Segundo relatório do IBGE, sete milhões de pessoas ainda passam fome no país
Embora o Brasil venha avançando na última década no combate à fome, as desigualdades sociais por gênero e raça ainda engatinham. De acordo com o relatório de Segurança Alimentar 2013, feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), milhares de brasileiros deixaram de passar fome no país nos últimos dez anos.
Mas as mulheres e os negros continuam representando a fatia da população
com os piores indicadores.
O índice é dividido em duas categorias: Segurança Alimentar – quando a pessoa teve acesso aos alimentos em quantidade e qualidade adequadas e não achava que ia sofrer qualquer restrição alimentar no futuro. E Insegurança Alimentar – quando se detectou alguma preocupação com a quantidade e a qualidade dos alimentos disponíveis (grau leve), ou quando se convive com a restrição quantitativa de alimento (moderado), ou quando, além dos adultos, as crianças também passavam pela privação de alimentos (grave). Nesse último grau, o mais severo, existem hoje sete milhões de brasileiros. Há dez anos, no início do levantamento, eram 14,8 milhões.
A insegurança alimentar é maior nos domicílios onde as chamadas 'pessoas de referência' – basicamente quem manda na casa, o que não tem relação, necessariamente, com quem é o responsável pela renda do lar – eram as mulheres: 9,3%, contra 6,9% dos homens.
Para Alessandro Pinzani, professor de filosofia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e co-autor do livro Vozes do Bolsa Família, essa diferença pode ser uma consequência do programaBolsa Família. “Muitos dos homens [de baixa renda] não estão cadastrados no programa, o que, provavelmente, dá uma renda regular maior [para a casa]", diz. “As famílias chefiadas por mulheres em muitos casos não têm uma renda regular através do trabalho. Vivem do Bolsa Família e de bicos”. Essa é uma interpretação. Mas segundo Jully Ponte, técnica do IBGE, o cruzamento de dados de famílias beneficiadas pelo programa social e das que responderam à pesquisa não foi feito. “Além disso, os domicílios cuja referência são mulheres pode ter aumentado também”, disse.
O recorte por raça também aponta para a desigualdade. Os domicílios cuja pessoa de referência é negra ou parda são maioria, em relação àqueles comandados por brancos: 29,8% contra 14,4%, respectivamente. “A miséria tem cor no Brasil”, diz Pinzani.
Para ele, o combate à fome encontra, neste momento, dois gargalos. “Um é estrutural e outro é mais subjetivo”, diz. “O subjetivo diz respeito à ignorância alimentar. As pessoas não sabem se alimentar e, quando passam a ganhar mais dinheiro para comprar comida, passam a se alimentar pior”.
Já o estrutural é consequência do difícil acesso da população a alimentos como verduras e hortaliças. “Muitas vezes as pessoas têm consciência de que precisam de frutas e legumes, mas esses alimentos são caros”, diz. “Principalmente no sertão do país, ter uma horta custa caro, por causa da água necessária [para irrigar]. E comprar esses alimentos nessa região também custa muito caro”, explica.
De fato, comparada com as cidades, as áreas rurais abrigam maior população que sofre com a fome: 35% contra 20,5% dos centros urbanos. “Detectamos uma diferença positiva na área urbana, mas menos na área rural”, diz Jully Ponte, comparando a redução dos problemas relacionados à fome nessas duas áreas com os anos anteriores. Além disso, 45% das pessoas que passam fome estão na região Nordeste do país.
Essa região é a única em que todos os Estados apresentaram taxas de segurança alimentar inferiores à média nacional (77,4%).
Isoladamente por Estado, o Espírito Santo foi o que apresentou a maior taxa de segurança alimentar (89,6%), seguido por Santa Catarina (88,9%) e São Paulo (88,4%). Já o Maranhão (39,1%) e o Piauí foram os Estados com as piores taxas desse índice, 39% e 44,4%, respectivamente. Mas até nesses locais houve avanço: Em relação a 2009, esses Estados registraram aumentos de 3,8 e 3 pontos percentuais, respectivamente.
A fome compra fiado
O levantamento indica que comprar fiado é a principal atitude adotada pelas famílias que sofrem com falta de alimento: 43% afirmaram tomar essa atitude. Em seguida, 27% disseram que pedem alimentos emprestados a parentes, vizinhos ou amigos e 7% deixam de comprar supérfluos.
Cenário internacional
Um comparativo feito pelo IBGE apontou que o Brasil (77%) é o segundo país com o maior número de domicílios que vivem segurança alimentar, entre os países da América que usam uma metodologia parecida para calcular esse problema. Os Estados Unidos (85%) apareceram em primeiro lugar. Em terceiro lugar está a Colômbia (57%), seguida do México (30%) e da Guatemala (19%).
Não foi possível comparar todos os países do continente porque nem todos usam o mesmo método para o calcular.
Fonte:El Pais
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