Decisão do Iphan sobre a roça
de coivara foi anunciada ontem
Modo de vida das comunidades quilombolas está ameaçado devido à demora no processo de autorização, por parte do governo de São Paulo, para o plantio das roças tradicionais
O sistema agrícola tradicional
das comunidades quilombolas do Vale do Ribeira, no sudeste paulista, foi
reconhecido ontem (20) como Patrimônio Cultural do Brasil pelo Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Os quilombolas desenvolveram
há mais de 300 anos um cultivo de alimentos na Mata Atlântica que não usa adubo
nem agrotóxico, chamada roça de coivara.
Dados do ISA mostram que o Vale
do Ribeira abriga, ao todo, 88 comunidades quilombolas em variados graus de
reconhecimento pelo estado.
Dos 7% que restaram do bioma de Mata Atlântica em
território nacional, 21% estão localizados no Vale do Ribeira.
Burocracia e falta de conhecimento
No entanto, o modo de vida das
comunidades quilombolas está ameaçado devido à demora no processo de
autorização, por parte do governo de São Paulo, para o plantio das roças
tradicionais, reclamam as representações dos quilombos e entidades que defendem
o direito de comunidades tradicionais.
Eles precisam de autorização para o
corte de pequena área de vegetação nativa de Mata Atlântica para fazer a roça.
Segundo o instituto, os
documentos apresentados ao Iphan servem de subsídios para dar segurança aos
órgãos governamentais em relação à autorização para o plantio da roça.
Ivy Ivy Wies, assessora técnica do Instituto
Socioambiental (ISA), uma das entidades que apoiam os quilombolas. destacou que o atraso na emissão da licença pelo governo estadual tem consequências
graves às comunidades tradicionais.
“Dois pontos que estão
ameaçados pela falta de licença: a segurança alimentar e a manutenção das
variedades agrícolas, que são um patrimônio da humanidade - as variedades de
milho, batata, cará, arroz, feijão, mandioca. Hoje em dia, estamos nesse
processo da transgenia, dos organismos geneticamente modificados. Imagina você
ter 15 variedades de milho diferentes [que não foram geneticamente
modificados], isso é uma riqueza para a humanidade”, disse.
A maior parte da produção serve
para a subsistência das comunidades, mas há também impacto na renda já que os
quilombolas vendem parte dos produtos da roça para custear suas necessidades
básicas. Ivy destaca que há comunidades esperando há dois anos por uma licença.
As comunidades apresentam o
pedido de autorização de 12 a 15 meses antes do início do preparo da roça para
garantir que o Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp) faça os
laudos baseados em vistorias e que a Companhia Ambiental do Estado (Cetesb)
possa emitir a licença a tempo do plantio.
Em 2013, foi o último ano em que as
licenças saíram a tempo do plantio, informou o ISA, afirmando que a estrutura
que o estado colocou para realizar o processo não dá conta da demanda.
“O estado alega falta de
pessoal para os trabalhos de campo. Mas a avaliação mais certeira é que há um
excesso de exigências para o processo e as várias etapas são morosas demais, o
que gera um volume de papel e burocracias desnecessárias”, segundo texto da
Campanha “Tá na Hora da Roça”, lançada no mês passado pelas comunidades
quilombolas e entidades parceiras, chamando a atenção do governo estadual para
que autorize, com a emissão de licenças no tempo adequado, a abertura das
roças.
Das 19 comunidades localizadas
em cinco municípios do Vale do Ribeira que pediram autorização para início da
roça, apenas duas conseguiram: São Pedro e André Lopes. De acordo com
representantes das comunidades, o atraso na licença faz com que o agricultor
perca o ciclo do plantio.
Ciclo da roça
O ciclo quilombola começa a
partir dos meses de junho e julho, com o preparo da área e derrubada da
vegetação, que geralmente não passa de um hectare. Depois de 15 dias, é feita a
queima controlada da área e as cinzas fertilizam o solo. Depois disso, já feito
o plantio, que geralmente começa em agosto e setembro. Até o momento, no
entanto, o governo estadual não deu a autorização para o início da derrubada.
O manejo dessa área aberta na
floresta ocorre no período de dois a três anos, ou até que aquele solo não esteja
mais tão fértil. Depois disso, o produtor abandona esse trecho e a floresta se
regenera.
Outro lado
A Cetesb disse, em nota, que
“para atender às comunidades é feito todo um trabalho envolvendo o Itesp, a
Fundação Florestal e a Cetesb. E a produção dessa documentação pode tomar
bastante tempo. Assim, é fundamental o planejamento no pedido dessas autorizações”.
A companhia disse que está sendo feito um trabalho conjunto para aprimorar os
procedimentos.
Campanha pede respeito ao plantio tradicional quilombola
Dona Diva, do quilombo Pedro Cubas de Cima Agê Barros - ISA |
As comunidades quilombolas do
Vale do Ribeira, no sudeste do estado de São Paulo, lançaram dia 17/8, a campanha "Tá Na Hora
da Roça", em defesa de suas roças tradicionais, ameaçadas pela
burocracia e falta de conhecimento dos órgãos ambientais de SP.
A campanha pediu ao governo de São Paulo que autorize, com a emissão de licenças no tempo
adequado, a abertura das roças de coivara nos quilombos, garantindo segurança
alimentar, autonomia e fortalecimento cultural para as comunidades.
Há anos, essas comunidades
enfrentam sérios obstáculos junto à burocracia de órgãos estaduais, como a
Secretaria de Meio Ambiente, Itesp, Fundação Florestal e Companhia Ambiental do
Estado de São Paulo (Cetesb), para conseguir as licenças que liberam o corte de
vegetação, procedimento necessário para o plantio de alimentos voltados à
subsistência.
Foto: Foto Instituto Sócio Ambiental /EBC
Fontes :Agência Brasil /Instituto Sócio Ambiental /CONAQ
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