segunda-feira, 30 de dezembro de 2024

RETROSPECTIVA MULHER, 2024 !

 Por Mônica Aguiar 


O ano de 2024 acarretou grandes ações no Brasil. Disputas e decisões políticas que influenciaram a vida das mulheres brasileiras. 
De forma tímida, estão  restabelecendo  perdas realizadas do governo anterior . 

Por um outro lado, o medo e silêncio tomou conta de parcela da sociedade organizada que deveriam se manifestar.

Este cenário apresentado reflete um contexto onde a opressão e o medo ainda imperam sobre as mulheres, especialmente aquelas rotuladas injustamente como "bruxas" ou que se destacam por sua singularidade e força. 

Este silêncio das inocentes é uma metáfora poderosa que evidencia o medo de represálias e a insegurança diante de um sistema que deveria proteger, mas que, frequentemente, falha em garantir os direitos básicos das mulheres. 

As recomendações para melhorar essa situação enfatizam a necessidade urgente de fortalecer políticas públicas e iniciativas que promovam a igualdade de gênero, a proteção dos direitos humanos e a criação de espaços seguros onde as vozes femininas possam ser ouvidas e respeitadas. 

Somente através do enfrentamento politico e apoio mútuo será possível transformar este cenário de injustiça em um ambiente verdadeiramente livre para todas. Principalmente livre do medo e de perseguições políticas e das amaras que moldam as vozes
das mulheres.

Espero que gostem da retrospectiva 2024. Feliz 2025! 

POLÍTICA

  • Mulheres recebem 68,2% das ofensas no 2° turno – Padrão de ataques em transmissões de debates se repetiu durante toda a campanha de 2024 .
  • Orçamento Sensível de Gênero(OSG) é debatido em Congresso.
  • Comissão Permanente Mista de Combate à Violência contra a Mulher da Câmara Federal , com apoio da ONU Mulheres e de entidades da sociedade civil, promoveu pela segunda fez  a campanha anual dos "21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres".
  • Protocolo que estabelece diretrizes para o enfrentamento da violência política contra a mulher é assinado na Câmara dos Deputados.
  • Simpósio "De Olho nas Urnas" e lançamento dos Painéis de Atuação Parlamentar das Mulheres.
  • Procuradoria da Mulher completa 15 anos. (Para alcançar este objetivo, luta pela ampliação da participação feminina na política e nos espaços de poder; estabeleceu parcerias para promoção da autonomia econômica da mulher, além de contribuir diretamente para formulação de políticas públicas integradas para a saúde da mulher).
  • A Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 487/24 que estabelece regra para garantir que o nome dado a recém-nascido tenha a concordância da mãe.
  • Primeira mulher inconfidente vai para o 'Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria'.
  • Cota de gênero é descumprida em mais de 700 municípios brasileiros nas Eleições 2024.
  • ONMP lança seu primeiro boletim de notícias (O documento de periodicidade quadrimestral traz iniciativas, eventos e resultados das ações do Observatório Nacional da Mulher na política).
  • As eleições municipais de 2024 foram as que mais registraram candidaturas femininas às prefeituras no Brasil. Por mais que seja um marco importante, ainda está aquém do ideal: isso porque o número representa apenas 15% do total de candidatos ao pleito neste ano. A maioria das eleitas faz parte da ala da extrema direita.
  • O Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) questiona no Supremo Tribunal Federal (STF) uma resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) que proíbe a utilização de uma técnica clínica (assistolia fetal) para a interrupção de gestações acima de 22 semanas decorrentes de estupro.

ESPORTES

  • É a primeira vez que a delegação brasileira teve maioria feminina em uma Olimpíada. Dos 277 atletas brasileiros, 153 mulheres eram mulheres, ou 55% do total.
  • Pela primeira vez na história, mulheres trouxeram mais medalhas do que homens em uma edição dos Jogos Olímpicos. Das 20 medalhas que o Brasil trouxe para casa, 12 foram de mulheres.
  • Atletas brasileiras fizeram história nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos. O Brasil quebrou recorde com sua maior participação feminina: foram 117 mulheres entre 255 atletas, ou 45,9%.
  • Protagonismo feminino marca participação brasileira nos Jogos Olímpicos Paris 2024.
  • A promoção da equidade de gênero no esporte é  um dos destaques do ano. O Programa de Desenvolvimento do Esporte Feminino (PDEF), criado em 2023, teve uma expansão significativa em 2024.
  • Dentre os quatro multimedalhistas brasileiros dos Jogos de Paris, três são mulheres: Beatriz Souza (ouro na final da categoria +78kg do judô feminino e bronze por equipes) e Larissa Pimenta (bronze na categoria até 52kg do judô feminino e na disputa por equipes), cada uma com duas medalhas, e Rebeca Andrade, com quatro (ouro no solo, duas pratas, no individual geral e no salto e um bronze, na disputa por equipes). Elas foram apenas algumas das atletas que fizeram história na Olimpíada deste ano.

VIOLÊNCIA CONTRA MULHERES

  • Ex-policiais Ronnie Lessa e Élcio Queiroz foram condenados pelo 4º Tribunal do Júri da Justiça do Rio de Janeiro por ter  assassinado a Vereadora  Marielle Franco e seu motorista, Anderson Gomes.
  • Ministra de Igualdade Racial, Anielle Franco denunciou o então ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, por importunação sexual, caso que chocou o país e levou outras mulheres a acusarem o advogado, intelectual renomado e referência do movimento antirracista.
  • É dada a alteração da Lei Maria da Penha que assegura o sigilo do nome da vítima em casos de violência doméstica e familiar (Lei nº 14.857/24).
  • Criação de plano de metas para o enfrentamento integrado de violência doméstica e familiar contra a mulher (Lei nº 14.899/24).
  • È criado Cadastro Nacional de Pedófilos e Predadores Sexuais, que permite acesso a nomes e CPFs de condenados em primeira instância por crimes sexuais (Lei nº 15.035/24).
  • Por meio do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania 2 (Pronasci 2), o MJSP inicia o financiamento da construção de 12 Casas da Mulher Brasileira com recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública.
  • Inauguradas mais tres casas Casas da Mulher Brasileira, totalizando 13 em todo pais.
  • Redução de  5,1% dos casos registrados de feminicidios .
  • MJSP  cria Comitê Nacional de Gestoras dos Entes Federados para dar maior eficácia para a execução do dinheiro do FNSP nas políticas públicas estaduais e distritais e melhorar a administração e a gestão do fundo junto aos entes federados.
  • Treze(13) representantes do governo Lula cedem a pressões políticas morais e  votam contra  a proposta de resolução para atender menores que fazem aborto do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda).
  • Governo Federal  perde no Conanda a votação sobre resolução que detalha procedimentos para casos em que crianças e adolescentes manifestem interesse em realizar o aborto legal e decepciona apoiadoras.
  • A campanha Nem Presa Nem Morta e a ONG Coletivo feminista Sexualidade e Saúde  soltam nota contra a  postura do governo federal na votação da Resolução do CONANDA  .
  • È instituida a Política Nacional de Prevenção e Combate ao Abuso e Exploração Sexual da Criança e do Adolescente e alterado o Código Penal (criando os crimes de bullying e cyberbullying), a Lei dos Crimes Hediondos (para considerar como hediondo os seguintes crimes: Induzir ou auxiliar o suicídio ou a automutilação na internet e redes sociais; sequestrar e/ou manter em cárcere privado a pessoa menor de 18 anos; e traficar crianças ou adolescentes (menores de 18 anos) e o ECA.
  • Crecem dificuldades de acesso aos serviços de proteção para mulheres em situação de violência .
  • Disque 100 já recebeu mais de 580 denúncias de violência política em 2024.
  • O Brasil continua estar entre os paises com maior ranking de população feminina encarcerada. Apesar da Portaria Interministerial nº 210, de 2014, que instituiu a Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional, visando a prevenção de todos os tipos de violência contra mulheres nessa situação, a garantia de direitos ainda está distante da realidade.

