quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Primeira Deputada Negra do Brasil : Antonieta de Barros, Uma história que Precisa ser Divulgada !


Em  1934 . 50 anos que

 a escravidão havia

 sido abolida.

Antonieta era menina pequena quando andava pela pensão da mãe tentando aprender as letras. Espiando os hóspedes-estudantes, de pouco em pouco se alfabetizou junto à irmã Leonor. Nem imaginava que seria por meio das letras que a professora Antonieta de Barros entraria para a história como a primeira deputada negra do Brasil. O ano era 1934 e não fazia nem 50 anos que a escravidão havia sido abolida.

Pouca gente conhece a história de Antonieta ou mesmo sabe quem foi ela. Em Florianópolis, capital do estado de Santa Catarina, no Sul do país, ela aparece em nome de rua, escola, túnel e tem até um memorial. Ainda assim, como acontece com nomes perdidos em placas, para muitos é só sinônimo de um endereço qualquer — algo que a cineasta Flávia Person decidiu mudar.
Natural de São Paulo, Flávia viveu sete anos em Florianópolis. Descobriu Antonieta enquanto pesquisava a história  dos negros de Santa Catarina, o estado brasileiro com menor índice dessa população: apenas 15% dos catarinenses se declara preto ou pardo. Nas eleições de 2014, foi o único estado que não elegeu nenhum negro. Ainda assim, 82 anos antes, foi ali que uma mulher negra assumiu pela primeira vez um mandato pelo voto popular no Brasil.
Flávia ficou fascinada, como conta ao Global Voices:
Fazer um filme sobre a Antonieta me pareceu urgente. Depois que descobri que ela foi professora, diretora do instituto de educação, cronista dos jornais mais importantes do estado, a primeira mulher a ser eleita deputada em SC e primeira negra no Brasil, e mesmo assim, nem os nativos de Florianópolis conhecem bem a história dela, pensei que era o momento de fazer um filme e propagar a história dela para o máximo de pessoas possível.
Seu documentário curta-metragem estreou em outubro, após de um ano de pesquisa. Para realizar “Antonieta”, Flávia buscou dissertações e teses e vasculhou arquivos públicos da cidade, mas foi salva graças ao acervo pessoal, com imagens inéditas, de um familiar da personagem.
Imagem do documentário Antonieta (2015) | Foto: Reproduzida com autorização Magnólia Produções
A mãe de Antonieta, escrava liberta, enviuvou cedo e criou sozinha as filhas graças ao trabalho como lavadeira. Catarina sempre considerou a educação a herança mais cara que deixaria para as meninas. Acabou formando duas professoras. Aos 21 anos, Antonieta já havia fundado a sua própria escola, o “Curso Particular Antonieta de Barros”, onde se dedicava a alfabetizar adultos da população carente. Para ela, “o analfabetismo era o que impedia ‘gente de ser gente’”. Flávia completa:

