quarta-feira, 30 de julho de 2025

Expectativa para o lançamento do Caderno de Boas Práticas em Atenção à Saúde da População Negra no Brasil

 
Por Mônica Aguiar 

O pré-lançamento do “Caderno de Boas Práticas em Atenção à Saúde da População Negra no Brasil” aconteceu no dia 28 de julho, e marcou um avanço significativo na promoção da equidade em saúde no país. Este projeto, liderado pelo Professor Celso Ricardo, também conhecido como Pai Celso, e pela Professora Rosana Monteiro, busca reconhecer, divulgar e abordar as especificidades e necessidades de saúde da população negra, frequentemente negligenciadas nos sistemas tradicionais de saúde.

Este encontro celebrou a rica tapeçaria de ideias e vozes que compõem ações do povo negro brasileiro.

A apresentação do caderno de Boas Práticas em Atenção à Saúde da População Negra no Brasil aconteceu em formato de reunião on-line, foi um evento marcante, reunindo com os autores de todos os cantos do Brasil, cada um trazendo suas experiências e perspectivas únicas na promoção e  valorização da saúde da população negra.

Esta iniciativa não só contribui para a visibilidade das questões raciais em saúde, mas também destaca a importância de uma abordagem que priorize a humanização, respeito e adoção de medidas nas políticas públicas que combatam o racismo no sistema de saúde.

Em regiões onde a informação é escassa, o Caderno de Boas Práticas em Atenção à Saúde da População Negra no Brasil” se torna um recurso crucial para educar e empoderar comunidades, assegurando que todos tenham acesso a informações sobre os  cuidados de saúde.

Como uma das autoras, poder estar neste projeto, escrevendo sobre o Seminário de Saúde da Mulher do Centro de Referência da Cultura Negra de Venda Nova, é extremamente importante.

Julho é um mês de reflexão e conscientização, especialmente no que diz respeito à luta das mulheres negras no Brasil. Destaco a necessidade urgente de enfrentar as desigualdades estruturais que afetam as mulheres negras, principalmente no campo da saúde reprodutiva. 

A alta taxa de mortalidade materna evitáveis entre mulheres negras é um reflexo das disparidades no acesso a serviços de saúde de qualidade e do racismo institucional que persiste. 

Além disso, a falta de autonomia sobre nossos  corpos e a falta de reconhecimento do nosso verdadeiro papel central no parto e nascimento são questões críticas que precisam ser abordadas. 

Promover o protagonismo das mulheres, garantindo-lhes voz e escolha em suas experiências de maternidade, é essencial para avançar em direção a uma sociedade livre de discriminações e violências. 

É fundamental que políticas públicas sejam implementadas e aprimoradas para garantir assistência adequada e respeitosa, assegurando que todas as mulheres tenham o direito de viver experiências específicas de maternidade com segurança de continuidade da vida e com dignidade.

Chego aos 59 anos,  fazendo profundas reflexões sobre as barreiras enfrentadas e as lições valiosas que delas surgiram. 

As dificuldades encontradas por nós mulheres negras são impostas por fatores externos, como a falta de oportunidades e os determinantes sociais que frequentemente impactam a vida das pessoas.


Transformar as adversidades raciais vividas em autodescoberta é um testemunho de resiliência e força.

Agradeço profundamente aos protagonistas Professor e Pai Celso Ricardo e a Prof. Rosana Monteiro, estão proporcionando espaço de crescimento e visibilidade.  Espaços onde tantas pessoas se encontram e crescem juntas.

Que as nossas trajetórias continuem a inspirar e fortalecer as pessoas ao nosso redor.

Ser uma pessoa cientista negra protagonista no Brasil envolve enfrentar uma série de desafios, incluindo o racismo estrutural e as barreiras históricas que limitam o acesso e a ascensão em campos tradicionalmente dominados por uma perspectiva eurocêntrica. 

