Jovens mulheres negras destacam os desafios de enfrentar o
racismo no Brasil. No Dia Internacional da Juventude, a ONU Brasil
coloca em evidência o tema ‘Juventude Negra contra o Racismo e pela Paz’
no contexto da Década Internacional de Povos Afrodescendentes, que se
iniciará em janeiro de 2015.
Duas das 15 integrantes do programa ‘Mulheres Jovens Líderes’ lançam
seus olhares sobre os desafios de ser jovem negra e negro no Brasil.
Neste Dia Internacional da Juventude, 12 de agosto, elas revelam suas
opiniões sobre as desigualdades de raça e de gênero no país. Fazem parte de 51,3 milhões de jovens, que representam 26% da população brasileira.
Com o tema ‘Juventude Negra contra o Racismo e pela Paz’, o Dia Internacional da Juventude na ONU Brasil está dedicado à expressão da juventude negra por meio de grafite e debate. A ação coloca em evidência a Década Internacional de Povos Afrodescendentes, que se estenderá de janeiro de 2015 a dezembro de 2024.
Para a jornalista Mia Lopes, de 25 anos, entre as principais
preocupações das jovens negras estão o feminicídio, a baixa ocupação nos
espaços de poder e a “ridicularização da imagem das mulheres negras”.
Diante da violência racial, Mia faz o alerta para “a morte simbólica
das jovens negras, especialmente as abusadas sexualmente. E a morte
simbólica das mulheres negras cujos filhos foram assassinados e ainda
têm de conviver com a imagem escrachada dos filhos. São mortas em vida.
Como conseguem estudar? Como conseguem trabalhar? Isso é uma forma de
feminicídio”, diz.
Ela é uma das participantes do programa ‘Mulheres Jovens Líderes’, realizado pela Secretaria Nacional da Juventude, ONU Mulheres e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
Sintonizada com as principais preocupações da juventude brasileira –
segurança/violência, emprego/profissão e saúde estão entre as três
questões com 24%, 19% e 7%, respectivamente –, Mia questiona as
oportunidades de trabalho para as jovens negras.
“Não conseguimos ainda um plano que nos possibilite outras carreiras e
sair do subemprego. Muitas jovens ainda são baianas de acarajé,
manicures, cabeleireiras e vendedoras de lanche”, afirma sobre as
realidades percebidas na Bahia e no Rio de Janeiro.
E coloca em destaque outra demanda juvenil, percebida como
oportunidade para 27% da juventude: as possibilidades de estudo. “Temos
vários programas de educação para jovens irem ao exterior, mas a
juventude negra esbarra no idioma. Eu mesma me encaixo em vários perfis
de seleção, mas a língua ainda é uma barreira”, aponta.
Outro tema positivo – a liberdade de expressão alcança 21% entre os
temas positivos para a juventude brasileira – também é questionado pela
jovem jornalista sob o prisma do racismo e do sexismo.
“Se a gente não se sente contemplada sobre a maneira como as mulheres
negras são representadas, nós fazemos outros conteúdos. Antes a gente
não se via na TV, ficávamos incomodadas e fazíamos fanzine. Agora, posso
fazer vídeo sobre bordadeiras, sobre contadoras de histórias e minha
mãe, por exemplo”. E completa: “as novas mídias são novos braços de
conteúdo. Basta ver as blogueiras negras que escrevem e apoiam umas às
outras”.
Antenada nas novas tecnologias, Mia ressalta a criação do aplicativo
Clique 180, desenvolvido pela Secretaria de Políticas para as Mulheres
da Presidência da República (SPM-PR), ONU Mulheres e Embaixada do Reino
Unido. “As novas mídias são braço de apoio e de defesa. Na Bahia, muitas
mães querem que as filhas as ensinem a gravar vídeos para documentar os
maus-tratos de maridos e as brigas. O Clique 180 é um alerta”, finaliza
Mia Lopes.
Territorialidade e ancestralidade
Quilombola do Jatimane (BA), a jovem Pedrina Belém do Rosário, 23
anos, segue na luta pela defesa das comunidades tradicionais. De acordo
com a ativista, o racismo precisa ser enfrentado como ideologia, porque
afeta identidade, saberes e capacidade de resistência.
“Sem isso o jovem não analisa e deixa que prevaleça o que o outro
fala. O racismo está presente e forma conhecimento. A juventude precisa
de oportunidades, ter novos olhares e conhecimento sobre si e o seu
povo. Se não for assim, recebe tudo como algo normal”, afirma.
Vivendo numa comunidade quilombola litorânea e incrustada no sul da
Bahia, Pedrina chama a atenção para a consciência negra. “A juventude
quilombola tem de ter informação e formação política. Vejo que muitos
não conhecem nem entendem o processo” – o que, segundo ela, fragiliza a
preservação e a luta pelas terras ancestrais.
Década de Povos Afrodescendentes
A Década Internacional de Povos Afrodescendentes foi criada pela
Assembleia Geral das Nações Unidas, em 2013, sob o lema “Pessoas
afrodescendentes: reconhecimento, justiça e desenvolvimento”. Abrange o
período de 1º de janeiro de 2015 a 31 de dezembro de 2024.
A iniciativa dá seguimento aos esforços dos Estados-membros das
Nações Unidas de enfrentar o racismo, a discriminação e o preconceito
racial e tem como objetivo dar efetividade a compromissos internacionais
contra o racismo, entre eles a Declaração e o Plano de Ação de Durban.
De acordo com a resolução de criação da Década, “os seres humanos
nascem livres e iguais em dignidade e direitos e têm o potencial de
contribuir construtivamente para o desenvolvimento e o bem-estar de suas
sociedades, e qualquer doutrina de superioridade racial é
cientificamente falsa, moralmente condenável, socialmente injusta e
perigosa e deve ser rejeitada, juntamente com teorias que tentam
determinar a existência de raças humanas distintas”.
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