terça-feira, 14 de abril de 2020

Faleceu a Coreógrafa, Pioneira da Dança Afro e Militante do Movimento Negro Marlene Silva

Marlene Silva  (1) 

 Por Mônica Aguiar 

O universo da dança está de luto. Partiu Marlene Silva, com 83 anos, nesta segunda(13), ícone da cultura negra em Minas Gerais conhecida em todo o Brasil. 

Marlene Silva é coreógrafa, dançarina, pioneira da Dança Afro, militante do movimento negro, pesquisadora e professora de teoria musical. 

Com mais de quatro década de trabalho, seu legado mante-se vivo,  através das tradições repassadas com muita dedicação para todos alunos. Sua militância contra o racismo fez que criasse um coletivo com bailarinos negros para dançar e fazer a ponte entre a periferia e o centro da Capital Mineira.

Marlene nasceu em Belo Horizonte, atualmente morava no Rio.  Sua trajetória de resistência na dança começou no balé clássico, ainda na infância.

“Eu era a única aluna negra da classe. Durante seis meses, a professora me ignorou completamente. Minha mãe foi perguntar se tinha algum problema comigo, e a professora disse que eu tinha o bumbum muito empinado e ele não caberia dentro do tule. Minha mãe me tirou do balé na hora”, disse, ao jornalista Gustavo Rocha. (Entrevista ao Magazine, em junho de 2018).

Aos 21 anos, assistiu pela primeira vez uma apresentação de dança afro-brasileira com Mercedes Baptista pioneira no Brasil. Neste momento Marlene apaixonou pela Dança Afro.

“Eu sempre fui muito boa de história e quis estudar nosso folclore; quem dera todos tivessem a oportunidade de estudar o folclore brasileiro. No Rio de Janeiro, tinha orquestras em todos os teatros públicos e também as companhias de dança. Na primeira vez que eu vi o balé de Mercedes Baptista, pensei comigo: é isso que quero", comentou, na já citada matéria.

Marlene Silva participou do  filme “Xica da Silva” (1976), de Cacá Diegues e foi convidada a trabalhar os ritmos e a coreografia presentes em uma das cenas do filme, protagonizado por Zezé Motta e Walmor Chagas. 
Por conta do trabalho, se deslocou para Diamantina, onde conheceu Dulce Beltrão, que tinha uma Escola de Dança na capital mineira, foi quando Marlene resolveu abrir a sua academia, dedicada à dança afro na cidade. 

O espaço foi o celeiro de vários espetáculos, como “Raízes da Nossa Terra".

Marlene como toda mulher negra sofreu com racismo.
E por ter como bandeira e valores a defesa do povo negro era discriminada, mas mantinha sua força em prol da liberdade através dos belos movimentos em centenas de apresentações.  
Foto homenagem Câmara Municipal (2) 

Marlene Silva teve vários momentos e reconhecimentos históricos por parte de setores expressivos da sociedade. 

Em 2018, foi a homenageada da mostra Benjamin de Oliveira. 

Recebeu o título do de Cidadã Honorária de Belo Horizonte, ofertado pelo Vereador Paulão, primeiro Vereador negro em Belo Horizonte ...

Desenvolveu diversas coreografias e espetáculos, vistos por milhares de pessoas. 

O primeiro deles, “Raízes da Nossa Terra”, estreou, inclusive, no Teatro Francisco Nunes, mesmo palco onde Marlene foi homenageada.

Marlene Silva participou de programas como o "Fantástico", da emissora de televisão Globo. 
Apresentou em centros como o Wellesley College, Sulffolk University, The Boston Globe e The Boston Phoenix (EUA); e, ainda, esteve no palco em um espetáculo de Milton Nascimento.

Colegas de profissão e amigos de Marlene Silva falaram sobre a trajetória pioneira da artista. 

"É uma perda imensurável para a dança, e não só a de matriz africana", comentou o coreógrafo e dançarino Evandro Passos, um de seus discípulos.
Em sua dissertação, Evandro dedicou um capítulo a Marlene Silva, no qual, em um trecho, Marlena fala sobre a resistência e preconceito na cidade. "Fui eu quem iniciou essa modalidade de Dança Afro para palco em Belo Horizonte e consegui ter um nome por aqui. Mas não foi fácil, tive que levar a Dança Afro para as ruas da cidade também. Apresentei na praça da rodoviária, praça da Liberdade e outras da cidade, antes de ganhar as academias. Chamavam-nos de macumbeiros e outros apelidos pejorativos, jogavam pedra e tudo mais", relatou.

 O percussionista Marcinho Martins, que acompanhou Marlene por mais de 30 anos, foi outro a se emocionar. "Olha, é muito difícil descrever Marlene Silva num momento desses. Eu não diria quem "foi" Marlene (usando o passado), porque Marlene continua aqui. E sempre será eternizada no meu trabalho. Foi mãe, amiga, companheira. E eu tive o prazer de ter trabalhado com ela ao longo de 35 anos. Iniciei com ela aos 12 anos de idade. Vivemos juntos muitas vitórias - e muitas barra-pesadas também. Mas ao final tudo era festa e felicidade, pois preocupávamos mais com o trabalho que com o lado financeiro. Então, para mim, ela não nos deixou. É uma estrela que vai ficar no céu, trabalhando junto com a gente".

O multi-instrumentista, cantor e compositor Sérgio Pererê conta que nos anos 1980, sempre que se falava sobre dança afro, Marlene era a "referência”. O músico dirigiu homenagens feitas a Marlene na edição 2018 da Mostra Benjamin de Oliveira, realizada no Teatro Francisco Nunes. 
“Todas as pessoas ligadas à música afro ou de herança africana têm algum laço direto ou indireto com a Marlene”, comenta ele.   “Devemos celebrar o fato de que tivemos a maravilha de ter alguém tão especial entre nós.”
   
Fonte da entrevistas:  (Marcinho, Evandro Passos o TEMPO) ( Sérgio Pererê Estado de Minas)
Fotos: (1) Pablo Bernardo e (2) arquivo de Mônica Aguiar 

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