Muitos desses espaços científicos foram historicamente estruturados para excluir e negar vozes negras, o que torna ainda mais importante o trabalho de desconstrução dessas normas e a promoção de uma ciência mais inclusiva e diversa. 

Cientistas negros desempenham um papel crucial ao trazer novas perspectivas e experiências que enriquecem a pesquisa e a inovação. Além disso, eles servem como modelos inspiradores para as novas gerações, mostrando que é possível romper barreiras e alcançar o sucesso acadêmico e profissional. 

O apoio de políticas institucionais que promovam a igualdade racial e a inclusão é essencial para que essas mudanças ocorram de forma significativa e duradoura.

quarta-feira, 23 de julho de 2025

DIREITOS SEXUAIS, REPRODUTIVOS, SAÚDE E POLÍTICAS PARA MULHERES . É PRECISO RENOVAR

 Por Mônica Aguiar


Os direitos sexuais e reprodutivos são direitos que deveriam garantir a autonomia e liberdade das pessoas em relação à sua sexualidade e à reprodução.

Isto inclui o direito de decidir sobre a reprodução, exercer a sexualidade de forma livre e segura, ter acesso à informação e serviços de saúde sexual e reprodutiva, e estar livre de violência e discriminações.

No Brasil, apesar dos esforços feitos por mulheres para a garantia destes direitos, existem mecanismos que moldam as relações entre homem e mulheres que impedem que as mulheres desempenhem este direito que é a cidadania. Isto acontece conforme a conjuntura política.

A minha experiência na defesa dos direitos sexuais e reprodutivos sugere apontar que as práticas conservadoras que negam a ciência são os principais responsáveis por manter nas estruturas do Estado o racismo, o machismo e fomentar a misoginia.

Estas práticas surgem de várias pessoas e em diversos campos. São atitudes discriminatórias que vêm de pessoas independentes da cor/raça, mas a ampla maioria é branca, com grau de instrução superior ou técnica.

E para isto, eu acredito ser preciso pontuar como as representações nas estruturas de Governos fomentam as desigualdades, principalmente na saúde. Lembrar das centenas de formas e justificativas utilizadas, em sua maioria veladamente, para que uma mulher pobre não acesse seus direitos sexuais e reprodutivos. Eu cito:

As práticas intervencionistas, comentários pejorativos, piadas, orientações abusivas de higienização, aconselhamento a cesária, orientação abusiva e higienista para entrega legal, dificuldade ou impedimento na colocação do DIU e de fazer pré-natal, falta de orientação para uso correto de contraceptivos, oferta de contraceptivos esperimentais, oferta de pisicotrópicos em consultas onde a paciente apresenta queixas excesiva de dor, oferta segregacionista massiva de laqueadura de trompas em mulheres negras, colocação de eplanom de forma aliatória, falta da caderneta da mulher, falta de ginecologista nas unidades de saúde pára um acompanhamento adequado, precariedade e demora para atendimento de consultas e exames especilizados, centralização de serviços criando barreiras de acessos, utilização indiscriminada de TCIs(termo de consentimento informado) em mulheres que fazem cirurgias vaginais, uterinas, reto e mamas e também na mulher grávida que recebe orientações desnecessárias para fazer cesária, falta de creches em Conferências, reuniões e seminários, espaços e equipamentos públicos inadequados às grávidas.

Para mim, isto tudo e mais um pouco quando ocorre são violações dos direitos reprodutivos e direitos sexuais das mulheres.   

Os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres são uma parte fundamental dos direitos humanos e não devem ser limitados somente às práticas médicas e condutas dos profissionais de saúde.

Além disso, é crucial reconhecer o direito das mulheres de viverem livres de discriminação, coerção e violência em todas as suas formas. Ampliar o entendimento desses direitos implica em promover políticas públicas inclusivas que respeitem a diversidade das experiências das mulheres, garantindo que suas vozes sejam ouvidas e suas necessidades atendidas em todas as esferas da sociedade.