Antonieta fez da educação sua luta de vida. Ela acreditava na educação como único caminho possível para a emancipação feminina e dos pobres. Ela sempre defendeu a educação para todos, independente de raça, credo ou sexo.
A escrita foi outra forma encontrada por ela de abrir caminho. Sob o pseudônimo Maria da Ilha, Antonieta passou a usar o jornalismo para defender os direitos civis das mulheres — isto em uma época em que quase ninguém fazia isso no Brasil, especialmente fora do eixo Rio de Janeiro-São Paulo, como nota a jornalista Ângela Bastos em um perfil da deputada escrito em 2013:
A sensibilidade de Maria da Ilha derramava-se em textos variados sobre educação, civilidade, religiosidade, virtudes morais, éticas e cívicas. Abordava também questões relacionadas às relações de gênero e à vida política e social dos anos 30, no Brasil e no mundo.
As mulheres brasileiras só conquistaram o direito ao voto em 1932. Dois anos depois, a professora Antonieta, que já havia ocupado cargos de direção e discutia de igual para igual com intelectuais e políticos, se tornava uma das primeira mulheres eleitas a um cargo legislativo — naquele mesmo ano, a médica Carlota Pereira de Queiroz, que era branca, foi eleita deputada federal.
Antonieta sabia que a marginalização das mulheres no meio político “não representava um fato natural”, mas também sabia que ela não era exclusividade da política. Como conta Flávia:
A Antonieta sempre teve um viés político. Logo que se formou, ela fez parte da Liga do Magistério, entidade que defendia os direitos das professoras. Eu descobri que, até meados da década de 30, as professoras do ensino público eram proibidas de contratar casamento, havia uma lei que impedia. A justificativa era que as crianças poderiam fazer indagações indevidas sobre a sexualidade das professoras.
Antonieta chegou à política com a ajuda de Nereu Ramos, do Partido Liberal Catarinense, que se tornaria o 20º presidente do Brasil. A mãe dela havia trabalhado na casa do pai dele, o também político Vidal Ramos, e tinha boas relações com a família. A cineasta diz:
Antonieta posa junto a um grupo de colegas políticos e intelectuais de sua época | Foto: Reproduzida com autorização Magnólia Produções
Antonieta posa junto a um grupo de colegas políticos
 e intelectuais de sua época (Foto: Reproduzida com autorização
Magnólia Produções/Tratamento Yannet Briggiler)
O partido, sentindo a mudança de pensamento da década de 30 e querendo imprimir uma ideia moderna, viu na Antonieta, já muito respeitada pela elite por causa de seu trabalho na educação, uma oportunidade. Com certeza, ela deve ter enfrentado preconceito tanto pela cor quanto pelo gênero. Na década de 30, ainda havia discussões sobre a pré-disposição biológica da mulher que a impediria de assumir cargos públicos. Na época, apenas o trabalho de professora e outros relacionados à vida doméstica eram aceitos socialmente.
A escola criada por Antonieta seguiu funcionando por quase dez anos após a sua morte. As discussões iniciadas por ela dentro do parlamento, no entanto, ainda seguem. Para Flávia Person, ela é a prova de que a história esquece as mulheres, mesmo quando elas são protagonistas.
O nome da primeira deputada negra segue vivo de outras maneiras. Em Santa Catarina, um grupo de professoras negras se articulou para debater educação, igualdade e políticas públicas com o nome de “Outras Antonietas”. Este ano, a Secretaria de Promoção de Políticas de Igualdade Racial da Presidência da República (SEPPIR) lançou o prêmio Antonieta de Barros para jovens comunicadores negros e negras de destaque.
Ao ser perguntada o que Antonieta acharia do Brasil de hoje, onde governadores lutam contra estudantes que pedem mais escolas, mulheres ainda são minoria dentro da política e têm seus direitos ameaçados na Câmara dos Deputados, mas onde há também o florescimento da discussão de gênero, Flávia responde:
Certamente ela também estaria gritando “Fora Cunha”.
Fonte: Globalvoices

