segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

O SUS, SAÚDE SEXUAL E SAÚDE REPRODUTIVA DAS MULHERES

 Por Mônica Aguiar 

O SUS sempre contou com a contribuição dos movimentos de mulheres feministas para se concretizar.

Do ano que o Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM) foi criado  até o presente momento, são as mulheres que se destacam ao colocar o dedo na ferida dos paradigmas preconceituosos e discriminatórios, chamando a atenção da sociedade para a importância de restabelecer corretamente os conceitos científicos  e não os moralistas que interferem diretamente na vida sexual e reprodutiva das mulheres. 

Dentro de todos as aspectos e consequências, destaco os que causam impactos direto na vida das mulheres e da sociedade: inúmeras esterilizações de mulheres sem conhecimento e autonomia para o  consentimento devido principalmente entre as mulheres negras; colocação  de chip anticoncepcional, laqueaduras e ligaduras de trompas em grande escala em mulheres negras classificadas em situação de vulnerabilidade; altos números de mortes maternas;  violências obstétricas; não interrupção legal da gravidez; indicação desnecessárias de cesárias e as assimetrias raciais.

É necessário o reconhecimento que a mulher é cidadã com direitos e somos muito mais, que um objeto com função reprodutiva. Porém, é justamente na vida reprodutiva e sexual que o estado promove interferência direta não permitindo que as mulheres sejam donas de seus corpos e decisões.

“As divisões raciais geram uma desigualdade de alocação ou acesso à estrutura de classes e esta, por sua vez, condiciona os padrões de saúde e doença da população. Na condição de variável antecedente, raça pode ser pensada como tendo um papel "pré-fundamental" na constituição da desigualdade socioeconômica de saúde”. (Publicação de José Alcides Figueiredo Santos, 2011, Desigualdade racial de saúde e contexto de classe no Brasil ).

Quando medirmos as especificidades considerando fatores sociais, territoriais, perceberemos que ainda falta muito para avançar nas propostas de saúde das mulheres negras nas políticas e programas de saúde.

Vamos cuidar do útero, mas vamos, além disso”, exclama Jurema Werneck, ex-vice-presidente do Conselho Nacional de Saúde, fundadora e foi  coordenadora da ONG Criola, hoje representa o Brasil na Anistia Internacional. (PenseSUS 2014) .

Além das questões relativas ao aborto e maternidade, os movimentos de mulheres defendem que as políticas de saúde devem passar pela defesa da integralidade na percepção dos condicionantes de saúde considerando as distintas características raciais, territoriais, culturais, sociais, religiosas e econômicas.

No artigo publicado pela COFEN em 2020,“Como o movimento de mulheres contribuiu para construção do SUS”, encontro as seguintes afirmações:

Ainda não tinha um conceito de gênero bem desenvolvido, mas sob essa influência feminista, nos vocaliza, por meio dessa política, uma forma de a saúde tratar a mulher para além da função reprodutiva. A ideia de integralidade – um dos pilares do SUS com a universalidade e a participação social — nasce no PAISM. É a primeira vez que falamos de integralidade. Somos nós mulheres que dizemos ‘não queremos ser atendidas de forma fragmentada’. Queremos ser atendidas como sujeitos complexos, que reproduzimos, trabalhamos, sofremos doença crônicas, temos questões de saúde mental.  Somos muito mais do que parir. Somos violentadas, assassinadas. Somos lésbicas, hétero. Somo múltiplas e complexas.

Outra questão que as violações dos direitos reprodutivos das mulheres tem provocado aumento significativo de mortes maternas, tornando um grave problema de saúde pública no Brasil.

Para Clarissa Carvalho, do Movimento pela Humanização do Parto e do Nascimento, a violência obstétrica  é a maior forma de discriminar uma mulher nos serviços de saúde, sejam eles públicos ou privados. “De forma bem ampla, podemos falar em procedimentos que são rotina nos hospitais e que são ou ineficazes ou pouco eficazes, mas que causam dor, desconforto ou constrangimento. Uso indiscriminado da versão sintética da ocitocina (hormônio que estimula as contrações uterinas), proibição de comer e beber durante o trabalho de parto, realização de episiotomia (corte cirúrgico da região do períneo para ampliar o canal de parto) de rotina, exames de toques constantes, são alguns exemplos de práticas abusivas e sem respaldo científico que costumam ser feitas em parturientes sem sequer pedir consentimento.”(Pense SUS 2014)

As diretrizes e prioridades estabelecidas pela Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher, não tem sido cumpridas em dezenas de municípios, principalmente nas Capitais do Brasil. 

Muitos Programas, assistências e instrumentos diretamente ligados a saúde das mulheres, que dispunha fazer a  transversalização dentro do SUS, com  demais politicas públicas, foram extintos.

A falta de interesse e resistência com os direitos sexuais e direitos reprodutivos estão demostrados nas ações de Gestores que:- negam dentro da saúde pública a existência do racismo, do machismo, das múltiplas formas de violências; com a destruição de equipamento público como ocorreu em Belo Horizonte com a Maternidade Leonina Leonor Ribeiro;  diminuição de leitos em hospitais gerais com maternidade; falta de testagem de gestantes para o HIV e sífilis; não oferta de atendimento odontológicos; aumento de mortes maternas e de violência obstétrica; descaso no atendimento; diminuição de profissionais na atenção primaria (pré-natal); dificuldades encontradas para se vacinar no período de COVID e dentre tantas violências que comprovam o não reconhecimento dos direitos humanos das mulheres e meninas como fundamentais.

 “Nascer e morrer são verbos dolorosos para mulheres negras”. Entre o nascimento e a morte, porém, as mulheres negras enfrentam ainda uma série de outras violações que vão da infância à vida adulta e permeiam todas as esferas que se possa imaginar( Fabiola Ferraz,2017)

O Brasil firmou compromisso de diminuir os números de mortes maternas até 2030, nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. Assim se faz necessário que o Brasil mude seu conceito organizacional. Que busque a adoção de boas práticas que combata o racismo  estrutural existente. 

É preciso pactuar e repactuar entre interfederativos medidas que garantam o  compromisso do país com as multiplicidades culturais, econômicas e composições populacional existente dentro de cada território, enfrentando todos os atos racistas, preconceituosos e discriminatórios.

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