 

Defender os direitos das mulheres em uma sociedade que historicamente se estruturou sob a misoginia e o patriarcado é um desafio complexo. Não é uma tarefa que possa ser resolvida com a precisão de uma equação matemática, por envolver questões políticas, preconceitos profundamente enraizados e mudança cultural ampla.

A luta contra o machismo, o racismo e outros preconceitos exige um esforço contínuo de conscientização, educação e políticas públicas realmente eficazes.

A sociedade acredita que as mulheres não podem tomar suas próprias decições sobre o que devem fazer sobre seus corpos.   

A sociedade acredita que:

ü  O corpo da mulher é propriedade da sociedade e instrumento apenas do prazer dos outros.

Historicamente, as mulheres foram frequentemente limitadas a funções domésticas e de cuidado, muitas vezes sem escolha ou reconhecimento de seu potencial. Até hoje, a gravidez é algo obrigatório para uma mulher e de papel secundário, servil e doméstico.

No tema direitos sexuais e reprodutivos, para mim, existem várias gavetas, como citei acima. Uma delas, eu chamo de Manifestações de Mulheres. Dentro desta gaveta, especialmente as mulheres negras, em termos de expressões como sorriso alto, indignação ou discordância, acendem na maioria das pessoas questões profundas de desigualdade, preconceito, violência e racismo enraizados na sociedade.

As manifestações das mulheres negras de demonstrar felicidade, rir e falar alto, se revoltar, usar roupas curtas ou apertadas, frequentar bares, sair a hora que quiser e para onde quiser, lutar pelos seus direitos humanos, participar da política, ser dirigentes ou gestoras com cargos de poder, é motivo suficiente para que muitas pessoas as qualifiquem pejorativamente como:- mulheres vulgares, revoltadas contra o sistema, loucas, difícieis, complicadas, radicais, brigonas e dentre outros.

Sofremos com julgamentos morais e estereótipos que insistem em nos desumanizar, isto cria impedimentos à plena expressão de nossas emoções, opiniões e conquistas.

Manifestar-se contra a autonomia da mulher é um ato de agressão, por tender a impor restrições sobre decisões pessoais que deveriam ser respeitadas. Essas manifestações frequentemente geram debates acalorados, por envolverem valores culturais, religiosos e éticos divergentes.

A luta pela igualdade e pela justiça social passa por reconhecer a legitimidade das expressões das mulheres negras sem que sejam invalidadas ou subjugadas por julgamentos preconceituosos.

Muitas mulheres ainda não perceberam que uma educação sexual abrangente empodera as mulheres com conhecimento, permitindo que façam escolhas conscientes sobre suas vidas sexuais e reprodutivas.

Parcelas significativa dos  que estão nas estruturas de poder e decisões, a maioria homens, não querem enxergar que o direitos reprodutivos e sexual da mulher não pode ser tabú.

A dinâmica e o modo com que a mulher tem se organizado para driblar as mazelas, adquirindo o autocuidado, reformulando seu olhar sobre o que é família e entendendo a importância do seu papel na sociedade é um fato.

Então, estes modelos ainda existentes de políticas públicas de cuidados de saúde da mulher não contemplam mais as mulheres.

É preciso de garantir a reforma obstétrica e na saúde da mulher construir ações que atenda todas as dinâmicas das mulheres; que não seja eurocêntrico; que considere os determinantes sociais; que se preocupe com a justiça sexual e reprodutiva; que não criminalize as poucas ações que protegem as mulheres. Que implementem ações para garantir o acesso às políticas públicas de marco legal, de decisões judiciais e de acesso à saúde.

 O modelo de atenção primária à saúde, com os problemas que tenho detectado, apresenta desafios significativos quando se trata de atender adequadamente às necessidades das mulheres. Esse modelo não considera as especificidades de gênero e raça, resultando em lacunas na assistência.

As políticas públicas são fundamentais para garantir a equidade de gênero e a proteção dos direitos das mulheres.  Não tenho dúvidas de que, se as políticas públicas fossem executadas corretamente, livres dos valores corporativistas e arcaicos, desempenhariam um papel crucial na proteção e promoção das mulheres.