SAÚDE

  • As ameaças contra os direitos reprodutivos no Brasil (O aborto legal esteve no centro do debate político brasileiro em 2024. O motivo foram ofensivas políticas realizadas ao longo do ano para tentar dificultar o acesso de mulheres, meninas e pessoas que gestam aos serviços especializados do país – ou mesmo acabar com o direito. Vale lembrar: no Brasil, o aborto é legal em casos de gestação decorrente de estupro, de anencefalia fetal ou de risco de vida da mãe).
  • Tramitou na Camara Federal projeto de lei nº 1.904/24, que equipara a pena para quem faz aborto (legal ou não) depois da 22ª semana seja de 20 anos; a mesma de homicídio.
  • Fechamento do serviço de aborto legal do Hospital Municipal e Maternidade da Vila Nova Cachoeirinha, em São Paulo ( referência no Brasil).
  • O Conselho Federal de Medicina (CFM) e o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) promovem ofensivas contra o Aborto Leal e aprova   resolução que determina  a solicitação de  prontuários médicos sigilosos de pacientes dos serviços para fazer uma "fiscalização" do serviço.
  • Sancionada Lei que garante espaços privativos no SUS para mulheres vítimas de violência (Lei nº 14.847/24).
  • È  identificada por Dra.Silvana Santos (biologa), a síndrome de Spoan (acrônimo em inglês para "paraplegia espástica, atrofia óptica e neuropatia") no nordeste do Brasil, uma doença neurodegenerativa genética rara que causa paralisia progressiva.
  • Institui o Certificado Empresa Promotora da Saúde Mental e estabelece os requisitos para a concessão da certificação.
  • Maternidade no Rio realiza segundo parto de pessoa trans por projeto do SUS;
  • Painel da População Negra é lançado pelo Ministério da Saúde(A plataforma – disponibilizada em totens durante o seminário Equidade Étnico-Racial nas Redes de Atenção à Saúde – conta com dados e indicadores sociodemográficos de morbidade e de mortalidade específicos para a população negra.)
  • Norma técnica com esclarecimentos sobre o aborto legal é suspensa após reação negativa da ala conservadora no Congresso;
  • Governo Federal lança o Programa Rede Alyne substituindo  a Rede Cegonha. Destaco os objetivos: -  reduzir a mortalidade materna no Brasil , aumentar o cuidado humanizado e integral para gestantes, parturientes, puérperas e crianças e aumento no repasse para que estados e municípios possam realizar exames pré-natal.
  • É alterada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (9.394/1996), a fim de garantir regime escolar especial para estudantes – dos ensinos básico e superior – em tratamento de saúde e mães lactantes.
  • STF suspende resolução do CFM que dificulta aborto em gestação decorrente de estupro. O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu uma resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM). Na avaliação do ministro, há, na hipótese, indícios de abuso do poder regulamentar por parte do Conselho Federal de Medicina ao limitar a realização de procedimento médico reconhecido e recomendado pela Organização Mundial de Saúde e previsto em lei.
  • Lançada nova estratégia para reduzir mortalidade materna em 25% até 2027. Entre as inovações está a necessidade de um plano integrado entre a maternidade e a Saúde da Família – com qualificação das equipes de Saúde da Família, principal porta de entrada do SUS – e, de forma inédita, a ampliação do Complexo Regulatório do SUS com equipe especializada em obstetrícia.
  • Taxa de cesáreas segue em alta no Brasil . O número de cesarianas no Brasil continua a crescer e se distanciar do patamar recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), de que apenas 15% dos nascimentos sejam não naturais — o percentual estimado de casos em que o procedimento é realmente necessário. No país, aproximadamente 59,7% dos partos realizados no ano passado, incluindo nascimento através de hospital públicos, foram por meio de cesariana, ante 58,1% em 2022. Informações da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
  • Crescem relatos de violência obstétrica Levantamento aponta que no SUS 45% das mulheres sofrem com a violência obstétrica, já nos hospitais privados são 30%.
ARTE E CULTURA
  •  Cia das Letras e Lilia Schwarcz fecham acordo com mulher negra retratada na capa de livro antirracista.
  • É instituida a  Semana de Valorização de Mulheres que Fizeram História no âmbito das escolas de educação básica, que acontecerá anualmente na segunda semana de março, Mês das Mulheres (Lei nº 14.986).
  • Peça de Abdias Nascimento chega ao Brasil 30 anos depois de publicada nos EUA.
  • Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), na reunião do Conselho Consultivo, reconhecem as Marujadas de São Benedito, no Pará, como  patrimônio cultural do Brasil.
  • Pernambucana ganha prêmio de jornalismo com reportagens sobre alimentação de mulheres negras (Série de reportagens de Adriana Amâncio, no site Gênero e Número, inclui matéria sobre assentada do MST em Paudalho)
  • Saberes e as práticas das Parteiras Tradicionais são reconhecidos como Patrimônio Cultural do Brasil . (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) reconheceu o Ofício do Saberes e Práticas das Parteiras Tradicionais do Brasil como Patrimônio Cultural do País).
TRABALHO
  • É sancionada pelo Presidente Lula a Política Nacional de Cuidados que promove igualdade de gênero, reconhecimento do trabalho de cuidado e apoio às famílias brasileiras (Lei nº 14.673/2024).
  • Aprovado no G20  compromisso com a igualdade de gênero e o empoderamento de mulheres e meninas, por meio de trabalho digno, acesso à tecnologia e aumento de nomeações de mulheres em cargos de governança global.
  • As  mulheres tem maior registro na ocupação de vagas de trabalho formal do que os homens. O crescimento expressivo no saldo feminino de vagas ocupadas no mercado formal gerou uma mudança na composição do saldo total de empregos geral.
  • As mulheres desfrutam de apenas dois terços dos direitos legais concedidos aos homens aponta relatório inovador recém-lançado pelo Grupo Banco Mundial. Embora, segundo as leis em vigor, as mulheres pareçam gozar de cerca de dois terços dos direitos concedidos aos homens.

