Moçambique
Maputo, 17/12 - A organização Mulher e Lei na África Austral (WLSA) considerou nesta terça-feira que a proposta de revisão do Código Penal moçambicano, que está a ser discutida na Assembleia da República, discrimina "directamente as mulheres e as minorias sexuais".
Em declarações à agência Lusa, Maria José Arthur, coordenadora da organização não-governamental WLSA Moçambique, disse que a proposta de revisão do Código Penal "tem situações flagrantes de discriminação das mulheres e das minorias sexuais".
"O facto de não se considerar violação sexual se esta ocorre dentro do casamento (referindo-se às mulheres) ou de as minorias sexuais poderem ser alvo da aplicação de medidas de segurança que podem levar ao internamento ou à detenção", exemplificou a investigadora.
Referindo-se às minorias sexuais, Maria Arthur ressalvou que o novo documento, que pretende substituir a legislação colonial portuguesa de 1886, apenas altera algumas designações anteriormente utilizadas, mas mantém os princípios discriminatórios.
"Na versão do seculo XIX do código penal, estava a designação atos contranatura, que nesta versão aparece como atos contra a natureza. A nossa esperança é que as pessoas entendam que isto são crimes contra a natureza e não crimes contranatura, como de facto se quer dizer", ironizou Maria Arthur.
A nova versão do Código Penal prevê a criminalização de atos de adultério, desde que provados por flagrante delito ou por comunicações escritas, excluindo-se desta forma de crime as uniões poligâmicas, um artigo que a ativista considera ser "de controlo das mulheres" e uma forma do "Estado moralizar a sociedade".
"Esse artigo já estava no Código Penal do século XIX e foi eliminado por um decreto, que agora é recuperado. É daquelas normas que caem no âmbito da discriminação direta. A lei tem uma aparente neutralidade, porque diz os cônjuges, mas, dada a estrutura de poder na sociedade, isto será só aplicado contra as mulheres", considerou Maria Arthur.
"A pergunta que se coloca é porque é que o Estado tem que legislar naquilo que é o comportamento íntimo das pessoas, que não configura crime. O que temos agora na lei é que o adultério pode ser invocado como motivo para divórcio. O Estado não tem que misturar lei e moral", acrescentou a investigadora.
Relativamente ao crime de violação de menores, a ativista referiu que o novo Código Penal mantém o princípio da ilibação do violador se este aceitar casar com a vítima, nos casos que se referem à violação de jovens com idade igual ou superior a 12 anos.
Arthur destacou pela negativa o artigo 223.º, que permite ao juiz autorizar o casamento entre o violador e a criança - casos que acontecem geralmente entre homens e crianças do sexo feminino -, ainda que os encarregados de educação se oponham.
"Se nestas condições (casamento violador/vítima) a licença de casamento for negada por quem de direito, portanto, o pai ou mãe dizerem que não dão autorização para o violador se casar com a vítima, pertence ao juiz da causa o suprimento dessa licença, ou seja, o juiz pode sobrepor-se aos responsáveis e autorizar o casamento", destacou.
A proposta de revisão do Código Penal de Moçambique foi elaborada pela Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos Humanos e Legalidade, e é discutida na Assembleia da Republica na quarta-feira
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