 É essencial que essas políticas sejam continuamente revisadas e adaptadas para responder às necessidades emergentes, garantindo que as conquistas em termos de direitos das mulheres não se percam, e sim sejam mantidas e ampliadas.

 O fortalecimento desses direitos não só melhora a qualidade de vida, mas também contribui para o desenvolvimento socioeconômico das comunidades, promovendo saúde e bem-estar para todas e todos e todas as fases da vida das mulheres, do nascimento à velhice.

Encerro o meu artigo afirmando que as práticas eurocêntricas na saúde referem-se a abordagens que centram a cultura e os conhecimentos da Europa como o padrão universal e dominante em saúde, negligenciando ou marginalizando outras formas de conhecimento e prática principalmente as que são baseadas na humanização saberes locais, culturais.


quinta-feira, 3 de julho de 2025

OS CICLOS SE MOVEM ENQUANTO HOUVER RESPIRO.

Por Mônica Aguiar 

O ciclo da vida é uma jornada complexa e rica em experiências que nos moldam ao longo do tempo. 
Assim como as nuvens carregam a chuva e os ventos que esculpem a paisagem, sou moldada pelas memórias e desafios que encontrei sozinha.

As estrelas, com seu brilho constante, representam momentos de alegria e realizações, enquanto os açoites simbolizam as dificuldades evitáveis que enfrentei.

Embora nem tudo seja festa, esses altos e baixos sempre me ensinaram resiliência e aflorou-me o sentimento de valorização das poucas conquistas.

Cada fase da vida, as minhas nuances e surpresas, contribuiu para o meu crescimento pessoal e espiritual, ajudando a compreender melhor o mundo e a mim mesma.

Chego aos 59 anos, reflito sobre as barreiras evitáveis que enfrentei ao longo da vida e o esforço que fiz para transformá-las em autodescoberta e crescimento pessoal. Na maioria das vezes, as dificuldades que encontrei não foram consequências diretas de minhas ações, mas de fatores externos, como as escolhas e cobrança de outras pessoas.

Compreender isso me faz libertar de um fardo desnecessário de culpa. À medida que amadureço, tenho ganhado a capacidade de estabelecer limites e desenvolver resiliência frente às adversidades.

É importante reconhecer a força interior, superar os desafios e continuar a buscar caminhos que levem à realização pessoal e à paz interior.

Especialmente, este novo ciclo representa uma oportunidade de renovação e reflexão sobre o que foi vivido. É mais do que somente a contagem do tempo; é uma jornada de experiências e aprendizados. 

À medida que desafio esta página do tempo, recarrego as memórias e, inconscientemente, me preparo para novos enfrentamentos.

Para mim, a beleza da vida está justamente nessa capacidade de reinventarmos, de adaptarmos nossas rotinas e de continuarmos a perseguir nossos sonhos, mesmo diante das dificuldades.

Cada aniversário realmente marca um novo capítulo em minha vida, oferece a chance de refletir sobre o passado e quem sabe,  planejar o meu futuro.

Neste ciclo que se vai, consigo abraçar cada momento de minha vida estando ao lado da minha prole, minha mãe, meus irmãos, meus sobrinhos, com minha família, amigos e todas as pessoas com quem convivo, com gratidão e otimismo.

Valorizo as pequenas alegrias e aprendo todos os dias com cada vivencia. As lembranças que chegam nos sonhos, como suaves visitantes da noite, trazem consigo a serenidade dos bons momentos, que aquecem o meu coração.

Enfrentar os desafios é desenrolar um carretel cujos fios parecem infinitos e, por vezes, indesejados. Dá vontade de guardá-lo, mas as circunstâncias da vida me impelem a desatar os nós, a lidar com cada emaranhado de emoções e situações.