EDUCAÇÃO
  • 60% das inscrições no ENEM são de mulheres.
  • Maioria das pessoas candidatas  inscritas no ENEM se reconhece na cor parda.
  • Contribuições das mulheres para humanidade serão foco de aprendizado nas escolas a Lei 14.986/2024 acrescenta um novo artigo à Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/1996) para o ensino dos diversos aspectos femininos na história, na ciência, nas artes e na cultura do Brasil e do mundo.
  • Os novos dados do relatório Education at a Glance 2024, da OCDE, lançam luz sobre uma triste contradição que permeia a realidade educacional e laboral no Brasil: embora meninas tenham um desempenho acadêmico superior ao dos meninos durante o ensino básico, essa vantagem não se traduz em oportunidades no mercado de trabalho.
  • Brasil tem 1,8 milhão de professores na rede pública; 78,8% são mulheres(Dado é do Anuário Brasileiro da Educação Básica 2024).
 
SOCIEDADE
  • A sociedade brasileira se mostrou muito mais aberta a compreender a importância de deixar que mulheres tomem a decisão sobre seguir ou não com a gravidez nos casos já legais no Brasil.
  • BBC divulga sua lista de 100 mulheres inspiradoras e influentes ao redor do mundo em 2024 , entre elas : Ginasta Rebeca Andrade; Lourdes Barreto defensora dos direitos  para as profissionais do sexo no Brasil; A bióloga Silvana Santos atribui sua descoberta pioneira no campo da genética síndrome de Spoan.
  • Mulheres do MST realizam ato em frente a revendedora de armas da Taurus em São Paulo . A ação destacou o aumento do número de feminicídios praticados com armas de fogo no Brasil
  • Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Fazenda publica pela primeira vez,  relatório sobre a distribuição da renda e da riqueza da população nacional com avaliação dos impactos  de questões de gênero .
  • Mulheres enfrentam maior carga de tributação do imposto de renda comparativamente ao sexo masculino, de modo que o IRPF acaba atuando como um instrumento amplificador da desigualdade de gênero", diz o texto.
  • Dados da ONU apontam que mais de 100 milhões de mulheres e meninas poderiam ser tiradas da pobreza se os governos dessem prioridade à educação e ao planejamento familiar, a salários justos e iguais e ampliassem os benefícios sociais.
  • O papel dos afrodescendentes, como grupos quilombolas, para a conservação e uso sustentável da natureza foi oficialmente reconhecido pela primeira vez em um documento da conferência de biodiversidade da ONU (Organização das Nações Unidas).
  • Avanços sociais não chegam na ampla maioria dos lares chefiados por mulheres negras.
  • Combate ao racismo ambiental entra em novo plano climático para o Brasil . OObservatório do Clima, NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada) com a participação da sociedade civil, elaborou cinco pilares para que o país alcance suas metas: redução do desmatamento, a quase zero, em todo seu território (limitado a um máximo de 100 mil hectares por ano, a partir de 2030); a recuperação do passivo do Código Florestal de 21 milhões de hectares de cobertura vegetal; o sequestro maciço de carbono no solo pela forte expansão de práticas agropecuárias de baixa emissão; a transição energética para fora dos combustíveis fósseis e a melhoria da gestão de resíduos.
  • Macaé Evaristo(MG), toma posse como Ministra dos Direitos Humanos.  
  • No Brasil, 125 milhões de pessoas vivem em situação de insegurança alimentar.
  • Tarciana Medeiros: a Única Brasileira entre as Mulheres Mais Poderosas do Mundo. Presidente do Banco do Brasil ocupa o 18º lugar no ranking da Forbes, ao lado de grandes líderes empresariais, políticas e artistas.
  • Peritas da ONU alertam sobre as fragilidades das políticas de defesa da mulher no Brasil. É a primeira vez em doze anos, o país está sendo examinado pelo Comitê sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW). A partir da sessão, o órgão internacional apresentará recomendações ao Brasil.

 

Fontes : Marie Claire / Agência Gov. /.Rádio Agencia/.Woldbank  /.Geledes/ Brasil de Fato /Azmina/ bancodealimentos/ Camara Federal Secretaria da Mulher / Equidadeeducacional/ Forbes/ Pastoral Carceraria/UOL/

segunda-feira, 2 de dezembro de 2024

Violência Contra as Mulheres Negras, práticas racistas e descaso do Estado

 Por Mônica Aguiar

Foto: Mônica Aguiar e sua filha Jessica Carolina 

As variáveis existentes nas práticas racistas representam um grave obstáculo ao exercício de cidadania, perpetuam desigualdade, promovendo prioritariamente a exclusão e o não acesso aos direitos fundamentais  às mulheres negras.

Vários estudos e pesquisas apontam ser o principal alvo de violências e discriminações, tanto no ambiente público quanto no privado a falta de condições financeiras.

Dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), base alimentada por registros de doenças de notificação compulsória ao Sistema Único de Saúde (SUS), apontam que em 2022 mais da metade (55%) das brasileiras vítimas de violência eram negras. Já entre as vítimas de violência sexual, as pretas e pardas foram 62% e as assassinadas, 67%”.

Estudos recentes, também apontam que as desigualdades salariais produzem situações de desigualdades  tanto para mulher negra quanto para seus dependentes.  

A dependência financeira dificulta a ruptura desse ciclo de abuso e limita as possibilidades de busca por proteção, de acesso ao serviço de apoio e até mesmo de deixar esse ambiente violento”.  ( Milene Tomoike, em entrevista à Agencia senado). 

Eu digo o seguinte: que a vulnerabilidade econômica é um dos muitos fatores que podem contribuir para a violência doméstica de gênero, mas não é o único nem necessariamente o mais determinante. Questões como desigualdade de gênero, normas morais e religiosas, abuso de substâncias e histórico de violência familiar também desempenham papéis significativos.