terça-feira, 15 de dezembro de 2015

A CANTORA DO MILÊNIO É MULHER, NEGRA, BRASILEIRA E FEMINISTA: ELZA SOARES

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Considerada “a melhor cantora do milênio” pela BBC, descrita como “uma mistura explosiva de Tina Turner e Celia Cruz” pela Time Out, e conhecida no mundo todo como A Rainha do Samba. Nascida na favela da Moça Bonita, passava a infância “rodando pião e brigando com os meninos”. Casou pela primeira vez aos 12 anos, teve seu primeiro filho aos 13, ficou viúva aos 21, e se tornou sensação internacional aos 30. Elza Soares não é apenas um ícone como artista, é também um ícone como pessoa, e um exemplo de superação. A vida não deu trégua pra essa mulher: teve que ser forte pra lidar com inúmeras dificuldades, e ainda assim, nunca deixou de subir no palco com um belo sorriso no rosto e contagiar a plateia com a alegria do samba.
Foi chamada de “vadia” pelo país, ao se envolver com o jogador de futebol Garrincha, que largou a esposa pra se casar com Elza. Era xingada de “bruxa” pelos amigos do marido, que não gostavam dela por proibi-lo de sair pra beber, tentando protegê-lo de seu alcoolismo. Em 1969, Garrincha dirigia bêbado, com Elza, sua filha Sara, e a mãe de Elza, Rosária Maria Gomes, no carro. Sofreram um acidente, e Dona Rosária faleceu. Mas a morte não era uma estranha pra Elza: a moça já havia perdido um marido e dois filhos, e, mais tarde, viria a perder outros três. Também sofreu com a morte do próprio Garrincha, que faleceu após um ano de divórcio, quando Elza ainda sentia muito carinho pelo ex-marido.
Nada é doce e suave quando se trata de Elza Soares. Desde sua expressão dura, emoldurada por seu afro volumoso coroado com flores ou um turbante, até sua voz metálica, suas feições felinas, seu sorriso largo e rasgado, sobrancelhas desenhadas altas e arqueadas, e sua eloquência curta e grossa, aquilo que Elza transmite mais que tudo é força. Hoje, tem 60 anos de carreira musical. Seu samba alegrou e inspirou três gerações, e continuará a alegrar e inspirar as próximas. Elza Soares é um clássico, e não apenas um daqueles clássicos antigos, tipo aquela galera que fez músicas geniais e se aposentam, ficando presas no passado. Ela é um clássico que provou que enquanto estiver viva vai continuar se adaptando às novas gerações e aos novos mundos, sempre dando um jeitinho de adaptar seu talento.
Em Outubro, surpreendeu os fãs, já acostumados a ouvir sua voz entre os batuques e aranhas do samba de raiz e da bossa tradicional, ao lançar um álbum, sem muito estardalhaço ou promoção prévia. Sim, Dona Elza fez a linha Beyoncé e surpreendeu os fãs com um álbum quando ninguém esperava, e como se não bastasse: o primeiro álbum inteiramente composto de músicas inéditas, depois de sua longa discografia recheada de interpretações de músicas muito bem conhecidas pelo Brasil. A princípio, é difícil de acreditar que uma senhora de 78 anos tenha lançado onze faixas tão contemporâneas, e tão relevantes em 2015. Os principais temas do “A Mulher do Fim do Mundo” é a violência contra a mulher, negritude, morte, e sexo.
Abrindo o álbum, a belíssima faixa “Coração do Mar” é um poema de Oswald de Andrade cantado acapella, um ode a uma terra imaginária, “terra que ninguém conhece”. “É um navio humano / Quente e negreiro / Do mangue”. Conforme a voz de Elza desaparece, surge um quarteto de cordas anunciando a próxima faixa, e talvez a mais bela do álbum, que rendeu seu título: “A Mulher do Fim do Mundo”. Em contraponto às cordas, aparece a percussão típica do samba, acompanhada da voz ríspida de Elza: “Meu choro não é nada além de Carnaval / É lágrima de samba na ponta dos pés”.
“Na chuva de confetes deixo a minha dor
Na avenida deixei lá
A pele preta e a minha voz
Na avenida deixei lá
A minha fala, minha opinião
A minha casa, minha solidão
Joguei do alto do terceiro andar
Quebrei a cara e me livrei do resto dessa vida
Na avenida, dura até o fim
Mulher do fim do mundo
Eu sou – e vou – até o fim cantar”
Eu fico arrepiada só de lembrar dessa música. É incrível como o trabalho de Elza pode soar tão familiar, tão tradicional, tão samba, e ainda assim, tão diferente e inovador. Sua voz nesse álbum, suja, pesada, carrega seus 60 anos de carreira, bem como seus 78 anos de dor – desde sua infância difícil até a recente morte de seu quinto filho. E ainda assim, Elza se mostra mais empoderada do que nunca, o que fica bem claro na terceira faixa do álbum: “Maria da Vila Matilde – Porque Se a da Penha é Brava, Imagine a da Vila Matilde”, faixa que mistura um samba sujo com rock.
“Cadê meu celular? Eu vou ligar pro 180
Vou entregar teu nome e explicar meu endereço
Aqui você não entra mais, eu digo que não te conheço