Assim, em um ato de coragem e resiliência, teço, com retalhos das minhas experiências e sabedoria, a concha protetora que envolverá a mim e aos que me cercam, uma capa que me dará força e abrigo ao longo da jornada. E, dessa forma, prossegui, transformando o fio da minha vida em uma tapeçaria única, imortalizando em textos o que um dia será de todas as pessoas.

Compartilho minha história e experiência, contribuindo para um patrimônio imaterial coletivo de sabedoria e beleza, na busca de transformar vidas em relíquias que transcendem o tempo e se tornam parte do tecido da humanidade.  

segunda-feira, 23 de junho de 2025

Autodeclaração ou apropriação? Respeite a identidade, organização e história das mulheres negras.

 
Pôr Mônica Aguiar  

Muitas pessoas que se identificam como brancas e depois se alto declaram negras podem ter ascendência africana ou indígena, mas suas características físicas, como tom de pele ou textura do cabelo, podem não refletir isso de maneira evidente. 

É importante reconhecer que a identidade racial não se limita somente ao fenótipo, mas também envolve aspectos culturais, históricos e pessoais. 
Como uma pessoa escolhe se identificar é um fenômeno complexo que na maioria das vezes é influenciado por uma variedade de fatores, incluindo o contexto social, político e cultural em que está inserida ou pretende se inserir.

Vários fatores podem moldar e até mesmo transformar a identidade de alguem, se, considerarmos o momento e como se coloca com as repercussões momentâneas.

No entanto, é importante saber que “apropriação” de uma identidade pode também ser o ato de adotar elementos de uma cultura por pessoas de outra cultura, muitas vezes sem compreender ou respeitar o contexto original, o que pode ser problemático.  

Em última análise, a identidade é uma escolha pessoal, mas é essencial promover o respeito e a compreensão das diversas experiências e identidades raciais.

A apropriação, quando se refere a elementos raciais, é complexa e frequentemente controverso.

É inadmissível naturalizar as atitudes de pessoas, que estão ligadas cultural e historicamente ao grupo racial dominante, que passam, em um passo de mágica, a adotar aspectos da população negra, especificamente das mulheres negras.

Isso se torna particularmente problemático quando essas práticas são tratadas como uma moda passageira, respostas e justificativas entre uma discussão ou moeda de troca, desconsiderando o contexto histórico e social de onde se originaram.  

E, quando essa apropriação é criticada, muitas vezes se revela o racismo subjacente, especialmente quando os elementos culturais são tratados como objetos descartáveis ou exóticos.

O debate se torna ainda mais caloroso quando se questiona quem tem o direito de decidir o que é apropriado ou não, exigindo uma reflexão cuidadosa sobre respeito, empatia e reconhecimento das injustiças históricas associadas. 

Uma justificativa que tenho observado e que está se tornando comum é que a adoção de tais elementos é uma forma de opinião, mas isso frequentemente ignora o poder e o privilégio inerentes nas dinâmicas raciais. 

A desmistificação do discurso da democracia racial no Brasil é essencial para compreender as estruturas de desigualdade racial que ainda persistem na sociedade.

A apropriação carrega veladamente a ideia de que o Brasil é uma democracia racial, sugere não haver discriminação racial significativa e que todas as raças convivem harmoniosamente. 

No entanto, essa narrativa mascara as profundas desigualdades e o racismo que afetam, desproporcionalmente, as populações negras, especialmente as mulheres negras. 

As tipificações pejorativas contra as mulheres negras são manifestações desse racismo, perpetuando estigmas e estereótipos que as desumanizam, relações, é opressor e provocam o silenciamento das mulheres negras.

Essas apropriações limitam as oportunidades de ascensão social e econômica e reforçam a discriminação em diversas esferas, como no mercado de trabalho, na educação, bem como a representatividade das mulheres negras em espaços de poder.

As mulheres negras,  que são militantes históricas e ativistas no combate ao racismo enfrentam um desafio constante de resistência e resiliência. 

Elas frequentemente se deparam com afirmações que tentam desqualificar suas experiências e lutas, tornando profundamente exaustivo colocar tais questões na mesa.