A dependência financeira, no entanto, torna mais difícil para as vítimas deixarem situações abusivas, reforçando a dinâmica de poder do agressor. O estresse gerado por dificuldades financeiras nos lares de famílias negras pode exacerbar comportamentos agressivos em indivíduos já predispostos à violência.

Portanto, é crucial adotar abordagens multifacetadas que considerem todos esses fatores ao abordar e prevenir a violência doméstica de gênero.

As dificuldades de acesso aos serviços de proteção para mulheres em situação de violência é um problema persistente e, frequentemente impede a interrupção do ciclo de violência.

Muitas vezes, essas barreiras são resultantes de uma combinação de fatores, incluindo a falta de informações claras sobre os serviços disponíveis, a localização geográfica, centralidade dos locais de proteção, a insuficiência de recursos, e o medo de represálias.

Além disso, este formato tradicional de proteção, que pode incluir abrigos temporários e medidas legais, demonstra que não atendem às necessidades individuais, principalmente das mulheres negras.

É urgente mudar este modelo de proteção. É preciso que seja mais inclusivo, adaptáveis e, que considerem as particularidades de cada caso, oferecendo  suporte contínuo e abrangente.

Para isso é preciso incluir serviços de apoio psicológico, acompanhamento jurídico e de saúde, encaminhamento correto aos  programas de reintegração social, trabalho e acesso à habitação. Capacitar plenamente as mulheres a reconstruir suas vidas longe de quem pratica a violência.

A falta de assistência por parte do Estado, os padrões discriminatórios existentes no atendimento e "acolhimento" ao buscar serviços, e o imaginário de que a mulher negra é forte e suporta tudo, são questões profundamente enraizadas que impactam negativamente a vida das mulheres negras.

Essas problemáticas refletem desigualdades históricas e estruturais que perpetuam a exclusão e criam marginalização.

O mito da força sobre-humana da mulher negra não apenas desumaniza, mas também invisibiliza suas necessidades e vulnerabilidades, resultando em uma assistência inadequada e muitas vezes negligentes.

Para enfrentar essas questões, é essencial promover políticas públicas inclusivas e sensíveis que reconheçam e respeitem a diversidades e fatores sociais e territoriais, além de desconstruir estigmas e preconceitos através da educação e do diálogo aberto na sociedade.

Para que a democracia e a cidadania sejam verdadeiramente inclusivas, é essencial que enfrentem o racismo de maneira decidida e abrangente. Isso inclui a implementação de políticas públicas que e assegurem o respeito e reconhecimento dos direitos humanos de todas as mulheres negras.

Essas políticas devem focar em áreas como educação, saúde, habitação e mercado de trabalho, garantindo que todas as mulheres negras tenham acesso igualitário aos recursos e oportunidades.

Além disso, é importante fomentar a representatividade em espaços de poder e decisão, para que as vozes e experiências das mulheres negras sejam ouvidas e valorizadas.

Já o discurso que atribui a responsabilidade da ausência e dos descasos exclusivamente às estruturas pode ser problemático, pois desvia o foco das ações e decisões políticas que moldam essas mesmas estruturas. 

Estruturas sociais e econômicas são, de fato, influenciadas e muitas vezes criadas pela vontade política daqueles que estão no poder. 

Assim, quando se diz que algo é "estrutural", há o risco de se isentar de responsabilidade aqueles que têm o poder de promover mudanças significativas.

 É crucial reconhecer que a transformação dessas estruturas requer comprometimento político e econômico, especialmente no que se refere à justiça social e à equidade racial. 

Portanto, ao abordar questões que afetam as mulheres negras, é fundamental cobrar responsabilidade daqueles que têm o poder de decisão, promovendo políticas que visem à desconstrução de desigualdades e à promoção as reparações.

A promoção da consciência social e a educação sobre a história e contribuições das mulheres negras são fundamentais para desmantelar preconceitos e construir uma sociedade mais justa e equitativa.

Fonte de dados: Agência Senado/ Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher Negra, 10ª edição da Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher, desenvolvida em parceria com o Observatório da Mulher contra a Violência do Senado.

QUEM É MÔNICA AGUIAR é escritora, jornalista, feminista negra e ativista brasileira. Conhecida por seu blog "Mulher Negra", onde aborda temas como: - Feminismo negro; racismo e discriminação; identidade negra; cultura afro-brasileira; direitos das mulheres negras. Sua trajetória está marcada na representação política partidária, sindical, nos movimentos de mulheres e mulheres negras, além de várias conquistas e feitos em Minas Gerais. 

Jornalista de profissão, tem larga experiência em veículos de comunicação.  É escritora de obras como "Mulheres Negras: Histórias e Resistência" e "Cadernos de Literatura Negra", Ativista do Movimento Negro e Feminismo Negro, palestra em eventos sobre racismo, gênero e educação. 

Criadora do  blog "Mulher Negra" que se tornou um espaço para compartilhar histórias, experiências e reflexões sobre a vida das mulheres negras. O Blog Mulher negra é reconhecido como um dos principais blogs de feminismo negro no Brasil.  Mônica Aguiar é uma voz importante na luta contra o racismo e pela igualdade de gênero no Brasil.


quinta-feira, 26 de setembro de 2024

Solidariedade às Mulheres Negras que conquistaram o poder!

  Por Mônica Aguiar

Ao analisar as estatísticas, o racismo continua a ser subestimado pelo sistema nativo hierárquico de dominação entre os homens, isto,  independentemente da cor da pele. 

A manifestação deste  sofrimento, é expresso por mulheres negras, em todas as esferas, tanto públicas quanto privadas, independentemente do nível de instrução e classe social. 

Lembrando que a presença das mulheres negras nas esferas de decisão do país, é inversamente desproporcional ao seu tamanho populacional.

Os espaços de decisão democrática, participação social, casas legislativas, governos estaduais e municipais não reproduzem a configuração quantitativa do contingente social da população negra.

Outras variáveis são demonstradas nas diferentes dificuldades enfrentadas quando o assunto é preenchimento de vagas para cargos máximos. 

A meu ver, tema este importante que deve ser abordado com responsabilidade e diplomacia, livre dos valores baseados nas barreiras sistêmicas, históricas e que impedem a população negra de alcançar igualdade de oportunidades.

A afirmação de que a população negra, “não está preparada” é problemática, e, são baseadas em preconceitos e estereótipos injustos.