Cê vai se arrepender de levantar a mão pra mim”
Empoderamento de encher os olhos d’água, né? O melhor é o deboche que permeia essa faixa – Elza diz que quando o servidor público chegar ela oferece um cafezinho e mostra o roxo no seu braço, e que quando a mãe do agressor ligar, ”Eu capricho no esculacho / Digo que é mimado, que é cheio de dengo / Mal acostumado, tem nada no quengo”. Em entrevista, disse “Amor com pancada não existe. Mulher só deve gritar quando for de prazer”. E como coisa do destino, esse álbum foi lançado três semanas antes da prova do ENEM, cuja redação era justamente sobre a violência contra a mulher. Não é à toa que eu digo que a Elza é um clássico que continua relevante.
Seguem duas faixas agressivas e pós-apocalípticas: “Luz Vermelha” e “Pra Fuder”. A primeira é a descrição de um Rio de Janeiro após o fim do mundo, por onde Elza vaga, sobrevivente. A segunda é sobre uma experiência sexual em que Elza se sente como uma espécie de entidade nativa do fogo. Em entrevista para O Globo, Elza explica: “A mulher do fim do mundo é a que vai ficar. O fim do mundo é a eternidade. Sou espírita, dentro do espiritismo existe uma entidade que se chama Iansã. Ela é o fogo, a lava. Eu me vejo como essa entidade maravilhosa se incendiando, mas viva, viva eternamente”. Pra TV Carta, ainda completou: “Pra Fuder não é só sobre cama, não. É a mulher que bota pra fuder de verdade”.
Já tá sem fôlego depois de tanto samba (literalmente)? Pois segura esse tamborim aí que tem mais: a sexta faixa do CD é sobre “Benedita”, uma travesti traficante.
“Ele que surge naquela esquina
É bem mais que uma menina
Benedita é sua alcunha
E da muda não tem testemunha
Ela leva o cartucho na teta
Ela abre a navalha na boca
Ela tem uma dupla caceta
A traveca é tera chefona”
Talvez a faixa mais agressiva do álbum, ela transparece a realidade violenta da travesti no Brasil, e podemos sentir a adrenalina da perseguição policial às que traficam ou se prostituem. Ao longo da música, fica claro o porquê de Elza ter inserido essa faixa no álbum: ela se enxerga na travesti – violentada, injustiçada, forte, persistente e guerreira, Benedita é uma verdadeira “mulher do fim do mundo”, como a própria Elza. E Elza não simplesmente largou essa faixa e saiu correndo: em entrevistas sobre o álbum, quando questionada sobre a faixa, ela não deixa de falar sobre a situação da comunidade trans no nosso país, revoltada com a violência que sofremos. Rainha mesmo, né? Isso sim que é sororidade. Em entrevista à TV Carta, disse “A mulher não tomou ainda o conhecimento que uma mulher ajuda a outra, que a gente precisa ter mulheres do nosso lado. Precisamos de amigas.”
A faixa “Firmeza” é uma conversa descontraída entre jovens amigos que “se trombaram” na rua, provando o quão contemporânea Dona Elza realmente pode ser, simulando naturalmente um diálogo cheio de “qualés” e “firmezas”. “Beleza mano, fica com Deus / Quando der a gente se tromba, beleza? / Você é mermão muleque”. Em “Dança”, faixa mais tranquila que as cinco anteriores, que dialoga com o tango, Elza retorna a questões existenciais e espirituais. “Daria a minha vida a quem me desse o tempo / Soprava nesse vento a minha despedida / … / E se eu me levantar, ninguém vai saber / E o que me fez morrer, vai me fazer voltar”.
Se o álbum abriu com duas músicas belíssimas, ele também encerra com três faixas tão belas quanto. A instrumentação de “O Canal” tem forte influência da música africana, que acompanha o tema da letra: uma jornada espiritual. “Solto” é a única faixa sem distorções, fora o prelúdio acapella do álbum, “Coração do Mar”. Descreve o processo de morrer: a alma se desprendendo do corpo. E, finalmente, fechando o álbum com chave de ouro, “Comigo” começa num crescendo de ruídos e distorções, construindo a tensão do ouvinte. Ao chegar na metade da faixa, o ruído de repente cessa, e a voz de Elza surge novamente num acapella belo e singelo, que encerra o álbum:

“Levo minha mãe comigo
Embora já se tenha ido
Levo minha mãe comigo
Talvez por sermos tão parecidos
Levo minha mãe comigo
De um modo que não sei dizer
Levo minha mãe comigo
Pois deu-me seu próprio ser”
O novo álbum de Elza é fogo, é melancolia, é sofrimento e é liberdade, como há de ser o samba, como é Elza Soares, e como é a mulher brasileira. Empodera, toca na ferida, é aquele tapa na cara que dói, mas nos faz acordar. Trata de racismo, de misoginia, de transfobia. A voz de Elza está rouca, rasgada, e sempre prestes a falhar, e exatamente por isso, mais bela do que nunca. É uma cicatriz que mostra a força que ela precisou pra enfrentar o que enfrentou, e é bela, como as marcas da idade no seu rosto. “Boto o passado todo num cantinho, guardadinho em mim, mas sabendo que o now está aqui. Ontem já foi, amanhã não sei. Então, tem que ser agora”.
Elza Soares é o olhar misterioso de Capitu, a casca grossa de Maria da Penha, o sorriso alegre de Carmen Miranda, o braço forte de Dandara, tudo junto. É daquelas mulheres que fazem História pra lembrar às mulheres do Brasil que esse país é nosso.
Fonte: Capitolia 

sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

Feminismo nas ruas: mulheres debatem representatividade na sociedade

Assunto que permeia a programação do Emergências, as mulheres voltaram a protagonizar o encontro global para debater a cultura como motor transformador da sociedade. Ativistas, militantes e pensadoras discutiram o cenário e atuação dos movimentos feministas no Brasil e na América Latina .  O evento foi promovido pelo Ministério da Cultura (MinC), no Rio de Janeiro (RJ), buscou criar um espaço de conexão e diálogos com a sociedade civil sobre o papel da cultura na sociedade.
A criadora do do Núcleo Interdisciplinar de Estudos de Gênero, Raça e Sexualidade, Djamila Ribeiro, e colunista da Carta Capital, avaliou a importância de que, antes de pensar para onde o movimento feminista vai, seja pensado como essa história foi contada. "Tem que fazer uma revisão e recontar essa história. A mulher negra sofre opressão por ser mulher, negra e pela classe social. Está tudo inter-relacionado. Ser feminista é pensar um novo modelo de sociedade. Não só o que nos diz respeito; tudo nos diz respeito", ressaltou Djamila. 
A advogada e produtora cultural, Eliane Dias, lembrou da morte da auxiliar de serviços gerais, Claudia Silva Ferreira, depois de ter sido baleada durante operação policial no Morro da Congonha, na zona norte do Rio, quando saía para comprar pão;  e da recente execução dos cinco jovens pela Polícia Militar do Rio. 
A advogada e produtora cultural, Eliane Dias, na roda de conversa sobre feminismo, no Emergências 2015
Creative Commons - CC BY 3.0 - A advogada e produtora cultural, Eliane Dias,
na roda de conversa sobre feminismo, no Emergências 2015
"Os índices de feminicídio, de crimes domésticos, de mães solteiras são maiores paras as mulheres negras. A cada mãe que chora um filho negro morto, eu choro também.Nós temos que pra rua, parar o trânsito. Colocar na janela nosso luto. Se a gente for agredida, todo mundo tem que parar. O que não pode é ficar falando que é feminista, ver uma mulher negra sofrer e ficar sem fazer nada", argumentou Eliane, que produz o grupo Racionais MC's e é esposa do rapper Mano Brown.  Para a militante do Movimento Amplio de Mujeres de Porto Rico, Shariana Ferrer Nuñez, é curioso que no contexto do Brasil e da América Latina se tente separar raça de gênero. "Tanto raça e gênero se vinculam ao corpo. Não há como separar. A violência do opressor também vale para homens, mulheres, negros", disse.   A exclusão dentro dos próprios grupos feministas foi lembrada pela ativista Monique Prada, do site Mundo Invisível, que visa cobrir a questão do trabalho sexual no mundo. "É importante que se pense a questão da exclusão dentro do feminismo. As prostitutas, ao tentar construir esse espaço, muitas vezes, são oprimidas pelas companheiras".  Aborto, violência e identificação das mulheres nas manifestações mais recentes também foram destaques da roda de conversa, realizada na Fundição Progresso, local que reúne grande parte das atividades do evento. "No Brasil, o aborto é a quinta causa de morte materna. O direito do que fazer com corpo é nosso", defendeu a liderança do Movimento #ForaCunha e símbolo da #PrimaveradasMulheres, Luciana Pedroso, que em outubro deste ano encenou, nua com o corpo pintado, a escultura viva da Vênus de Willendorf, durante manifestação no Rio de Janeiro. 
A atriz e militante Luciana Pedroso cantou "Mulher", de Benito de Paula, e "Gracias a La Vida", de Violeta Parra.
Creative Commons - CC BY 3.0 - A atriz e militante Luciana Pedroso cantou "Mulher",
de Benito de Paula, e "Gracias a La Vida", de Violeta Parra
O cenário da luta pelos direitos da mulher no Peru e no Uruguai foram apresentados pelas militantes da Mujeres en el Horno, grupo uruguaio, Federica Turbán, e pela dançarina e ativista peruana, Micaela Tavara, do movimento Facción.  "No Peru, há 20 mil denúncias de violência sexual contra mulheres ao ano, mas a realidade é muito mais horrível. Temos que tomar o espaço público, porque o espaço público é nosso", afirmou Micaela. 

Deputadas Federais e Senadoras Relatam Casos de Assédio Sexual

Para participar da campanha #PrimeiroAssédio, na qual mulheres compartilharam os primeiros abusos que sofreram, a Marie Claire ouviu deputadas e senadoras do Congresso para colher os seus próprios relatos de abuso. Das 65 contactadas, apenas 7 toparam enviar depoimentos.


Resultado de imagem para Simone Tebet (PMDB).
“Lembro de uma situação que aconteceu quando tinha 18 ou 19 anos. Comecei um estágio em um órgão público e rapidamente meu chefe criou uma intimidade estranha. Achava esquisito, mas não sabia como fazê-lo parar de fazer comentários sobre sua vida sexual. Até que, poucos meses depois da minha entrada na empresa, me prensou contra a parede e tentou me beijar à força. Saí de lá correndo e nunca mais voltei. No dia seguinte, comecei a me culpar por ter deixado aquilo acontecer. Não contei para ninguém e ainda levei uma bronca do meu pai, que ficou com medo que eu não parasse em emprego nenhum”, diz a senadora Simone Tebet (PMDB).

Resultado de imagem para Maria do Rosário (PT).
“Havia em meu bairro um senhor de boa reputação. As pessoas gostavam dele. Este senhor sempre nos observava quando estávamos brincando. Em certa ocasião, ele começou uma conversa comigo sobre questões que, só mais tarde percebi, eram muito íntimas para uma conversa entre um adulto e uma criança. Bem nesta hora, minha mãe me chamou e eu voltei correndo para casa. Tenho uma sensação ruim quando lembro disso”, declara Maria do Rosário (PT).
Resultado de imagem para Mara Gabrilli (PSDB)."Eu tinha nove anos. Era meu primeiro baile de carnaval e estava acompanhada dos meus pais e meu irmão. Um jovem desconhecido chegou por trás e passou a mão em mim. Acertei-lhe um tapa e ele saiu logo em seguida”, afirma a deputada Mara Gabrilli (PSDB).