Isto é desqualificação. E vem disfarçada de críticas ou questionamentos aparentemente inofensivos, mas que, na verdade, têm a intenção de minar a legitimidade de nossas denúncias e conquistas.

Atualmente, o cansaço não é somente físico, mas também emocional e psicológico, pois lutar contra o racismo é uma batalha contínua que exige força e uma determinação imensa.

Afirmar que o debate sobre racismo, este tipo de apropriação provoca desgaste, é outro argumento perverso que, de fato, minimiza a importância crucial dessa discussão na sociedade contemporânea.

O racismo é uma questão estrutural que afeta profundamente a vida de milhões de pessoas ao redor do mundo, e ignorar ou diminuir a relevância de seu debate é perpetuar a desigualdade e a injustiça.

A questão da identidade racial é complexa e envolve uma compreensão profunda das experiências pessoais, sociais e culturais.

A identidade racial não pode ser simplesmente adotada ou descartada de forma instantânea.

Para muitas pessoas, reconhecer-se como parte de um grupo racial específico é um processo que pode ser profundamente influenciado por fatores como história familiar, aparência física, cultura, e experiências vividas.

No caso de alguém que nunca se viu como negro ou não é reconhecido socialmente como negro, tornar-se parte desse grupo envolve mais do que uma simples decisão pessoal; requer o reconhecimento e a validação da vivência e das experiências compartilhadas por aqueles que se identificam como negros.

Além disso, é importante lembrar que a identidade racial está enraizada em questões sociais e históricas, e a apropriação de uma identidade sem vivenciar suas realidades pode ser vista como desrespeitosa ou insensível.

 Assim, é essencial abordar essa questão com sensibilidade, responsabilidade e respeito, considerando as nuances e a profundidade que envolvem a identidade racial.

quinta-feira, 22 de maio de 2025

Por que é importante falar das mortes maternas, direitos e justiça reprodutiva na terceira idade?

Por Mônica Aguiar 

28 de maio. Dia Internacional de Luta pela Saúde da Mulher e Dia Nacional de Redução da Mortalidade Materna

Chego aos meus 60 anos e muitas pessoas perguntam, Monica Aguiar, por que falar das mortes maternas, direitos sexuais e reprodutivos na idade em que você se encontra?

Por um instante, abaixo a cabeça, lembro exatamente o que passei para ter meus seis filhos. Levanto a cabeça, olho para frente e para os lados e percebo que muitas ainda passam igualmente por tudo que passei. São 37 anos do primeiro parto e 21 do último. Refletir sobre uma jornada de maternidade é um exercício poderoso de memória e resiliência. Criar seis filhos ao longo de quase quatro décadas não é somente uma prova de força física e compromisso contínuo. Cada geração tem suas próprias dificuldades, mas é impressionante como algumas experiências permanecem constantes.

Ao olhar ao redor, é possível ver outras mães que enfrentam batalhas semelhantes, cada uma com suas próprias histórias e desafios. Isso cria uma rede invisível de solidariedade e compreensão entre mulheres que, mesmo em tempos diferentes, compartilham a mesma essência ao ser mãe.

A questão da coincidência do destino em comparação ao ritmo produzido no tempo de reflexão profunda sobre como as nossas vidas são moldadas. À medida que a sociedade avança e se aprofunda em novos conhecimentos, é inevitável que paradigmas e conceitos repressores sejam desafiados e reinterpretados. Muitas vezes, o que pode parecer uma coincidência pode, na verdade, ser o resultado do acesso a informações científicas e à educação que moldam nossas experiências e escolhas. 

Os valores que antes eram considerados inabaláveis podem se transformar, e conceitos que pareciam eternos podem se dissipar à medida que novas ideias emergem. Este processo de mudança é uma característica intrínseca da evolução humana e nos desafia a adaptarmo-nos e a reconsiderar o que realmente importa em nossas vidas.