Esta configuração existente, não garante representação, muito pelo contrário, contribuem com as distorções das metas e determinações estabelecidas como compromissos assumidos, assinados em Tratados, Conversões e Leis de combate ao racismo pelo Brasil.

Na Revisão Periódica Universal da Organização das Nações Unidas (ONU), para analisar   a situação interna de direitos humanos nos Estados-membros da ONU, o Brasil recebeu 246 recomendações para combate ao racismo estrutural existente. Dentre estas, destaca-se a determinação para se construir reforma legislativa específica para fortalecer as medidas contra a discriminação baseada no gênero e na etnia; implementar medidas destinadas a prevenir a violência e a discriminação racial contra a população negra”.

Os poucos avanços que obtivemos, são frutos de muitas batalhas promovida pelo Movimento de mulheres negras brasileiras. 

Já, a maioria dos entraves são frutos da falta de vontade política.

É preciso analisar todas as camadas econômicas e sociais da população negra. Considerar os números apontados nas pesquisas como dados relevantes e não um simples recorte para desenvolver medidas paliativas de transferência de rendas, sem a preocupação política em garantir os direitos fundamentais com acesso igualitário, livre de burocracias e entraves raciais.

A falta de consideração as Leis direcionadas ao desenvolvimento de políticas públicas, antirrepublicanismo, aversão aos valores que formulam a democracia, o negacionismo e, a falta de ações reparatórias,  são características encontradas em vários setores, sejam privados, seguimentos políticos e ordenamentos no Brasil. Dá esquerda a direita, entre brancos e negros.

Ainda existem rejeições e preconceitos quando o assunto é mulher negra.

Essas rejeições se manifestam de várias formas, desde o racismo explícito até o racismo estrutural e institucionalizado.

O fato de negar os problemas enfrentados por todas as mulheres negras, negar as sequelas existentes, de imaginar que falar da mulher negra é vitimismo, é a “mais pura” demonstração que existem resquícios fortes, de valores escravocratas estruturados entre as relações humana.

A violência sofrida cotidianamente por mulheres negras é uma questão complexa, se manifesta de diversas formas, independente da classe social dos agressores. 

Essas agressões são frequentemente agravadas pela interseção do racismo e do machismo e necessidade de domínio sobre os nossos pensamentos e corpos.  

Falar da mulher negra no Brasil é falar de uma história de exclusão, onde as variáveis existentes no sexismo, no racismo tornaram se naturalmente estruturantes. 

Causa desconfortos. 

Existem diferentes graus de resistências, inclusive entre a população negra. A ampla maioria da população brasileira acreditam na existência da democracia racial.

As sobreposições de preconceitos resultam em experiências de violência únicas e, muitas vezes mais severas. 

A hipersexualização de mulheres negras pode levar a um aumento de assédios e agressões sexuais. 

Além disso, estereótipos raciais negativos justificam e minimizam a violência sofrida, tanto na mente dos agressores quanto na sociedade em geral.

Homens independentes das etnias/raças e classes sociais podem perpetuar essa violência, embora as formas e os contextos possam variar. 

Homens de classes mais altas podem usar seu poder econômico e social para controlar e abusar de mulheres negras. Independentemente,  o resultado é um ciclo contínuo de opressão e violência que contribuem com a perpetuação das desigualdades.

É crucial combater a violência sofrida.

Quem sabe, incluir políticas de educação para a igualdade de raça, no sistema de justiça que proteja verdadeiramente as vítimas e responsabilize os agressores? 

Manifestações públicas ideológicas, ódio racial, calorosas controversas contrários a conceitos históricos e científicos.

É preciso criar mecanismos que dê condições verdadeiras ao exercício da cidadania, com oportunidades, igualdade, equidade, reparando os danos causados pela escravidão.

Realmente devo concordar que está no momento para construir novas pautas. Porém, nunca deixar de reconhecer o papel histórico das mulheres negras na construção e organização das estruturas econômica, cientifica, social, de justiça e política, na sociedade brasileira. Mesmo estás sendo poucas. 

A invisibilidade constrói retrocessos . 

Tenham a certeza de minha solidariedade com as mulheres negras que enfrentam desafios ao buscar posições de poder e que sofrem abusos, violências psicológicas e sexuais.

É fundamental reconhecer a coragem dessas mulheres que, apesar das adversidades, continuam lutando por direitos e por um espaço onde possam exercer plenamente suas capacidades e talentos. 

Violência alguma deve ser tolerada e, em nenhuma circunstância. 

Todas as pessoas tem a responsabilidade de apoiar e proteger as vítimas, além de trabalhar para a erradicação desses comportamentos.

O caminho para um mundo mais inclusivo e respeitoso é longo, mas, cada gesto de solidariedade e, cada voz que se levanta contra a opressão, fazem a diferença.

Saudemos a vida, a resistência e luta das mulheres negras! 

segunda-feira, 12 de agosto de 2024

Desafios enfretados por nós, mulheres negras

Por Mônica Aguiar

As práticas racistas representam um grave obstáculo ao pleno exercício  da democracia e da cidadania das mulheres negras. 

As conquistas são dadas de maneira desproporcional, com isto, vinculam de formas diferentes e promovem de formas diferentes a segregação racial. 

A mulher negra é a principal vítima do racismo “estrutural” é alvo de violência e discriminação, tanto no ambiente público quanto no privado.

 Não é simples ter que enfrentar os desafios adicionais do racismo em termos de acesso às oportunidades no emprego, na educação, na habitação e na saúde.

Afirmar que existe democracia é fácil. Garantir que o sistema democrático seja universalmente inclusivo, enfrente e combata todas as formas de racismo e práticas racistas estruturadas no setor público e no privado, é a questão.

Ao avaliar os números e seus percentuais dos avanços econômicos e de bens sociais alcançados nas últimas décadas, muitas narrativas de combate ao racismo acabam se perdendo. 

Na minha avaliação é imprescindível ressignificar a leitura da contribuição das mulheres negras à história brasileira. Mulheres que sempre desempenharam papéis fundamentais em diversas áreas, desde a luta pela abolição da escravatura até a promoção de direitos civis e sociais, sim. Também, o papel das mulheres negras na produção da economia e das riquezas, repetidas vezes subestimadas e invisibilizadas. 

As mulheres negras também são pilares em diversos setores econômicos, na ciência, tecnologia, inovação e, nos denominados setores intelectuais. No entanto, apesar de sua contribuição significativa, a maioria não tem acesso às riquezas que ajudam a gerar.

As barreiras sistêmicas, como o racismo, machismo e sexismo, perpetuam desigualdades que limitam suas oportunidades de ascensão econômica e social.

