domingo, 15 de outubro de 2017

Sub-representação dos negros na política brasileira

Em setembro, foi publicada uma matéria com reprodução em diversos sites e blogs, sobre a sub-representação dos negros na política brasileira.  Esta pesquisa , neste processo de votação da  reforma política, da a dimensão das dificuldades enfrentadas pelos negros brasileiros que disputarão  uma cadeira  em 2018. Antes de chegarmos a esta bela pesquisa, relembremos seguintes dados:  

- O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), nas eleições de 2014, 55% dos 25,3 mil candidatos eram brancos, 34,9% pardos e 9,2% negros.
- Dos 1,6 mil eleitos, 75,6% são brancos, 21% pardos e apenas 3,1% negros. 
- No Congresso Nacional, dos 594 parlamentares, menos de 10% são negros. 
- Na maioria das casas legislativas, são menos de 6% de negros deputados e deputadas . 

Em 2010 a SEPPIR -Ministério de  Promoção da igualdade racial, extinto neste governo de  Temer,   trouxe um estudo sobre a participação das mulheres negras nos espaços de poder . O estudo traça um mapa da presença das mulheres negras, a partir do perfil das candidaturas femininas a postos no Senado Federal, na Câmara dos Deputados e no Poder Executivo nas eleições. Discute, ainda, aspectos da reforma política e sugere ações afirmativas que contribuam de maneira efetiva para a inclusão das mulheres negras nas instâncias e esferas de poder e de decisão política. 

http://www.seppir.gov.br/central-de-conteudos/publicacoes/pub-acoes-afirmativas/a-participacao-das-mulheres-negras-nos-espacos-de-poder

Em 2015, o portal Geledés publicou uma matéria de por Francielle Costacurta com a chamada  " Quem são as mulheres negras na Politica? " 
Eu Monica Aguiar, aqui no meu blog Mulher Negra,  tenho publicado várias matérias sobre a participação das mulheres,  em especial das  mulheres negras na política . 

Sendo,  vejamos o pesquisador Osmar Teixeira Gaspar. Boa leitura !

Para especialista, baixo número de deputados e senadores negros no Brasil só será revertido se houver pressão da sociedade. “A elite branca não nos quer no Parlamento”, diz o senador negro Paulo Paim.

Mais da metade da população brasileira (54%) é composta de cidadãos que se autodeclaram negros – grupo que, segundo o IBGE, reúne pretos e pardos. Mas isso não se reflete na representação política. No estado de São Paulo, por exemplo, dos atuais 94 parlamentares da Assembleia Legislativa, somente quatro são negros, ou seja, o equivalente a 4,2% dos eleitos.

“A ausência de negros no Parlamento representa um contrassenso, em que a minoria passa a resolver os problemas da maioria”, afirma O pesquisador Osmar Teixeira Gaspar realizador do estudo na Faculdade de Direito (FD) da USP, em que buscou entender mais a fundo as causas desse porcentual tão baixo, especialmente dos negros, nas casas legislativas. Os resultados estão em sua tese de doutorado Direitos Políticos e Representatividade da população negra, realizada sob orientação do professor Kabengele Munanga, do Departamento de Antropologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP .

O estudo de Teixeira concentrou-se no estado de São Paulo, mas, segundo ele, evidências apontam que a dificuldade de negros serem eleitos é um fenômeno nacional. Ele ouviu candidatos negros vitoriosos e derrotados, eleitores negros e dirigentes de partidos.
Paulo Paim (PT) é hoje o único senador negro do país eleito pelo voto direto. “Até hoje foram eleitos apenas eu e a Benedita da Silva [para o Senado]. Na Câmara, dos 513, no máximo duas dúzias são negros. A representação negra é mínima”, afirma o senador. “A elite branca não quer negros no Parlamento.”

Há um volume significativo de candidatos negros, mas eles quase sempre têm formação escolar incompleta, e, portanto, pouca ou nenhuma estrutura financeira, então, quase nunca conseguem votos suficientes para se eleger, aponta Teixeira.

“No entanto, o trabalho realizado por esses candidatos pobres e negros, sem estrutura financeira e material, e sem o apoio explícito dos partidos políticos, faz com que eles funcionem como verdadeiros cabos eleitorais de outros candidatos brancos e mais ricos”, diz Teixeira.

