Por Mônica Aguiar
Centenas de mulheres negras tem se despontado na política,
nas organizações sociais, como dirigentes, produtoras da arte, economia e
trabalho. Mas qual é o esforço feito por
uma mulher negra para conseguir subir, como é dito popularmente, “os degraus da
vida”? E quando chega ao topo, como se
estabelecem ou restabelecem as relações?
Em um artigo na página do Geledés: “Mulheres Negras e o Poder: Nós
também podemos”, de Luana Soares, em seu belo texto, encontrei a seguinte afirmação ao falar das
desigualdades sócio econômicas existentes:
“É preciso
compreendermos que estas desigualdades não caminham sozinhas, mas se intercalam
gerando opressões específicas, que são vivenciadas por grupos sociais
diferentes. Portanto, alguém estará na base da pirâmide social, e quem ocupa
esta base são as mulheres negras”.
Em um outro belo artigo
“Eu, mulher negra, não sou sujeito universal!”, escrito por LÍVIA SANT’ANNA VAZ, no Jota, encontrei
a seguinte reflexão:
“Numa sociedade estruturada pelo racismo patriarcal, raça e gênero são
dois dos principais marcos imediatos de identificação – mas também de
subalternização social – de uma pessoa. A forma como as opressões do racismo e
do sexismo se interseccionam para produzir vulnerabilidades específicas contra
mulheres negras nos remete à frase de Grada Kilomba : “Uma mulher negra diz que
ela é uma mulher negra. Uma mulher branca diz que ela é uma mulher. Um homem
branco diz que é uma pessoa.”
“... Sob a roupagem da ética
da alteridade, essa relação de dominação persiste na produção e no
discurso jurídicos para definir unilateralmente “o lugar do outro no Direito”[2]. Na realidade,
essa suposta prática da alteridade revela relações de poder, nas quais o “eu” –
ser central e universal, cuja posição de privilégio é garantida – detém a
autoridade para outrificar o
diferente – ser periférico e desviante –, delimitando o seu lugar no Direito ...” https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/eu-mulher-negra-nao-sou-sujeito-universal-12082020
Ao longo de minha vida (militância
negra), tenho vivenciado e observado relatos dos mais variados obstáculos sofridos
por mulheres negras. Surgem nos mais variados espaços, principalmente quando estamos
carregando juntas bandeiras das chamadas agendas universais e, decidimos pautar
com propósito, modificar as vidas das mulheres negras promovendo igualdade,
acesso e oportunidades, nos postando como lideranças, reafirmando nosso protagonismos
histórico, dotadas de capacidade de
produzir e pensar.
Para a minoria branca “O lugar do outro por
direito”. Para eu Mulher Negra, maioria
da população brasileira, sempre por grandes méritos “superacadêmico” e muitas disputas.
Tendo que debater e provar tudo o tempo todo.
“- Ai que vontade de viver como um Ser
dotados de direitos!”
A minha capacidade de pensar,
elaborar e reconstruir estratégias políticas que se diferenciam das relações tradicionalmente
constituídas e que carregam concepções eurocêntricas e alimentam as diferenças de
classe e o racismo. Estar e ocupar um lugar por ser uma cidadã livre, e que
minha presença não constitua reações das mais adversas:- quando a minha boca
preta abrir para falar seja respeitada, minha postura política que carrega minha
identidade e ancestralidade não mais incomode e o meu tempo passe de fato a
existir.
“Se é apenas como sujeitos (de direito) que podemos falar, é chegada a
hora de erguermos nossas vozes, para estabelecermos nossa própria identidade,
definirmos nosso próprio lugar no Direito, narrarmos nossas próprias histórias.
Não como outridades do
universal, mas como partes de uma humanidade pluriversal que valoriza os
saberes das nossas ancestrais e emerge da conjunção do ontem, do hoje e do
porvir, reunindo (re)existência e esperança. (“Eu, mulher negra, não sou
sujeito universal!” , de LÍVIA SANT’ANNA VAZ, no Jota)”
Um pequeno surto com várias vozes brancas,
fez-me refletir e buscar como lidar com este alvoroço imaginário, egocêntrico e
eurocêntrico da subjugação e desvalorização do espaço que não somente Eu, mas
nós mulheres negras, devemos ocupar!
Diante deste vasto universo sem ser
universal, dores se somam e relatos traduzem milhares de vozes negras cotidianamente
oprimidas. Vozes silenciadas e estrategicamente caladas.
Um belíssimo artigo da nossa queridíssima Suely Carneiro “ENEGRECER
O FEMINISMO: A SITUAÇÃO DA MULHER NEGRA NA AMÉRICA LATINA A PARTIR DE UMA
PERSPECTIVA DE GÊNERO”, entre as linhas escritas, parte de sua conclusão:
“... A origem branca e ocidental do feminismo estabeleceu sua hegemonia
na equação das diferenças de gênero e tem determinado que as mulheres não
brancas e pobres, de todas as partes do mundo, lutem para integrar em seu
ideário as especificidades raciais, étnicas, culturais, religiosas e de classe
social. Até onde as mulheres brancas avançaram nessas questões? As alternativas
de esquerda, de direita e de centro se constroem a partir desses paradigmas
instituídos pelo feminismo que, segundo Lélia Gonzalez, apresentam dois tipos
de dificuldades para as mulheres negras: por um lado, a inclinação
eurocentrista do feminismo brasileiro constitui um eixo articulador a mais da
democracia racial e do ideal de branqueamento, ao omitir o caráter central da
questão da raça nas hierarquias de gênero e ao universalizar os valores de uma
cultura particular (a ocidental) para o conjunto das mulheres, sem mediá-los na
base da interação entre brancos e não brancos; por outro lado, revela um
distanciamento da realidade vivida pela mulher negra ao negar “toda uma
história feita de resistência e de lutas, em que essa mulher tem sido protagonista
graças à dinâmica de uma memória cultural ancestral (que nada tem a ver com o
eurocentrismo desse tipo de feminismo)” . Nesse contexto, quais seriam os novos
conteúdos que as mulheres negras poderiam aportar à cena política para além do
“toque de cor” nas propostas de gênero? ...”.
Poderia manifestar como gostariam que Eu fosse: uma mulher boazinha, queridíssima que apenas balançasse a cabeça. Em nome da boa convivência humanitária, aceitar obedientemente a ideia das relações contemporâneas de igualdade ou sororidade a partir do que circulam e proporcionam milhares de curtidas em frases prontas e lives nas redes sociais.
Eu Mulher Negra tenho que falar do proposito
direto das práticas do racismo quando utilizam elementos da inferioridade,
pejorativos, da pobreza, desintelectualização e até mesmo de frases prontas para
menosprezar, silenciar e despontencializar nós mulheres negras.
Enfim.... Manteremos na luta por uma sociedade onde
mulheres e homens brancos entendam e respeite as diferenças existentes e, que realmente
juntas, tenhamos condições de constituir uma sociedade sem apropriação cultural,
intelectual, menosprezo pela cor, posturas políticas e social da periferia.
Chega de ter quer chutar portas
para abrir! Chega de pedir licença para falar! Chega de olhares baixos e silêncio
ao produzir e conduzir! Chega de invisibilidade!
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