A escrita da mulher negra, enquanto construção social da diferença, tramada às margens do cânone literário no Brasil, é “construtora de pontes” entre o passado e o presente, pois tem “traduzido, atualizado e transmutado uma produção cultural, o saber e a experiência de mulheres através das gerações”, segundo observa Heloísa Toller Gomes (2004, p.13), em Visíveis e invisíveis grades: vozes de mulheres na escrita afrodescendente contemporânea.
"Miriam Alves, ao longo de vinte e quatro narrativas, recupera histórias e memórias unidas pelos fios de contas que compõem a nossa ancestralidade. A autora consolida em Bará na trilha do vento o assenhoramento do poder da palavra tomada pelas escritoras negras brasileiras como principal instrumento de reivindicação na luta pelo direito a voz, em especial no combate contra as desigualdades históricas que têm sido geradas pelo racismo e pelo sexismo.
Miriam Alves constrói essa ponte mencionada por Gomes, pois pertence a uma linhagem de escritoras formada por mulheres negras que, driblando imposições e modos de silenciamentos, em seus respectivos contextos, buscaram rotas alternativas para uso da palavra, conseguindo expressar uma visão de mundo distanciada daquela difundida pelas narrativas tradicionais. Nesse coro dissonante, as vozes em seu tempo, em prosa e em verso, constituem-se das seguintes trajetórias: Maria Firmina dos Reis (1825-1917), com o primeiro romance abolicionista, Úrsula (1859); Auta de Souza (1876-1901), Antonieta de Barros (1901-1952); Laura Santos (1921); Maria Helena Vargas da Silveira (1940-2009); Carolina Maria de Jesus (1914-1977), entre outras.
-Cristian Souza de Sales
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