Segundo o pesquisador, enquanto candidatos brancos e ricos contam com estrutura material e apoio financeiro e econômico do partido ou externa, o que lhes permite um deslocamento mais eficaz e rápido durante a campanha, os candidatos negros e pobres “têm severa dificuldade”.

Outra constatação importante da pesquisa é a disparidade patrimonial de candidatos brancos e negros. Em média, os brancos que disputam eleições estaduais têm patrimônio de R$ 1 milhão. No caso dos negros, com as mesmas condições de escolaridade, a média patrimonial é de R$ 233 mil.

Segundo Teixeira, praticamente todos os negros que chegaram ao Parlamento só tiveram êxito graças à fórmula do coeficiente eleitoral. “Ao final, os votos desses candidatos negros e pobres serão somados à legenda partidária que irá dividi-los e poderá somar um maior número de eleitos. Portanto, o trabalho destes candidatos negros, que acabam sendo numerosos, se dilui. Eles não têm mobilidade para sair de suas bases.”

Histórico dos negros na política
A tese de Teixeira traz uma abordagem histórica dos negros no Brasil pós-abolição da escravatura. O estudo menciona, por exemplo, a decisão de Getúlio Vargas de extinguir, em 1937, a Frente Negra Brasileira como partido político.
Outros partidos extintos na mesma época “se refundaram com outros nomes ou se fundiram em outras siglas”, permitindo que “o grupo oligárquico e politicamente dominante permanecesse ativo”, aponta Teixeira. Apenas os negros não conseguiram encontrar outra maneira de organização política.

Outro aspecto histórico citado foi um documento elaborado pelo governo do estado de São Paulo em 1982, que alertava para o aumento significativo da população negra e sugeria a esterilização massiva de mulheres pretas e pardas sob a alegação de que os brancos já estavam conscientes “da necessidade de se controlar a natalidade”.

O documento, escrito pelo economista Benedito Pio da Silva, do grupo de assessores do ex-governador do estado e ex-prefeito da cidade de São Paulo Paulo Salim Maluf, falava claramente sobre os riscos de predominância de eleitores negros no Brasil. Curiosamente, Pio da Silva era negro.

Cotas como solução?
Para Teixeira, cotas para negros seriam a única maneira de desmascarar a utopia de uma democracia racial no Brasil. “Para se resolver a questão da ausência do negro no Legislativo brasileiro será preciso que se adotem cotas efetivas [de representação]. Cotas de 20% seriam razoáveis”, defende o cientista social.

Lula Guimarães – especialista em marketing político-eleitoral que fez a campanha presidencial de Marina Silva (Rede) em 2014 e de João Doria (PSDB) para prefeito de São Paulo em 2016 – reconhece a importância do sistema de cotas para negros, como o existente em universidades, para corrigir distorções sociais históricas. No entanto, ele questiona se o sistema seria eficaz também na política.

“Obama não foi eleito com o sistema de cotas nos EUA. Na política, creio que as cotas tanto para mulheres como para negros não causariam muito equilíbrio”, afirma.

Ele considera que o desafio principal é a conscientização da sociedade. “A gente deve lutar para que o Brasil tenha políticos mais qualificados e que possam nos representar de maneira mais eficaz porque têm uma formação melhor ou porque representam melhor determinados segmentos da sociedade no sentido profissional, ideológico, e não necessariamente no sentido racial”, diz.

O senador Paim, por sua vez, concorda com a tese de Teixeira. O senador, no entanto, não abraça a causa das cotas com ilusão. Ele destaca que havia no Estatuto da Igualdade Racial um artigo que previa cotas para negros na política, mas que “não teve jeito de passar”. “Tivemos que tirar esse artigo, ou o Estatuto não seria votado. ”

Apesar de defender as cotas para negros no Legislativo, Teixeira não tem nenhuma expectativa de que algum parlamentar apresente um projeto de lei propondo tal medida. Para ele, a ideia só vai prosperar se houver pressão da sociedade.

“É este mecanismo de representação parlamentar que a rigor tem permitido aos estratos mais abastados de nossa sociedade preservarem amplamente os seus seculares privilégios”, afirma. “O aumento dos parlamentares negros no Legislativo pressupõe uma redução de parlamentares brancos naquele mesmo espaço.”


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