Assim, ao considerarmos o futuro da humanidade, é essencial pensarmos em como as decisões que tomamos hoje, tanto em termos de ciência quanto de valores, impactarão o mundo que deixaremos para os nossos descendentes.

Com estas mudanças, o acesso a direitos que eram até pouco tempo privilégio para algumas pessoas passa a ser acessado por várias camadas socioeconômicas da sociedade. Mudanças dos conceitos e descoberta da sociedade de que a política do toma lá dá cá, a depender de onde se pratica e como se pratica, não é ruim e pode ser aplicada na hora do voto.

Então, o que tudo isto tem a ver com falar de mortes maternas? Falar de mortes maternas, vamos ter que abordar violência, determinantes sociais, autonomia, humanização das relações, respeito, tolerância, emancipação, ganhos salariais, racismo, misoginia e avaliar a prestação de serviços. Abordar essas questões pode levar a uma redução significativa nas mortes maternas e a um sistema de saúde mais justo e equitativo para todas as mulheres, além de contribuir para o entendimento da emancipação das mulheres, permitindo-lhes participar plenamente nas decisões que afetam suas vidas.

Por que tantos filhos? A questão de ter muitos filhos é frequentemente envolta em uma série de preconceitos e julgamentos que não consideram as complexidades da sociedade e nem as motivações pessoais, sociais, culturais das pessoas e famílias.

O debate sobre os direitos reprodutivos das mulheres tem se intensificado, sendo questionados à medida que novos conceitos sobre a definição dos direitos das mulheres ganham destaque.

É preciso que conceitos emancipatórios tenham a compreensão mais abrangente da autonomia corporal, igualdade de gênero e acesso a cuidados de saúde de qualidade. Ao reconhecer que os direitos reprodutivos são fundamentais para a realização plena dos direitos humanos das mulheres, discute-se a importância de garantir acesso seguro e legal a serviços de saúde reprodutiva, incluindo contracepção e aborto. 

Além disso, Há que analisar sobre as barreiras culturais, religiosas, econômicas e legais que impedem as mulheres de exercerem com autonomia seus direitos reprodutivos. 

Infelizmente, centenas de mulheres tem seu corpo violado por estupro. Esse é um tema profundamente complexo na sociedade e doloroso que demanda sensibilidade e empatia. A questão do estupro e da violência sexual é uma violação grave dos direitos humanos e deve ser abordada com seriedade e compaixão. 

Quando a sociedade aplaude a decisão de uma mulher de continuar uma gravidez resultante de estupro, é essencial distinguir entre apoiar a coragem e a resiliência da vítima e, inadvertidamente, perpetuar uma cultura que minimiza a gravidade da violência sofrida.

A sociedade contemporânea promove frequentemente a ideia de que a liberdade sexual é o único caminho para a felicidade plena e a realização pessoal. No entanto, essa liberdade é muitas vezes acompanhada de um julgamento moral que afeta desproporcionalmente as mulheres. A moralidade sexual ainda é, em muitos aspectos, uma questão de controle social, onde normas tradicionais tentam ditar o comportamento feminino, perpetuando estigmas e preconceitos.

Falar sobre mortes maternas e direitos sexuais e reprodutivos é crucial em qualquer idade, e minha experiência e sabedoria de vida podem trazer uma perspectiva valiosa para essas discussões.

Muitas vezes, mulheres mais jovens se beneficiam da orientação e apoio de pessoas que já percorreram etapas significativas de suas vidas.

Além disso, questões relacionadas dos direitos reprodutivos afetam mulheres de todas as idades e, ao abordar esses temas, estou contribuindo para a conscientização e mudança social. 

O meu, o seu, o nosso envolvimento ao tema pode ajudar a promover políticas públicas mais eficazes e garantir que futuras gerações tenham acesso a cuidados de saúde adequados e direitos reprodutivos protegidos. 

Continuar a falar sobre esses assuntos mostra compromisso com a justiça social e a dignidade humana, valores que não conhecem limites de idade.

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