Relatório aponta que persistem diferenças entre homens e
mulheres na América Latina e para entender o fenômeno é preciso analisar o
histórico dessas mulheres. No Brasil, o perfil mais comum é de jovens negras de
periferia, evidenciando uma inter-relação entre gênero, raça e classe.
No mercado de trabalho em países da América Latina e do
Caribe, a diferença entre homens e mulheres persiste e, em alguns casos,
aumentou nos últimos anos. Esta é uma das conclusões do relatório Panorama Social de América Latina 2018,
elaborado pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) e
divulgado nesta semana.
Segundo o levantamento, em 2016 a taxa de desemprego urbano
era de 10,4% entre mulheres e de 7,6% entre homens. No mesmo ano, 48,7% das
mulheres recebiam remunerações abaixo do salário mínimo, índice que cai para
36,7% entre os homens. Na distribuição por faixa etária, a diferença se mantém,
alcançando o máximo nas trabalhadoras com idade entre 45 e 64 anos, parcela
onde a diferença chegou a 16 pontos.
No mesmo ano, em média, 26,9% das mulheres ocupadas estavam
em situação classificada pelo estudo como “subemprego” (em razão dos valores
abaixo da linha da pobreza e com jornadas extensas), contra 19% dos homens na
mesma condição. A média geral foi de 21,5%. Na evolução histórica desde 2002,
os índices caíram para os dois gêneros, embora em ritmo maior no caso dos
homens, “razão pela qual aumentou a brecha de gênero”, destaca o documento.
Considerando os trabalhadores que contribuem para a
Previdência, houve uma inversão entre 2002 e 2016. Enquanto na primeira data a
média dessa condição era maior entre mulheres (37,7%) do que entre homens
(36,4%), na segunda essa prevalência mudou com índice maior no público
masculino (46,5%) do que no feminino (45,5%).
MULHERES JOVENS
A
maior diferença de gênero no mercado de trabalho identificada pela pesquisa da
Cepal está entre as mulheres jovens .
“Enfatizamos o tema da juventude, porque é a porção etária
que está enfrentando as maiores dificuldades de inserção laboral e, sobretudo,
as mulheres”, afirmou a secretária executiva da Cepal, Alicia Bárcena.
As jovens que não estudavam nem trabalhavam em 2016
correspondiam a 31,2% nos países pesquisados da região. Já quando a análise se
voltou aos homens jovens, esse índice caiu quase três vezes, ficando em 11,5%.
Embora nos últimos 15 anos a queda nas taxas dessa condição tenha sido maior
entre as mulheres, a diferença continua representativa.
Entre os fatores para esse quadro, a Cepal citou a ausência
de políticas e sistemas de cuidado, a manutenção da divisão sexual do trabalho
nas famílias, a gravidez na adolescência e a alta carga de trabalho doméstico e
de cuidado, ambos não remunerados.
“Em particular a distribuição desigual do trabalho não
remunerado e de cuidado entre homens e mulheres, o não reconhecimento de seu
valor econômico e das barreiras que isso impõe a uma plena integração das
mulheres ao mercado de trabalho e, portanto, à obtenção de autonomia econômica,
reproduzem as desigualdades de gênero ao largo do ciclo de vida”, analisam os
autores do relatório.
Causas e impactos nas vida das jovens negras
Segundo a oficial de Gênero e Raça do Escritório do Programa
das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) no Brasil e pesquisadora em
gênero, Ismália Afonso, para entender o fenômeno é preciso analisar o histórico
das mulheres. No Brasil, o perfil mais comum
é de jovens negras de periferia, evidenciando uma inter-relação entre gênero,
raça e classe.
Outro elemento que contribui, acrescenta Ismália, é a
sobrecarga de trabalho doméstico. E aí não somente dos filhos, mas também de
familiares e dos próprios companheiros ou companheiras. Assim, a explicação que
busca sugerir como causa central da saída da escola e da dificuldade de
empregabilidade a gravidez da adolescência deveria ser observada com mais
cuidado. Muitas vezes, a jovem já deixou a educação formal antes, ou vivencia o
casamento ou a gestação como formas de socialização em condutas mais próximas
do mundo adulto.
Além de ver o fenômeno em suas múltiplas causas, a oficial do
Pnud defende que esse cenário deve merecer resposta do Poder Público porque
afeta não somente o presente com o futuro dessas jovens. “Sem contribuição
previdenciária, já que não trabalham, há uma série de direitos que não serão
garantidos a elas (licenças, aposentadoria). Dessa maneira, é possível esperar
que avancem para a idade adulta e a velhice ainda mais empobrecidas”, completa.
Foto: Geledés internet
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