Resultado de imagem para Benedita da Silva (PT).
"Fui estuprada aos 7 anos, mas quero falar sobre assédio no ambiente de trabalho.  Logo que cheguei à Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, sofri muito assédio por parte dos homens que achavam que eu, mulher e negra, estava deslumbrada com o ambiente e me viam como um objeto sexual", relembra a senadora Benedita da Silva (PT).
Resultado de imagem para Erika Kokay (PT).
"Lembro que foi no início da minha adolescência. Estava em um ônibus lotado, na minha cidade natal (Fortaleza), quando de repente percebi que havia um homem que propositalmente buscava um contato, pressionava o corpo contra o meu corpo, e forçava um atrito. Ao perceber que era algo proposital, protestei e mudei de lugar. Era muito nova, não entendi direito o que ele estava fazendo. Continuei a andar de ônibus, e eles eram sempre lotados. Ffoi o primeiro, mas não o último em ônibus", conta a deputada Erika Kokay (PT).
Resultado de imagem para Angela Portela (PT)."Toda mulher tem ao menos um episódio de assédio, de sofrimento, em que tenha se sentido desrespeitada. Embora eu não tenha nada mais violento para relatar, felizmente, posso dizer que já fui vítima de comportamentos machistas, como cantadas grosseiras que o brasileiro costuma naturalizar, tratar como algo que faz parte do relacionamento entre um homem e uma mulher. Não faz! As famosas cantadas revelam a cultura de desrespeito à mulher, que segue sendo tratada com objeto, propriedade dos homens. Então eu poderia citar vezes em que, ainda adolescente, com 14 ou 15 anos, vivi o constrangimento de ouvir coisas grosseiras", diz a senadora Angela Portela (PT).
Resultado de imagem para Luciana Santos (PCdoB).
"Infelizmente todas as mulheres que conheço possuem em seus repertórios histórias de assédio nos mais variados níveis. Comigo não seria diferente. Escolhi, para compartilhar com vocês, um episódio que, embora não tenha sido um primeiro assédio, teve (e tem até hoje) um impacto forte porque aconteceu quando eu me julgava já independente e autônoma. Eu era estudante de Engenharia Elétrica na UFPE e estava na Bahia, em uma atividade do movimento estudantil. Ao sair da casa em que estava hospedada um carro diminuiu a velocidade e pareceu me chamar, olhei para o motorista que pediu que eu levantasse a minha camisa. Tomei um choque! Perguntei se ele era louco e busquei me afastar dali. O carro me seguia, acompanhando o meu passo apressado e o motorista gritava que era de uma revista, e me chamava, tentava me atrair enquanto eu apavorada só pensava em encontrar um lugar onde houvesse mais pessoas que me salvassem daquele pânico. O porto seguro foi um ponto de ônibus lotado um pouco mais a frente. O carro sumiu, mas meu medo não. Fiquei com receio da voltar para casa, onde estava hospedada sozinha, e o carro me seguir de alguma forma. Pensava se ele tinha me visto sair de casa e se estaria de algum modo esperando que eu voltasse. Quando consegui voltar para casa até o toque do telefone me assustava, achava que aquele homem de algum modo poderia continuar me perseguindo. Curioso como o medo nos torna irracional! A paz e a segurança só voltaram depois de uma conversa com meu pai por telefone. Só as palavras daquele que me apresentou ao feminismo, que me presenteou com as ideias da Alexandra Kollontai, foram capazes de me devolver a serenidade e espantar de vez a sensação de fragilidade que aquele carro na rua deserta me inspirou", relata a deputada Luciana Santos (PCdoB).
Fonte: revistamarieclaire   Fotos: Internet( Monica Aguiar ) 

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