Com o objetivo de fortalecer o protagonismo de mulheres negras e de
setores populares das regiões Norte e Nordeste, a CESE – Coordenadoria
Ecumênica de Serviço e a organização pernambucana SOS Corpo – Instituto
Feminista para a Democracia lançaram ultimo dia 13 de abril, o
Projeto Mulheres Negras e Populares: Traçando Caminhos, Construindo
Direitos, que conta com apoio da União Europeia. O evento, que
aconteceu no auditório da CESE , para dar início ao desenvolvimento do projeto com duração de três
anos e envolverá ações de formação, comunicação e apoio a iniciativas
propostas por organizações e redes de mulheres.
Além do lançamento, um seminário foi organizado que contou com a presença de nove estados
do Nordeste e de três estados do Norte (Amapá, Pará e Tocantins), para
analisar coletivamente os desafios e possibilidades de atuação e
articulação dos movimentos de mulheres nestas regiões.
De acordo com Rosana Fernandes, assessora de projetos e formação da
CESE, a iniciativa pretende “fortalecer a participação das mulheres
negras e de setores populares nos espaços institucionais de controle
social, as conferências e conselhos, e a participação no debate público
sobre as políticas de combate às desigualdades, raciais e de gênero”.
Participação política de Mulheres – Apesar dos
avanços obtidos no combate à miséria e à extrema pobreza no Brasil nos
últimos anos, é notável a persistência das desigualdades no país, em
especial as desigualdades de gênero e raça e as desigualdades regionais.
Esse quadro levou a CESE e o SOS Corpo a proporem este projeto dirigido
às mulheres negras e populares do Norte e Nordeste do país. De acordo
com as organizações proponentes, o conjunto de ações a serem
desenvolvidas buscará fortalecer a participação social e política de
mulheres negras e de mulheres de setores populares em espaços e momentos
estratégicos do debate público e nos canais de participação social
ligados às políticas governamentais. Estes segmentos enfrentam
dificuldades para garantir participação efetiva, devido às fragilidades
institucionais das organizações de mulheres negras e das organizações de
mulheres de setores populares, que por sua vez, estão ligadas ao
racismo e sexismo estruturantes de nossa formação social.
“Há uma invisibilidade da agenda política das mulheres negras e das
mulheres de setores populares na sociedade. Elas não são reconhecidas
como sujeito político pelos poderes públicos, pela mídia e até por
outras organizações da sociedade civil”, acrescenta a assessora.
Estudo sobre pobreza e desigualdade, produzido pelo SOS Corpo em
2012, aponta que “entre as transformações verificadas nas últimas
décadas na situação das mulheres brasileiras, destacam-se a ampliação de
sua escolarização e participação no mercado de trabalho, a queda da
taxa de fecundidade e transformações nos arranjos familiares.
Entretanto, elas são, ainda, a maioria da população desocupada, com
menores ou sem qualquer tipo de rendimento e, portanto, em situação de
pobreza. A pobreza, no caso das mulheres, tem uma face moldada pela
desigualdade de gênero, de classe e de raça. Vale ressaltar, ainda, que o
Brasil é marcado por contrastes, como as profundas desigualdades
regionais e entre as realidades do campo e da cidade. É entre mudanças e
permanências, velhas e novas contradições, que incidem as políticas de
enfrentamento à pobreza”.
Dados sobre a participação política de mulheres – De
acordo com os dados do Censo Demográfico de 2010 (IBGE), das 190,8
milhões de pessoas residentes no Brasil, 96,8 milhões se autodeclaravam
pretos e pardos, somando 50,7% da população. Já as mulheres, representam
51,5% da população. Ainda de acordo com o Censo 2010, 70,8% das pessoas
em extrema pobreza são negras (de cor parda ou preta), ou seja,
apresentam renda de até R$ 70,00 mensais. As mulheres também são a
maioria em situação de extrema pobreza, representando 50,5% do total –
8,2 milhões de mulheres em todo o Brasil. Observa-se que as mulheres
negras ainda se encontram na base da hierarquia socioeconômica, ocupando
os piores postos de trabalho, em áreas marcadas pela informalidade, a
exemplo dos serviços domésticos, atividade com maior predominância
feminina (92,7%), em que apenas 33,8% das trabalhadoras possuem carteira
assinada.
Segundo dados do Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça (2011),
as mulheres negras em geral têm renda média equivalente a 30,5% do
rendimento dos homens brancos. As desigualdades regionais também
continuam acentuadas, o que pode ser verificado pela diferença entre os
rendimentos médios mensais, que colocam o Centro-Oeste e o Sudeste à
frente, com valores mais elevados e próximos (R$ 1.422,00 e R$1.396,00,
respectivamente), o Sul, na posição intermediária (R$ 1. 282,00),
seguido, em ordem decrescente, pelas regiões Norte e Nordeste, com,
respectivamente, R$ 957,00 e R$ 806,00.
De acordo com o Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil 2013, a
região Nordeste ainda tem a maioria de seus municípios no grupo de baixo
Índice de Desenvolvimento Humano (61,3%, ou 1.099 municípios), enquanto
no Norte eles somam 40,1% (180 municípios) nesta categoria. Esses dados
se refletem na vida das mulheres negras e de mulheres de setores
populares, que ficam vulneráveis a diversas situações de violência e
violação de direitos humanos, incluindo a violência doméstica,
exploração sexual, o turismo sexual e o tráfico de seres humanos.
As disparidades de gênero e raça também podem ser verificadas no
campo da participação política. De acordo com dados da ONU, divulgados
no relatório Progresso das Mulheres do Mundo 2008-2009, entre os países
da América do Sul, o Brasil é o penúltimo colocado no ranking que mede a
participação feminina nas câmaras federais, com um índice de apenas 9%
de mulheres parlamentares. A sub-representação da população negra nos
espaços de poder também é um grave obstáculo ao avanço da democracia e
do desenvolvimento do país. Segundo o Censo de 2010, os negros e pardos
representam menos de 10% do total de deputados federais. Dos 513
deputados federais, somente 43 se reconhecem como negros. Dos 81
senadores, apenas dois são negros ou pardos. Esse problema também pode
ser observado em outros espaços de poder, ou seja, apesar de mulheres
negras e de mulheres de setores populares serem maioria nos movimentos
sociais e desempenharem um papel fundamental no trabalho comunitário,
elas são sub-representadas nos espaços de decisão, principalmente
aqueles que vão além da esfera local.
Fonte: Portal Africas
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