Mesmo quando alcançam posições de destaque, as mulheres negras enfrentam disparidades salariais e falta de reconhecimento. Frequentemente enfrentam barreiras sistêmicas que incluem discriminações de gênero e a interseccionalidade dessas opressões resulta em uma desvantagem econômica que perpetua diferenciadamente a desigualdade.

Além disso, a ressignificação dessas contribuições é essencial para a construção de novas narrativas.

Reconhecer, celebrar as conquistas das mulheres negras não é apenas um ato de justiça histórica é também um passo crucial para garantia dos direitos civis, a fim que as futuras gerações continuem essa jornada de resistência e transformação sendo protagonistas e tenham visibilidade e conhecimento do seu papel.

A proteção contra violações de direitos, especialmente a violência sexual, e a descriminalização de comportamentos considerados ilícitos são frequentemente negligenciadas no Brasil devido a uma combinação complexa de fatores.  Aspectos morais e religiosos estão profundamente enraizados na sociedade e influenciam a inteligência pública e as políticas adotadas por alguns gestores públicos.

A cor da pele continua a ser um fator determinante na classificação do potencial educacional e político das mulheres, perpetuando desigualdades que limitam seu acesso a direitos garantidos constitucionalmente.

Como assegurar que todos os direitos sejam efetivamente garantidos, independente da cor da pele?

O cenário político no Brasil, reflete e fomenta mecanismo sistêmico de discriminações que restringe as possibilidades de ascensão social e inibem a participação em espaços de poderes. 

O Brasil, ao assinar diversos tratados e convenções internacionais, evidencia seu compromisso em enfrentar problemas sociais profundos e persistentes. A adesão a acordos de combate à escravidão, ao racismo e às desigualdades de gênero é um reconhecimento explícito da existência desses males crônicos na sociedade brasileira. Estes tratados sinalizam uma intenção de mudança, representam um passo fundamental para a criação de políticas públicas verdadeiramente justas e inclusivas.

No entanto, a assinatura desses documentos foi apenas o primeiro passo; a implementação efetiva das medidas propostas é crucial para a real transformação social. A conscientização de Governos e gestores sobre responsabilidades assumida no Estado brasileiro e, a atuação contínua da sociedade civil são igualmente essenciais para garantir que essas promessas se traduzam em melhorias concretas na vida das mulheres negras.

As abordagens punitivas e conservadoras, estruturadas no racismo, contribuem para a perpetuação de pensamentos preconceituosos e práticas discriminatórias que violam direitos das mulheres em todas as fases de sua vida. Essa realidade dificulta a implementação de ações eficazes de proteção, atrasam com a revisão de leis que criminalizam comportamentos. Portanto, é crucial promover um diálogo aberto e inclusivo, que desafie essas influências negativas e trabalhe em prol de uma sociedade mais equitativa e respeitosa aos seres humanos negros.

sexta-feira, 5 de julho de 2024

3 de Julho marca 58 anos de sobrevivência, invisibilidade e sonho por liberdade

 Por Mônica Aguiar


Neste 03 de julho de 2024, são muitos os fatos do Brasil que podemos lembrar. Dois deles, o Dia Nacional de Combate à Discriminação Racial e a criação do Ministério da Justiça. Também é dia dos incrédulos e o 184.º dia do ano no calendário gregoriano (185.º em anos bissextos).

Neste 03 de julho, eu faço 58 anos. Ao chegar nesta idade, interrompo meu ciclo diário e penso em tudo que passou e passei. 

São tantas as lembranças que torna incapaz de segurar as lágrimas. Muitas alegrias. Muito maiores as pelejas e consternações.   

Ao pensar nas batalhas, começam a lembrar do tempo em que eu, ainda jovem e com 03 filhos para criar sozinha, nos períodos de férias, que deveria descansar, estava presente nas agendas e ações realizadas pelo movimento negro brasileiro e de mulheres.

Está presente em reuniões, seminários, encontros e congressos não era uma tarefa simples. 

Eu quero, eu vou. 

Existia toda uma dinâmica para ser eleita como representante e estar nestes lugares.

Os critérios apresentados para a disputa eram sempre refletidos nos valores existentes na sociedade e constituídos por obstáculos presentes nas estruturas do racismo.

Para uma mulher negra, com filhos, pobre e favelada, estar presente nestes locais, além de estratégico, contribuía com a sua formação política e social. Perfurava a bolha classista, seleta e excludente.

Para mim, também dava condições de aprendizado e informações que poucas tinham, e, para isto, era necessária muita determinação e enfrentamento duro para conquistar o acesso nestes espaços.

Estar presente não apenas para dar respaldo em silêncio. Se um número. 

Bater palmas ovacionadas. Mas, cumprir meu verdadeiro papel. Defender sem medo teses em defesa dos direitos das mulheres negras, sobre as desigualdades no mercado de trabalho, dentre outras pautas importantes.

Ajudar a construir estratégias que assegurassem ações para dar viabilidade na apresentação de propostas aos Governos, com objetivo de fazer com que o Estado brasileiro reconhecesse a existência do racismo, desigualdades sócio raciais, especificidades e assimetrias na saúde, a discriminação e preconceitos, genocídio por ações violentas e as reparações.  

Como foi difícil este período. As relações extremamente impertinente, independente de onde estávamos pisando. Ter que suportar todas as manifestações de discriminações e preconceitos existentes. 

A vontade de ver o mundo transformado com justiça e igualdades de oportunidades sempre foi meu ponto estruturante para manter firme e convicta da fala.

Ao anoitecer e entre as madrugadas, ao retornar ao aposento, olhar para meus filhos dormindo e ainda ter que pensar que precisaria formar uma barreira para que não percebessem o que eu estava passando para estar ali e com eles.

Nem tudo saia desapercebido. Minha filha, com 7 anos, perguntava-me: mãe, por que não vamos embora daqui? Este povo não gosta de mulher que tem filhos. A gente não tem roupa direito. Eles ficam olhando, riem e sussurram. 

Com os olhos cheios de lágrimas, eu passava a mão no rosto dela e respondia: — Um dia você vai entender e, se ainda precisar, fará o mesmo. Mas será de outra forma.   

Não tinha como não chorar muito, pensar em desistir. Fingir que estava tudo bem. Demostrar-se dura e ser franca para defender, além das pautas, a minha prole que sempre precisou me acompanhar.

Frases pejorativas: A casa dela não tem televisão!  Está nega, gosta de sexo! Está precisando arrumar trabalho!

