sábado, 30 de maio de 2020

Mortalidade Materna . Um olhar da Mulher Negra!

Por Mônica Aguiar 
A maioria das mulheres que são acometidas pela morte materna são as mulheres negras. 
As estatísticas revelam um fosso que separa as mulheres pretas e pardas das brancas, independentemente da classe social. 

Estão também mais propensas a doenças previníveis, é notório que no Brasil, as doenças hipertensivas constituem a principal causa de morte materna, responsáveis por um terço dessas mortes. 

Em 2018, mais da metade (54,1%) das mortes maternas no Brasil ocorrem entre as mulheres negras de 15 a 29 anos.

Entre centenas de relatos que nos chegam no Centro de Referência da Cultura Negra de Venda Nova, quando uma família tem uma vítima de mortalidade materna, relatam, fatos ocorridos, antes e pós parto, revelando a desigualdade racial no âmbito da saúde pública desde a atenção básica:
Falta de pré-natal adequado; presenças de doenças hipertensivas; falta de atendimento adequado no parto com procedimentos inadequados; falta de orientação e acompanhamento sobre os direitos sexuais e reprodutivos, pela equipe de saúde desde   criança; falta de capacitação dos profissionais de saúde; falta de oferta de remédios para alívio das dores; falta de massagens, tomar água, banho dentre outros; ineficiência de visita da equipe de saúde da família durante o período de puerpério.

O que observamos e analisamos nos relatos em conjunto aos dados estatísticos e debates com a sociedade, que existe pouca eficácia para as mulheres negras nos programas e políticas de saúde da mulher, acesso a proteção e direitos.

E por mais que o Brasil tenha reduzido os números de mortalidade materna nos últimos anos, ainda não se conseguiu atingir a meta estabelecida pela Organização das Nações Unidas de reduzir o número de óbitos. 

Mesmo com as diretrizes na Política Nacional para Atenção Integral à Saúde da Mulher de orientações relativo às mulheres negras, ressaltando o respeito as singularidades culturais e, sobretudo para as especificidades no perfil de morbimortalidade, há resistência discriminatórias.

Tenho plena certeza que a morte materna negra é uma violações dos direitos humanos.

E para chamar a reflexão deste debate sem entrar nas contra argumentações de vitimismo eu pergunto:
- Porque tantas mulheres pobres, pouco escolarizadas, moradoras de periferias são vítimas da mortalidade materna?

 É porque são mais vulneráveis ou por que são negras?

- Porque as pessoas não gostam de falar sobre a mortalidade materna nos conselhos locais de saúde?

Todos os anos, no dia 28 de Maio, dia Internacional Pela Saúde da Mulher e o dia Nacional Pela Redução da Mortalidade Materna, são realizadas milhares de agendas para chamar atenção principalmente dos Governos sobre os altos índices de óbitos que ocorrem devido a doenças obstétricas ou doenças preexistentes.

Momento que fazemos diversos destaques e reafirmamos que todas as mulheres tem direito a gravidez desejada, atenção de alta qualidade, humanizada e não discriminatória, no pré-natal, durante o parto no pós parto.  

Respeito, igualdade e equidade

O racismo institucional e estrutural é responsável pelos autos índices de mortalidade materna.

A uma mulher negra não é dado o tempo para fala e escuta, existe uma minimização e simplificação pré-estabelecida de queixas, atendimentos que deveriam dar um tom acolhedor, mais parecem um formulário de pronto atendimento com duração estabelecida.

Como entender as doenças específicas sem incluir a situação socioeconômica e, as relações nos lares sem o estimulo a fala?

As discriminações são mais sentidas entre as mulheres negras. Mas, por que são a maioria que utilizam o SUS ou porque são negras?

Porque todas as vezes que queremos tratar das desigualdades raciais na saúde, muitas pessoas ainda tem resistência, e entendem, como pontos de lamentações e ou excesso de reclamações, achando que é um momento de apontar soluções, como se a práticas, condutas e governabilidade de garantia na saúde, estivessem nas mãos e fossem de responsabilidade das mulheres negras?

