Baaghi, uma blogueira paquistanesa, teve seu documento de identidade,
certidão de casamento, os endereços em que viveu nos últimos 10 anos
vazados na internet. Tentaram assassiná-la. Serena, uma mãe divorciada
de 64 anos da Bósnia Herzegovina, teve a sua família destruída por um
falso perfil seu no Facebook. Marta, uma colombiana de 32 anos, teve seu
casamento e sua vida arruinados depois que o ex-marido espalhou fotos
suas pela internet. Che, uma queniana de 26 anos, perdeu sua vida social
depois que o marido invadiu seu Facebook e começou a pedir a seus
amigos para 'ficarem longe dela'.
Todas essas histórias reais têm em comum dois denominadores: o uso da tecnologia para práticas de violência contra a mulher.
Eles foram estudados por pesquisadores da Association for Progressive
Communications, que passaram três anos debruçados sobre o tema e
apresentaram os resultados da pesquisa "Da impunidade à injustiça" na
59ª sessão da Comissão sobre o Status da Mulher da ONU, que acontece em Nova York desde segunda-feira, 9.
Qualquer semelhança com o caso da blogueira do Brasil Post,
Ana Freitas, que foi perseguida e ameaçada após publicar um texto sobre
machismo na internet, não é coincidência. "Esse tipo de violência
acontece todo dia, e pode acontecer a qualquer mulher com acesso à
tecnologia. Temos coletado centenas de casos que refletem que a Ana
Freitas não está sozinha, mas é uma sobrevivente deste tipo de
violência", explica Flavia Fascendini, que pesquisou o tema.
No estudo, os pesquisadores chegaram à conclusão de que mulheres entre 18 e 30 anos são as mais vulneráveis na internet.
Em 40% dos casos, o agressor é conhecido da vítima. E, para quem pensa
que esse tipo de ataque é menos danoso, 11% dos casos culminaram em violência física.
"A
violência que acontece online e outros tipos de violência têm as mesmas
raízes, mas são manifestadas de maneira diferente de acordo com o meio.
Esse é um dos motivos pelos quais as autoridades ainda não compreendem
que o combate à violência relacionada à tecnologia faz parte do combate à
violência contra as mulheres, aquela mesma contemplada em leis como a
Maria da Penha", explica Flávia.
'A violência virtual é cotidiana para as mulheres'
Segundo a pesquisa, os casos mais comuns são de cyber-stalking (perseguição virtual), abuso sexual, violações de privacidade, vigilância e uso não-autorizado de informações pessoais como imagens e vídeos. Em todos os países pesquisados havia um ponto em comum: não há leis, políticas ou pessoas preparadas para lidarem com esse tipo de crime. "As mulheres atingidas não sabem como parar o abuso, que tipo de coisas podem ser denunciadas, a quem reportar e que tipo de ajuda podem receber", explicam os pesquisadores.
Segundo a pesquisa, os casos mais comuns são de cyber-stalking (perseguição virtual), abuso sexual, violações de privacidade, vigilância e uso não-autorizado de informações pessoais como imagens e vídeos. Em todos os países pesquisados havia um ponto em comum: não há leis, políticas ou pessoas preparadas para lidarem com esse tipo de crime. "As mulheres atingidas não sabem como parar o abuso, que tipo de coisas podem ser denunciadas, a quem reportar e que tipo de ajuda podem receber", explicam os pesquisadores.
Menos de um terço dos casos denunciados teve alguma resposta ou ação do provedor de serviços, como o Google ou Facebook. Só 49% dos casos são denunciados. E, destes, apenas 41% têm sido investigados.
Isso
acontece, segundo os pesquisadores, porque as autoridades ainda vêem
este tipo de violência como algo não real e, por isso, menos danoso. Mas
não é. "As mesmas formas de discriminação que moldam as estruturas
sociais, econômicas, culturais e políticas 'offline' são reproduzidas, e
muitas vezes amplificadas, em plataformas digitais diferentes",
explicam os pesquisadores.
Em 2014, o Programa de Direitos das
Mulheres da APC iniciou uma campanha chamada "O que você está fazendo
sobre a violência contra a mulher?", que tinha como objetivo alertar o
Facebook, Twitter e YouTube para inibir eventuais casos de abuso. Para
os pesquisadores, as empresas de internet deveriam se comprometer a
inibir a violência - inclusive o discurso de ódio, tão comum em páginas
do Facebook de ~humor controverso~. "É importante que quando
essas empresas mencionem liberdade de expressão, o que elas sempre
fazem, elas também reconheçam que a liberdade de expressão das mulheres é
seriamente colocada em risco por ameaças online", dizem os pesquisadores.
"O discurso de ódio não é liberdade de expressão. É um crime. As pessoas têm o direito de se expressar, e nós apoiamos esse direito, mas elas não podem inteferir no direito dos outros. Ameaças online fazem isso. A liberdade de expressão não é um direito a ameaçar, perseguir, difamar ou incitar o ódio e a violência. Qualquer pessoa preocupada com liberdade de expressão deveria absolutamente se preocupar com como a violência online limita a liberdade de expressão das mulheres."
Os casos analisados foram coletados através do projeto Take Back the Tech,
que incentiva as mulheres a denunciarem abusos sofridos online. Entre
2012 e 2014, os pesquisadores coletaram 1126 casos de violência.
Com os resultados apresentados na ONU, os pesquisadores querem sugerir uma revisão na #SectionJ,
seção sobre mulheres e mídia da Declaração de Pequim, documento sobre
equidade de gêneros assinado em 1995 e adotado por 189 países. Veja o que os pesquisadores propõem para o documento.
Fonte: Brasil Post
Nenhum comentário:
Postar um comentário