Para além das “piadinhas” que doíam muito, sempre mantive meu foco em combater o que outras mulheres negras, como eu, sofriam na sociedade, com misógina, machismo, racismo, preconceitos. 

Violações que não permitiram o exercício da cidadania e limitavam a liberdade de ir e vir, de decisão, de autonomia sobre o corpo.  Violências política e de gênero.

Pensamentos subjetivos, nunca! Sempre coletivizados com outras mulheres que faziam o coro e solidarizavam às dificuldades impostas.

Uma agulha no palheiro dos grandes tecnocratas existentes. Uma voz somada a poucas que resistiam a todas as discriminações e preconceitos da casta burocrata que se alto titulavam de Capas Pretas. 

Eu e algumas pessoas éramos denominadas de pão com salame, reconhecidamente como o mal necessário para dizer que existia democracia. De fato, para todas as mulheres sempre existiu uma regra: manda quem pode e obedece quem teve juízo.

Sempre foi assim, e hoje é muito mais devido à dependência política, econômica e "este novo conceito de enfrentamento"(this new concept of coping) onde prevalece a subordinação, resiliência do bom modo de ser e do bem-saber protestar.

Na minha avaliação, quando falta indignação, sobra obediência. Como disse Martin Luther King Jr. “O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons.”

Eu sempre li muito. Escrevia muito pouco devido às críticas perversamente maldosas para me desestruturar e silenciar meu lugar de fala.

A LIBERDADE NUNCA É CONCEDIDA VOLUNTARIAMENTE PELO OPRESSOR; DEVE SER EXIGIDO PELOS OPRIMIDOS. Martin Luther ”

Por mais que eu tenha conquistado um pequeno lugar de posição dentro desta casta tecnocrata, existem invisibilidades com relação à história da minha representação e feitos para a sociedade. De fato, quando não negam a existência, ainda utilizam conceitos bairristas e diminutivos. Um apagamento proposital das minhas ações.   Se é político ou personalíssimo, não sei.

Nos meus 58 anos de sobrevivência, não sei responder quais são as justificativas para a necessidade prática de produzir a minha invisibilidade política e como militante e ativista negra.   

Um livro ou um pequeno trecho da minha história de vida não vão conseguir traduzir as mazelas e sequelas existentes.

Neste tempo em que vivo, vou me dar o direito de não colocar flores nos pedestais de quem se apropriou indevidamente de nossos conhecimentos e talento de sobreviver. 

Nem muito menos baterei palmas aos gestos individuais que só contribuem com o apagamento de várias outras mulheres negras que são protagonistas da história do Brasil.

A história da minha vida, o sonho por liberdade, somasse a realidade de milhares neste vasto País.

 A gente é criada para ser assim, mas temos que mudar. 

Precisamos ser criadas para a liberdade. 

O mundo é grande demais para não sermos quem a gente é."

Elza Soares – Cantora”

 

 Mônica Aguiar é negra e feminista, fez 58 anos. É blogueira. Residente e nascida em Belo Horizonte/MG, na região Distrito de Venda Nova, que tem 320 anos. Ativista independente à 43 anos é coordenadora geral do Centro de Referência da Cultura Negra de Venda Nova, entidade que fundou e  conquistou centenas de moradias para mulheres negras chefe de família em Belo Horizonte e no Vetor Norte.  É da Rede Nacional de Mulheres Negras Ciberativistas e da Rede de Saúde em Mulheres de Minas Gerais. Coordena o Projeto "Destaque Mulher Negra".  Mônica Aguiar, já fez parte das executivas de vários Conselhos de controle social na cidade de Belo Horizonte e de representação estadual, em Minas Gerais. Foi da Articulação nacional de Mulheres Negras brasileiras, Rede Nacional de Mulher e Mídia e Rede Feminista em Saúde.  

Esteve em vários movimentos de mulheres negras nacional. Foi sindicalista. Dirigente do Partido dos Trabalhadores , municipal, estadual e nacional. Foi Secretária Estadual de Combate ao Racismo.  Ajudou a Coordenar e organizar várias Marchas Nacional de mulheres negras e Zumbi dos Palmares. Mônica Aguiar foi a primeira mulher negra a participar da queima da Bandeira do Brasil no Dia da Bandeira. Foi propositora da criação da Delegacia especializada em crimes Raciais de Minas Gerais e da Coordenadoria estadual de Promoção da Igualdade Racial de Minas. Coordenou várias frentes de luta contra o racismo e em defesa das mulheres negras. Ajudou a criar várias Coordenadorias, conselhos municipais de Promoção da Igualdade Racial em Centena de Cidades de Minas Gerais .

Desde 2010 mantém este Blog Mulher Negra, com “notícias do Brasil e do mundo diariamente. Educação, ciências e tecnologia, cultura, arte, cinema, literaturas, economia, política, dentre outros. Construindo a visibilidade das mulheres negras em fatos reais no mundo”. 

segunda-feira, 3 de junho de 2024

Avanços sociais não chegam na ampla maioria dos lares chefiados por mulheres negras.

 Por Mônica Aguiar 

Foto:CERCUNVN
As Mulheres negras são 28,5% da população total e recebem 10,7% do total da renda do trabalho no Brasil. 
O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, faz menção a 'baixa longevidade' e 'menor possibilidade de estudo' para elas. 

Mesmo sendo o maior grupos da população no Brasil, mais de 60 milhões, 28,5% dos brasileiros, estão longe dos ganhos em desenvolvimento humano no país. 

Apenas 10,7% do total da renda recebida pela oferta de trabalho no país é destinado às mulheres negras.

As mulheres negras correspondem o maior percentagem de brasileiros em idade ativa: 48,3 milhões, ou 28,4% do total e formam grupo menos beneficiado por avanços sociais.

Estes dados fazem parte da Pesquisa realizada pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), divulgados em 28 de maio, Dia Internacional de Ação Pela Saúde da Mulher e Dia Nacional de Redução da Mortalidade Materna.

Revelam as violações por fatores externos que influenciam diretamente o cotidiano de vida de cada uma. Das esferas públicas à vida privada.

Conforme a Pesquisa: “Essa condição desfavorável também afeta seus dependentes, tornando-os suscetíveis a menor frequência escolar, menores anos de estudo e participação precoce no mercado de trabalho ou, ainda, ao trabalho infantil”.

Em idade ativa, enfrentam as piores formas de inserção, remuneração e qualidade de postos de trabalho. 

Dessa forma, formam um grande grupo, cuja maioria tem uma renda mensal inferior, complementada por programas sociais assistenciais.