Ainda existem resistência em anotar os dados cor/raça nos formulários de atendimento da saúde pública. A subnotificação da variável cor (“quesito cor”) na maioria dos sistemas de informação da área de saúde tem dificultado uma análise mais consistente sobre a saúde da mulher negra no Brasil.

*A Política Nacional de Saúde Integral da População Negra precisa expandir dos Comitês de Monitoramentos Estaduais para os conselhos locais de saúde e efetivação de fato por parte dos Governos.

O racismo é um determinante social da saúde, principalmente para as mulheres negras. 
A saúde é um direito Constitucional, condição importantíssima no reconhecimento e exercício da cidadania.

O caso Aline em 2011, menina pobre, negra, moradora da Baixada Fluminense, morreu no sexto mês de gravides, em estado de total abandono e, por não receber atendimento adequado. Tornou sinônimo de luta pela saúde das mulheres negras. Não temos como falar de mortalidade materna, sem memorizar  Alyne.

É preciso mudar esta “cultura” de concepção racial na saúde.

Acabar com as condutas discriminatórias existentes, sejam por preconceitos involuntários, ignorância, negligencia racial e ou esteriotipação racista. 

Estas condutas, só servem para ampliar as barreiras de acesso e provocar o afastamento das usuárias negras do sistema de saúde pública.

Qual sentimento que as pessoas imaginam que uma mulher negra tem quando ouve?
Nossa vocês são como coelho, como cria.
Sua casa não tem televisão?
Você gosta de dá, em?
Fecha as pernas ou vai encher o mundo de vagabundo.

Para falar em equidade, devemos, reconhecer as diferenças de relações discriminatórias, suas causas e consequências sem tabú e celeumas morais.

Tenham certeza que a discriminação sofrida por uma mulher negra aflora um sentimento de impotência diante a situação sofrida. Ocasiona uma dor igual ou maior que a vivida em uma agressão física. Interferem diretamente na autoestima, reforçam e compactua com a violência doméstica que muitas mulheres sofrem nos lares. 

Por mais avanços que tenhamos obtidos na sociedade com relação as não práticas racistas, muitas pessoas ainda olham para seu semelhante de cor negra e enxerga um objeto, uma mercadoria. E mercadorias não sentem dor. Objetos não tem desejos e alterações.

A falta de ações públicas de atenção à saúde da população negra, vem promovendo milhares de mortes previníveis.

O Estado deveria cumprir seu papel de promover a igualdade, mas como isto não acontece e soma-se ao não reconhecimento das especificidades e resistência no trato da saúde da população negra, sustentam institucionalmente todas as assimetrias existente de racismo na saúde, indo na contramão das diretrizes e princípios do SUS e dos direitos humanos.

*A Política Nacional de Saúde Integral da População Negra define os princípios, a marca, os objetivos, as diretrizes, as estratégias e as responsabilidades de gestão, voltados para a melhoria das condições de saúde desse segmento da população. Inclui ações de cuidado, atenção, promoção à saúde e prevenção de doenças, bem como de gestão participativa, participação popular e controle social, produção de conhecimento, formação e educação permanente para trabalhadores de saúde, visando à promoção da eqüidade em saúde da população negra.

(Síntese da fala de Mônica Aguiar na  live realizada pelo Conselho Municipal de  Saúde de Belo Horizonte, em atenção ao Dia Nacional pela redução da Mortalidade Materna ) 


3 comentários:

sonialansky disse...

Muito bom Mônica! Te escutar e estar junto com vcs nesta luta faz mais sentido! Agradeço! Sigamos pela eliminação da discriminação racial e de toda desigualdade, pela vida das mulheres!!

Unknown disse...

Como sempre, texto maravilhoso. Pena que não posso dizer o mesmo do tema. O racismo não dá descanso. Soma-se isso ao machismo. Aquelas frases ditas para mulheres negras são tão comuns. É tão comum nos desprezar. E quando você falou que isso corrobora para a aceitação da violência doméstica. Meu Deus! São muitas verdades. Bem escritas. Todo mundo tinha que ler esse blog.

Mulher Negra disse...

Devemos nos manter vigilantes as fases e práticas do racismo. Obrigada pelo comentário

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