cida Bento, este quadro se explica por uma questão de estereótipo social. “As mulheres negras têm atingido os mesmos níveis escolares das brancas, mas ainda temos um problema de discriminação por conta do estereótipo, do cabelo, da pele, de um modelo de beleza padrão que deve estar associado às empresas e este modelo não é o da mulher negra”, afirma Cida.
A diretora do Ceert comenta que, dentre os nichos da sociedade que lutam para obter mais espaço e oportunidades de desenvolvimento, o grupo que corresponde a mulheres negras é o que tem encontrado mais dificuldades em obter êxito. “Recentemente, fizemos uma pesquisa com a Federação Brasileira de Bancos, a Febraban, e constatamos que cerca de 46% dos funcionários do setor eram mulheres, porém, apenas 7% das mulheres eram negras, e a maioria delas ocupava cargos de atendimento”, diz Cida. Segundo a pesquisadora, as empresas optam pela não contratação de mulheres pretas para cargos em que a imagem da organização esteja associada a elas, como direção e representações comerciais.
Um estudo do IBGE sobre os níveis de rendimento e desocupação da população, realizado em 2012, mostra que ainda existem disparidades de raça e gênero na sociedade brasileira. Em média, o trabalhador preto ou pardo ganha 56,1% do rendimento recebido por trabalhadores da cor branca. Em se tratando de gênero, a mulher recebe 73,3% do rendimento dos homens, ou seja, a mulher negra fica com a última posição na obtenção de ganhos.
É o que enfatiza a presidente do Geledés Instituto da Mulher Negra, Nilza Iraci. Para ela, as pretas ou partas vivem na base da pirâmide social, visto que recebem um quarto do salário de um homem branco. De acordo com ela, houve um recrudescimento no racismo, mas o tema ainda está presente.
“A evolução do gênero em si colabora para que a parcela da mulher negra possa lutar em busca de mais espaço. Existe um movimento de organizações para modificar este quadro de desigualdade e já podemos constatar algumas mudanças, mas muito ainda deve ser feito”, afirma a presidente do instituto. Segundo ela, os níveis de emprego para este nicho aumentaram, mas é nítido que negras ainda são maioria em cargos como empregada doméstica. Dados do IBGE revelam que o trabalho doméstico foi o que mais cresceu entre 2011 e 2012, com variação de rendimento positiva em 7,6%.
Segundo o Geledés, o nível de mulheres pretas ou pardas desocupadas é o maior entre gênero e raça, corresponde a 8,1%. As brancas vêm na sequência, com 5,7%. Quanto à redução nas taxas de desemprego, o que significa ascensão no mercado, entre os anos de 2003 e 2012, o maior índice foi apontado entre mulheres brancas, com 51,3%, que corresponde a 362 mil pessoas. Em contrapartida, as negras tiveram o pior índice de ascensão, pois reduziram 41,3% no índice de desocupação – ou seja, apenas 293 mil pretas ou pardas saíram do desemprego.
Na variação anual, entre 2011 e 2012, a situação é reversa, 40 mil negras saíram do nível de desocupação na sociedade, 8,8%, o maior índice.
Ações governamentais
A coordenadora de ciências humanas e sociais da Unesco no Brasil, Marlova Noleto, acredita que a mudança deste cenário depende de dois movimentos paralelos, o empoderamento da mulher em si e com a especificidade da mulher negra. “O governo criou secretarias diferentes para estes nichos da população porque o assunto não pode ser tratado da mesma forma”, afirma Marlova.
Segundo ela, houve um avanço na sociedade em igualdade de gênero, mas inúmeros aspectos precisam ser desenvolvidos. “O cenário da mulher mudou e para melhor. Hoje vemos negras no governo, como a própria ministra de promoção de igualdade racial, ou ocupando cargos em empresas privadas”, enfatiza a coordenadora da Unesco.
“A Unesco desenvolve muitas ações para o empoderamento de mulheres, que promovem esse recorte de gênero e raça para meninas e mulheres negras. Um exemplo é o Criança Esperança, em parceria com a Rede Globo”, diz Marlova. Para ela, as maiores dificuldades ainda são provenientes do preconceito, mas o governo tem feito um grande esforço para a implementação de políticas específicas que promovam esta parcela da sociedade.
O governo federal instaurou parcerias entre a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, gerida pela ministra Luiza Bairros, a Secretaria de Políticas para Mulheres da Presidência da República, liderada por Eleonora Menicucci, e a Secretaria de Direitos Humanos, presidida por Maria do Rosário.
Uma das ações mais recentes é a abertura do governo federal para financiamento de projetos sobre trabalho, diversidade, educação e saúde, sugeridos por órgãos da administração pública dos estados e instituições sem fins lucrativos, com foco em mulheres e um recorte para autodeclaradas pretas ou pardas. As propostas de convênio podem variar de R$ 300 mil a R$ 500 mil e ter como prazo de execução entre 18 e 24 meses. O projeto foi lançado em 1 de março e o governo receberá propostas até o dia 15 de abril.
A coordenadora da Unesco mantém uma visão otimista para o futuro. “A tendência é que a situação melhore ainda mais, em vista do que já houve. As políticas emancipatórias estão crescendo e o cenário deve estar cada vez mais favorável para este recorte da sociedade” conclui.
Fonte: DCI / CEERT
Foto: Mônica Aguiar
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