segunda-feira, 23 de junho de 2025

Autodeclaração ou apropriação? Respeite a identidade, organização e história das mulheres negras.

 
Pôr Mônica Aguiar  

Muitas pessoas que se identificam como brancas e depois se alto declaram negras podem ter ascendência africana ou indígena, mas suas características físicas, como tom de pele ou textura do cabelo, podem não refletir isso de maneira evidente. 

É importante reconhecer que a identidade racial não se limita somente ao fenótipo, mas também envolve aspectos culturais, históricos e pessoais. 
Como uma pessoa escolhe se identificar é um fenômeno complexo que na maioria das vezes é influenciado por uma variedade de fatores, incluindo o contexto social, político e cultural em que está inserida ou pretende se inserir.

Vários fatores podem moldar e até mesmo transformar a identidade de alguem, se, considerarmos o momento e como se coloca com as repercussões momentâneas.

No entanto, é importante saber que “apropriação” de uma identidade pode também ser o ato de adotar elementos de uma cultura por pessoas de outra cultura, muitas vezes sem compreender ou respeitar o contexto original, o que pode ser problemático.  

Em última análise, a identidade é uma escolha pessoal, mas é essencial promover o respeito e a compreensão das diversas experiências e identidades raciais.

A apropriação, quando se refere a elementos raciais, é complexa e frequentemente controverso.

É inadmissível naturalizar as atitudes de pessoas, que estão ligadas cultural e historicamente ao grupo racial dominante, que passam, em um passo de mágica, a adotar aspectos da população negra, especificamente das mulheres negras.

Isso se torna particularmente problemático quando essas práticas são tratadas como uma moda passageira, respostas e justificativas entre uma discussão ou moeda de troca, desconsiderando o contexto histórico e social de onde se originaram.  

E, quando essa apropriação é criticada, muitas vezes se revela o racismo subjacente, especialmente quando os elementos culturais são tratados como objetos descartáveis ou exóticos.

O debate se torna ainda mais caloroso quando se questiona quem tem o direito de decidir o que é apropriado ou não, exigindo uma reflexão cuidadosa sobre respeito, empatia e reconhecimento das injustiças históricas associadas. 

Uma justificativa que tenho observado e que está se tornando comum é que a adoção de tais elementos é uma forma de opinião, mas isso frequentemente ignora o poder e o privilégio inerentes nas dinâmicas raciais. 

A desmistificação do discurso da democracia racial no Brasil é essencial para compreender as estruturas de desigualdade racial que ainda persistem na sociedade.

A apropriação carrega veladamente a ideia de que o Brasil é uma democracia racial, sugere não haver discriminação racial significativa e que todas as raças convivem harmoniosamente. 

No entanto, essa narrativa mascara as profundas desigualdades e o racismo que afetam, desproporcionalmente, as populações negras, especialmente as mulheres negras. 

As tipificações pejorativas contra as mulheres negras são manifestações desse racismo, perpetuando estigmas e estereótipos que as desumanizam, relações, é opressor e provocam o silenciamento das mulheres negras.

Essas apropriações limitam as oportunidades de ascensão social e econômica e reforçam a discriminação em diversas esferas, como no mercado de trabalho, na educação, bem como a representatividade das mulheres negras em espaços de poder.

As mulheres negras,  que são militantes históricas e ativistas no combate ao racismo enfrentam um desafio constante de resistência e resiliência. 

Elas frequentemente se deparam com afirmações que tentam desqualificar suas experiências e lutas, tornando profundamente exaustivo colocar tais questões na mesa.

Isto é desqualificação. E vem disfarçada de críticas ou questionamentos aparentemente inofensivos, mas que, na verdade, têm a intenção de minar a legitimidade de nossas denúncias e conquistas.

Atualmente, o cansaço não é somente físico, mas também emocional e psicológico, pois lutar contra o racismo é uma batalha contínua que exige força e uma determinação imensa.

Afirmar que o debate sobre racismo, este tipo de apropriação provoca desgaste, é outro argumento perverso que, de fato, minimiza a importância crucial dessa discussão na sociedade contemporânea.

O racismo é uma questão estrutural que afeta profundamente a vida de milhões de pessoas ao redor do mundo, e ignorar ou diminuir a relevância de seu debate é perpetuar a desigualdade e a injustiça.

A questão da identidade racial é complexa e envolve uma compreensão profunda das experiências pessoais, sociais e culturais.

A identidade racial não pode ser simplesmente adotada ou descartada de forma instantânea.

Para muitas pessoas, reconhecer-se como parte de um grupo racial específico é um processo que pode ser profundamente influenciado por fatores como história familiar, aparência física, cultura, e experiências vividas.

No caso de alguém que nunca se viu como negro ou não é reconhecido socialmente como negro, tornar-se parte desse grupo envolve mais do que uma simples decisão pessoal; requer o reconhecimento e a validação da vivência e das experiências compartilhadas por aqueles que se identificam como negros.

Além disso, é importante lembrar que a identidade racial está enraizada em questões sociais e históricas, e a apropriação de uma identidade sem vivenciar suas realidades pode ser vista como desrespeitosa ou insensível.

 Assim, é essencial abordar essa questão com sensibilidade, responsabilidade e respeito, considerando as nuances e a profundidade que envolvem a identidade racial.

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