A falta de acesso aos programas de saúde sexual e reprodutiva é confirmada com os números de filhos existentes nestes lares. O grau de responsabilidade no sustento e cuidado com a família é um dos fatores que afastam as mulheres negras da escola e têm como alternativa o subemprego.

Vitimismo ou realidade condicionada? Mesmo sendo a maioria que acessa o Bolsa Família, nestes lares predominam algum tipo de insegurança alimentar.

Pretas e pardas dedicam mais tempo às tarefas domésticas, têm menos participação no mercado de trabalho e são nomes contados nos dedos que ocupam cargos de poder ou de  decisões.

Qual o papel do Estado em reparar os danos provocados por mazelas da escravidão?

Qual é a responsabilidade que uma mulher negra tem, para diminuir as desigualdades buscando trabalho em uma sociedade onde a maioria das pessoas faz a escolha para ocupações de cargos utilizando dos mesmos valores morais e raciais existentes no período escravagista, definindo quem entra, permanece, avança, sai ou tem ganho salarial devido? 

As mulheres brancas tem mais facilidade de conseguir se emancipar da tarefa de cuidado. As mulheres negras estão cada vez mais atarefadas e expostas a todos os níveis de violência.

O que compete aos Governos? Será mandar “fechar a porteira”? O que significa fechar a porteira? 

Quando analisamos as sequelas de um dos maiores crimes contra a humanidade já cometidos, a escravidão, compreende-se que o Estado brasileiro ainda não fez nada para promover as reparações.

Qual resposta o Estado poderá oferecer aos séculos de injustiças provocados pela existência a da segregação racial?

As ações afirmativas efetivas são fundamentais para garantir a eliminação dos obstáculos raciais existentes nos aparelhos do Estado e nas estruturas governamental.

Fontes: PNDU/G1/ IBGE


sexta-feira, 17 de maio de 2024

Saberes e as práticas das Parteiras Tradicionais são reconhecidos como Patrimônio Cultural do Brasil

Por Mônica Aguiar  

*O dia das Parteiras é dia 20 de janeiro. Mas, foi no dia 09 de maio de 2024, que o conselho consultivo do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) reconheceu o Ofício do Saberes e Práticas das Parteiras Tradicionais do Brasil como Patrimônio Cultural do País.

Os saberes e práticas das Parteiras Tradicionais do Brasil são uma realidade centenária presente em todo o território nacional.

O Ministério da Saúde também adota o nome Parteiras Tradicionais “por considerar que este termo valoriza os saberes e práticas tradicionais e caracteriza a formação e todo o conhecimento sobre o parto que a mulher parteira detém, além de respeitar suas especificidades étnicas e culturais”. 

As mulheres parteiras, em sua maioria, carregam as tradições das religiões de matriz africana e todas detém conhecimentos de boas práticas no parto que são transmitidas através da oralidade.

Não abrem mão dos princípios que regem sua ancestralidade, saberes milenares. Mesmo nas suas mãos, respeitam as características existentes em cada uma mulher.

Durante o parto, passam orientações específicas de posições para alívio de dor, sem interferir na autonomia da mulher. Ajudam a compreender que aquele momento e o corpo são dela, por ser ela quem está parindo.

O toque das mãos, a forma de acolhimento, as estratégias de cuidados, as ervas, o banho, o canto, tudo para garantir tranquilidade à parturiente e dar boas-vindas à criança que também passa ser reconhecida como sua.

Assim, ajudaram a vir ao mundo milhões de pessoas neste vasto e diferente Brasil.

Não existem dificuldades que a impeçam de atender o chamado, mesmo diante das dificuldades de acesso aos lugares onde residem as parturientes ou com relação às complicações que podem ocorrer durante o parto.

O parto é um ritual. 

O sagrado feminino.

Como bem descreve o dossiê produzido por pesquisadores do IPHAN e da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em 2021, para instrução do processo de registro do bem como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil:

Mestras do ofício do partejar, detentoras de um repertório de saberes e práticas acerca de todas as etapas da gestação (pré-natal, parto e pós-parto)”. Limitar seu papel à assistência no nascimento de crianças”.


AS CONTRADIÇÕES NO BRASIL

Nas grandes capitais e na maioria das cidades de médio porte, os partos ocorrem em ambiente hospitalar, com interversões traumáticas e desnecessárias. Devido às formas como são conduzidos, impedem a autonomia da mulher sobre seu corpo.  São milhões de cesárias desnecessárias e um enorme número de mortes maternas evitáveis. 

Apesar de o parto hospitalar ser a única alternativa em diversos municípios, várias organizações de mulheres atuam em defesa do parto e nascimento humanizado. Defendem a humanização do parto a partir do ofício, conhecimento cultural e da biodiversidade das Parteiras Tradicionais como elementos respeitáveis que podem contribuir significativamente para a produção de saúde, aprimorando os conhecimentos acadêmicos e tecnológicos e ser praticados nos Centros de Partos Normais(CPNs). 

Estas mulheres, ativistas, militantes, feministas ou não,  que lutam pelo direito de escolha da mulher, buscam regulamentação e visibilidade para que as experiências e conhecimento das Parteiras Tradicionais sejam articulados com a ciência e se consolidem como prática do bom parto por ser uma alternativa segura e natural. Existem evidências comprovatórias de vários fatores positivos que conferem viabilidade a esta prática do parto humanizado natural para ser universal no SUS.

NO BRASIL GERAL

O parto e o nascimento domiciliar assistidos por parteiras tradicionais estão presentes no País, principalmente nas regiões com áreas rurais, ribeirinhas, de floresta, em grupos populacionais: quilombolas e indígenas. Em 2001, estimava-se existirem no Brasil cerca de 60 mil parteiras.

O parto domiciliar assistido por parteiras tradicionais ocorre em situação de exclusão e isolamento, desarticulado do SUS. A grande maioria das parteiras não recebe nenhuma capacitação e não são remuneradas pelo seu trabalho.

*A data comemorativa foi incluída no calendário nacional por meio da Lei n.º 13.100/2015, como “Dia da Parteira Tradicional”. O dia 20 é o dia de aniversário da parteira tradicional mais antiga de Macapá, Juliana Magave de Souza, nascida em 1908 e que teria realizado cerca de 400 partos.

O reconhecimento dos saberes e práticas das Parteiras Tradicionais do Brasil como Patrimônio Cultural do País foi realizado na  104ª Reunião do Conselho Consultivo do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e será inscrito no Livro de Registro dos Saberes.

Fontes:  IPHAN / Biblioteca Virtual da Saúde MS/ Portal Catarinas/ REHUNA /

Fotos: Grupo Curumim / Governo Federal

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